DIÁRIO DE HAVANA: Carros dos anos 50 ainda são símbolos das ruas da capital

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Por Cláudia Trevisan e Havana
2 min de leitura

Carro é um bem passado de pai para filho em Havana. Muitos já estão na terceira geração de proprietários e se valem do engenho cubano e do mercado paralelo para mantê-los andando em meio ao embargo econômico dos EUA. Peças são inventadas, substituídas pelas de outros veículos ou trazidas na mala por amigos que vêm do exterior. 

A chance de cubanos saírem e cubano-americanos entrarem no país abriu um mercado informal que vai de roupas a motores de arranque.

A frota nas ruas da capital é o retrato da geopolítica vivida pelo país nos últimos 60 anos. Os Chevrolets da década de 50 – cerca de 60 mil exemplares – são a memória ambulante do período em que os EUA tinham domínio econômico da ilha e a máfia administrava hotéis, cassinos e casas noturnas.

A maioria dos carros clássicos se converteu em um meio de transporte híbrido de táxi e ônibus. Com trajetos mais ou menos definidos, os motoristas lotam os carros com até oito passageiros, que pagam de 10 a 20 pesos pela corrida, dependendo da extensão – valores equivalentes a US$ 0,40 e US$ 0,80. 

Outros preferem transportar turistas, ao preço mínimo de 5 CUCs (US$ 5,7), a moeda conversível cubana, que é usada por estrangeiros e cada vez mais por cubanos. Também há uma frota oficial de táxis, com novos carros amarelos. Mas o preço a torna inalcançável para a maioria dos cubanos: uma corrida do aeroporto ao centro de Havana custa 25 CUCs (US$ 29), valor que supera o salário médio mensal, que ronda os US$ 20.

O período de influência soviética é representado por carros menos glamourosos, como os pequenos Lada e Moscovich. José Luis, o motorista que me conduz por Havana, é dono de um Moscovich 1980 que herdou do pai. Dilapidado como grande parte da paisagem urbana de Havana, o carro é reparado pelo próprio dono, com peças que saem de outros Moscovichs. 

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Os mecanismos dos vidros, já originalmente manuais, não funcionam. Quando começou a chover no trajeto do aeroporto ao hotel, José Luís teve de parar o carro para puxar os vidros das duas portas com as mãos. Para mantê-los fechados, desenvolveu um gancho que os sustenta. 

Ex-militar, José Luís viveu cinco anos na União Soviética, até 1983. Desde 1993, se vira como pode no incipiente mundo da iniciativa privada cubana – é um “faz tudo” que presta serviços de encanador, eletricista, pintor e motorista. A precariedade do carro se reflete no preço. José Luís cobra 30 CUCs por dia de trabalho, pouco mais de uma corrida do aeroporto à cidade em táxi oficial.

Mas a opção por ele e seu Moscovich não foi definida por questão financeira. José Luís foi recomendado por meu colega José Maria Mayrink, que o conheceu quando esteve em Cuba nos anos 90.

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