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Aung San Suu Kyi é condenada a 4 anos de prisão após ser deposta por golpe militar

A líder foi condenada por incitar a dissidência contra os militares e violar as regras de restrições da covid-19 durante as eleições em 2020; chefe da junta militar reduziu pena pela metade, após condenação

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Por Redação
Atualização:

Um Tribunal de Mianmar sentenciou a líder civil do país, Aung San Suu Kyi, nesta segunda-feira, 6, a quatro anos de prisão por incitar a desordem pública e quebrar protocolos de segurança contra a covid-19. Essa foi a primeira condenação da vencedora do Nobel da Paz, de 76 anos, em uma série de julgamentos a qual será submetida - o que tem potencial para mantê-la na prisão pelo resto da vida.

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Suu Kyi foi detida após o golpe militar que derrubou o governo civil do país em fevereiro. Além do caso julgado nesta segunda, ela ainda enfrenta 11 acusações por condutas diversas - incluindo corrupção, fraude eleitoral e divulgação de segredos de Estado -, que podem resultar em uma pena de até 102 anos.

Os julgamentos desta segunda foram realizados a portas fechadas em Naypyidaw, a capital do país, e foram descritos pela ONU e por governos estrangeiros como ações judiciais "politicamente motivadas". Antes do julgamento, a junta militar no poder chegou a proibir que os advogados de Suu Kyi falassem com a mídia, alegando que as falas poderiam "desestabilizar o país".

Prêmio Nobel da Paz, líder política em Mianmar e alvo de golpe militar: trajetória turbulenta de Aung San Suu Kyi se confunde com a história política do país. Foto: Kham / Reuters

"[Suu Kyi] foi condenada a dois anos de prisão sob a seção 505 (b) e a dois anos de prisão sob a lei de desastres naturais", afirmou Zaw Min Tun, porta-voz da junta militar. O ex-presidente de Mianmar, Win Myint, também recebeu a mesma pena, pelas mesmas acusações, acresentou o porta-voz, explicando que os dois ainda não serão levados para a prisão. "Enfrentarão outras acusações nos locais em que permanecem agora".

Ativistas de direitos humanos condenaram a acusação de incitamento, dizendo que o tipo penal é usado pelos militares para intimidar críticos - uma vez que o texto, com pena máxima de três anos, declara que qualquer pessoa que "publique ou divulgue qualquer declaração, boato ou relatório" com "intenção de causar, ou que possa causar, medo ou alarme ao público" pode ser responsabilizada. Enquanto isso, a acusação de violação dos protocolos da covid-19 decorreu de um episódio durante a campanha eleitoral de 2020 em que Aung San Suu Kyi fez uma aparição pública, com máscara e protetor facial, e acenou para apoiadores que passavam em veículos.

Após críticas de organizações internacionais e de governos estrangeiros, o chefe da junta militar de Mianmar, o genral Min Aung Hlaing, "perdoou" parcialmente as duas lideranças civis, reduzindo de quatro para dois anos a pena de cada um.

A Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, denunciou que Suu Kyi foi condenada por motivos políticos "em um julgamento manipulado com um procedimento secreto ante um tribunal controlado por militares". A sentença, além de privar a líder civil da liberdade, "fecha uma porta ao diálogo político", completou. Já a Anistia Internacional denunciou a decisão como uma tentativa da junta de "asfixiar as liberdades".

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"Esta decisão ridícula é uma farsa de justiça", disse Charles Santiago, um legislador malaio e presidente dos Parlamentares pelos Direitos Humanos da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), em um comunicado, acrescentando que a sentença era mais uma prova de que a associação "deve endurecer a linha" contra a tomada de poder ilegal no país.

Mianmar mergulhou ainda mais no caos à medida que o julgamento se desenrolava, com o conflito armado aumentando em partes do país e os militares tendo como alvo os manifestantes antigolpe. No domingo, um caminhão militar colidiu com os manifestantes em Yangon, antes que os soldados abrissem fogo contra a pequena multidão. Pelo menos cinco foram mortos, de acordo com a mídia local.

Por décadas, Suu Kyi defendeu a resistência não violenta enquanto liderava a luta pela democracia e pelo fim do domínio militar do país do sudeste asiático - uma causa que lhe rendeu o Prêmio Nobel da Paz em 1991 e aclamação generalizada no Ocidente.

Ela é considerada uma figura quase divina entre seus apoiadores em Mianmar, que a descrevem como uma defensora da democracia do país. Mas sua reputação no cenário internacional foi manchada por sua participação no governo em que ocorreram atrocidades em massa contra os Rohingya, um grupo de minoria muçulmana.

O veredicto de culpado tem potencial para galvanizar o movimento de protesto que incitou milhares de pessoas a pegar em armas contra o exército desde fevereiro, quando os generais tomaram o poder.

Fotografia exibida em reportagem da Myawaddy TV mostraAung San Suu Kyi (esquerda), Win Myint (centro), e o ex-prefeito de Naypyidaw, Myo Aung, diante de um tribunal especial, em 24 de maio de 2021. Foto: Myawaddy TV via AP

Nos meses que se seguiram ao golpe de fevereiro, as pessoas se reuniram nas ruas: médicos e enfermeiras pararam de trabalhar em protesto e muitos se recusaram a pagar impostos em uma campanha conhecida como Movimento de Desobediência Civil.

Apesar da ameaça de prisão, ainda há amplo apoio ao movimento. Um número crescente de soldados está desertando, aliando-se a manifestantes armados e grupos insurgentes para lançar ataques de ataque e fuga contra os militares.

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A junta respondeu com repressão - matou mais de 1.300 pessoas e prendeu mais de 10.600 outras, de acordo com a Associação de Assistência para Prisioneiros Políticos, uma organização de direitos humanos com sede na Tailândia./ NYT, W. POST e AFP

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