PUBLICIDADE

Díli amanhece em paz, pela primeira vez em 10 dias

Mas os milhares de refugiados ainda temem a volta da violência

Por Agencia Estado
Atualização:

Pela primeira vez desde a explosão da violência, há 10 dias, Díli, a capital do Timor Leste, amanheceu em calma nesta quarta-feira. As forças internacionais, entretanto, continuam patrulhando a cidade e protegendo seus pontos vitais, como o Palácio Presidencial. Donald Reilly, da organização Catholic Relief Services (CRS), com sede nos Estados Unidos, disse que não soube de nenhum incidente violento. Os militares rebeldes e as quadrilhas de saqueadores, porém, voltaram a agir na noite anterior. A atividade mas visível nesta quarta em Díli é a das tropas internacionais, especialmente dos australianos. Eles formam o maior contingente e estão encarregados de proteger o aeroporto, as embaixadas e a sede do governo. Os australianos se encarregam também de proteger a entrega diária de comida aos milhares de refugiados que permanecem em abrigos e não se atrevem a voltar para suas casas. Eles temem a volta da violência, apesar de os comandantes australianos pedirem que regressem aos seus lares. "Há cerca de 45 mil refugiados nos principais acampamentos da cidade: o aeroporto, o porto e a missão católica de Dom Bosco, dos padres salesianos, onde estão cerca de 13 mil", disse Augusto Suarez, um timorense que trabalha para a organização World Vision. O restante dos desabrigados se divide entre as diferentes igrejas católicas de Díli. Temor persiste "É difícil saber quando (os refugiados) vão voltar para suas casas. Pode ser em um mês ou dois. Depende de o governo encarar de uma vez o problema", disse Suarez, fazendo eco aos alertas de uma crise humanitária no país. "Não existe atividade comercial e de serviços em Díli, que é o coração do país. A crise ameaça se estender às províncias", acrescentou. Sem negar que a situação de escassez no Timor Leste não é nova, Suarez responsabiliza a revolta aos cerca de 600 militares. No fim de abril, eles se rebelaram contra as autoridades após serem expulsos do Exército. Depois de destituídos, os militares promoveram uma manifestação da qual participaram cerca de mil pessoas e que foi duramente reprimida pelo Exército, com cinco mortes. Os ex-militares rebeldes se entrincheiraram cerca de 60 quilômetros ao sul de Díli, perto das aldeias de Aileu e Ermera. Eles estão sob a liderança do comandante Alfredo Reinado, fundador do grupo que exige que o fim das discriminações nas nomeações no Exército. Ressentimento "Eles começaram a greve porque viram que havia dois pesos e duas medidas na cadeia de comando quanto a promoções. Agora, tudo depende do governo, que tem que demonstrar sua vontade de dialogar", opinou Suárez. No entanto, o voluntário lembrou que a rebelião dos militares é só a ponta de um iceberg que até agora vinha escondendo o ressentimento da população, especialmente a mais jovem, cansada de promessas e de corrupção. "Falta uma atitude reformista que propicie uma alternativa política, para conseguirmos a estabilidade e um novo ponto de partida como país independente", analisou Suarez, cujos pais e irmãos estão refugiados em sua aldeia natal de Bidao, a três quilômetros de Díli, de onde fugiram quando o caos se instalou. Esse é o desafio do presidente Xanana Gusmão. Na terça-feira, ele venceu a queda-de-braço com o primeiro-ministro, Mari Alkitiri. Tomou o comando das Forças Armadas e da polícia, as duas corporações em conflito, que são símbolo da rivalidade étnica que divide o país e que está se expressando de forma violenta. A maioria dos policiais foi recrutada durante a ocupação indonésia na região oeste do país. Por isso, a população do leste, área de onde saem as fileiras do Exército, vê os policiais como antigos colaboradores de Jacarta. Às velhas feridas do período de ocupação indonésia junta-se a pobreza extrema do país.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.