
05 de julho de 2013 | 02h03
A diferença principal em relação aos outros levantes no Egito, na Tunísia, na Líbia e na Síria é que este derrubou um presidente legitimamente eleito. A adesão do comando das Forças Armadas ao movimento popular é uma diferença em relação à Líbia e à Síria, mas não em relação ao próprio Egito e à Tunísia, onde a cúpula militar, depois de certa hesitação, retirou seu apoio a Hosni Mubarak e a Zine Ben Ali.
Na Líbia e na Síria, havia uma divisão entre forças de elite, que mantiveram o apoio ao regime, e o efetivo regular, que em grande medida aderiu à insurgência. Na Tunísia e no Egito não havia forças de elite preparadas para sustentar o regime em caso de levante.
Depois da queda de Mubarak, a cúpula das Forças Armadas tentou se manter no poder de fato, nomeando gabinetes leais a seus interesses e impondo a inclusão de artigos na Constituição que lhe reservassem as prerrogativas sobre a nomeação de comandantes militares e sobre o orçamento de Defesa, enquanto se demorava em fazer a transição. Foi a reação de centenas de milhares de manifestantes, muitos deles os mesmos que voltaram às ruas agora e haviam protestado contra o regime de Mubarak, que fez com que os militares recuassem e aceitassem a transferência do poder de fato ao Parlamento e ao presidente eleito.
Os antigos comandantes foram para a reserva e os novos prometeram se circunscrever às funções militares. Sua visão e interesse foram representados na candidatura de Ahmed Shafik, último primeiro-ministro de Mubarak, vencido por Morsi por apertados 52% a 48%, em segundo turno, e também por partidos que sofreram derrota avassaladora nas eleições parlamentares, para os islâmicos, que asseguraram dois terços das duas Casas.
Os militares, provavelmente, entendem que não podem transformar o movimento anti-Morsi em terceiro round das eleições. Seria ignorar o que motivou milhões de pessoas a saírem às ruas: o desejo de uma democracia livre dos militares e do clero. Tanto os secularistas quanto os islâmicos, que se aliaram na derrocada de Mubarak, não aceitarão uma volta dos militares ao poder. E, há dois anos, eles cruzaram o limite imposto pelo medo da polícia e do Exército.
O que está verdadeiramente em jogo é a compatibilidade entre a democracia e o Islã nas sociedades árabes. E a viabilidade da Irmandade Muçulmana como partido político - uma questão existencial que a persegue desde sua criação, em 1928. Antes perseguida pelos militares, agora ela é hostilizada também por uma parte da população que não aceita a perda de um estilo de vida liberal, tão enraizado no Egito quanto a própria fé religiosa.
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