WASHINGTON - Os adversários do presidente Donald Trump estão determinados a fazer com que ele sequer termine o mandato, por ter insuflado extremistas que invadiram o Congresso na quarta-feira. A presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi, pediu que ele renunciasse ou a Casa dará início a um processo de impeachment. Trump disse hoje que não irá à posse de seu sucessor, Joe Biden, no dia 20, o que rompe uma tradição mantida ininterruptamente desde 1869.
Segundo a imprensa americana, os democratas na Câmara planejam apresentar os chamados “artigos de impeachment” contra Trump na segunda-feira e a votação poderia ocorrer até o meio da semana. Se bem-sucedida, a iniciativa será um marco histórico: nenhum presidente jamais sofreu processo de impeachment duas vezes. O processo poderia também tornar Trump inelegível.
Enquanto os democratas da Câmara podem aprovar o impeachment, removê-lo exigiria uma votação de dois terços do Senado – o que significa que 17 republicanos teriam de se juntar aos 50 democratas (contando com a certificação dos resultados na Geórgia da vitória dos senadores Jon Ossoff e Raphael Warnock).
Trump poderia sofrer o impeachment mesmo depois de deixar o cargo, segundo especialistas constitucionais, o que teria o efeito de impedi-lo de voltar a concorrer para qualquer cargo público. Mas há uma barreira política para prosseguir com o julgamento no Senado: a necessidade de confirmar rapidamente o novo gabinete de Biden.
O senador democrata Joe Manchin III advertiu hoje sobre o risco de o processo obstruir a próxima administração. “Sejamos racionais sobre isso”, disse o senador, sugerindo que não havia senadores republicanos suficientes dispostos a remover Trump rapidamente do cargo. “Por que fazer o exercício de novo se vai ser inútil?”
Questionado, o presidente eleito afirmou que Trump não é apto para o cargo e “é um dos presidentes mais incompetentes da história do país”, mas se recusou a dizer se apoia o processo. Segundo ele, essa é uma questão que cabe só ao Congresso.
Diferentemente de 2019, quando em 20 dias Trump recebeu o impeachment na Câmara, mas foi absolvido no Senado, o processo que está sendo proposto dessa vez seria mais rápido, sem investigação e longas audiências.
Em uma carta aos membros da Câmara, Pelosi lembrou a renúncia de Richard Nixon em meio ao escândalo Watergate, quando os republicanos persuadiram o presidente a deixar o cargo e evitar o julgamento público de um impeachment, chamando as ações de Trump de um “ataque horrível à nossa democracia”.
“Hoje, após os atos perigosos e sediciosos do presidente, os republicanos no Congresso precisam seguir esse exemplo e pedir a Trump que deixe seu cargo imediatamente”, escreveu ela. “Se o presidente não deixar o cargo iminente e voluntariamente, o Congresso dará continuidade à nossa ação.”
Os democratas pediram ao vice-presidente Mike Pence e ao gabinete de Trump que invocassem a 25.ª Emenda da Constituição dos EUA, que lhes permite afastar o presidente se ele não puder cumprir suas obrigações oficiais. Mas Pence se opõe à ideia, disse um consultor ao Washington Post.
Segundo o Post, dois projetos de “artigos de impeachment” circulavam entre os democratas da Câmara citando o estímulo de Trump à violência e sua decisão tardia de encorajar a multidão a se dispersar como crimes graves e contravenções.
A imprensa americana afirmou que os membros da Comissão de Justiça trabalhavam hoje com os autores de uma delas – os deputados David Cicilline, Jamie Raskin e Ted Lieu – para fechar o texto. A acusação seria por crimes graves e contravenções ao incitar uma insurreição.
Os “artigos do impeachment” também citam o telefonema de uma hora de Trump, na semana passada, ao secretário de Estado da Geórgia, Brad Raffensperger, no qual o presidente pediu ao oficial para “encontrar” votos suficientes para anular a vitória de Biden naquele Estado.
De acordo com a CNN, essa resolução teria 131 copatrocinadores entre os 222 democratas da Câmara, incluindo o presidente da Comissão de Justiça, Jerry Nadler, que disse na quinta-feira apoiar que a resolução fosse direto para votação no plenário, sem passar por sua comissão. Seriam necessários 218 votos para o pedido avançar na Câmara.
Nenhum membro republicano da Câmara indicou apoio ao impeachment. Um deles, Adam Kinzinger, pediu a Pence para invocar a 25.ª Emenda e remover Trump. Outros sugeriram que receberiam de bom grado a renúncia de Trump ou sua remoção nessas circunstâncias – pela emenda constitucional.
No Senado, pelo menos um republicano, Ben Sasse, do Nebraska, disse que consideraria apoiar um processo de impeachment. Sasse, um crítico frequente de Trump, disse à TV CBS News ontem que “definitivamente consideraria” qualquer artigo de impeachment porque o presidente “desconsiderou seu juramento”. A senadora do Alasca Lisa Murkowski defendeu que Trump renuncie, mas não se posicionou sobre o impeachment./ W.POST, NYT, APF, AP e REUTERS