Documento da Unasul pode virar armadilha para Chávez

Termos vagos da declaração final criam ambiente desfavorável para parcerias como a que Caracas ofereceu à Rússia

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Por Denise Chrispim Marin e Ariel Palacios
Atualização:

A Colômbia de Álvaro Uribe saiu imune da reunião de cúpula da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), na sexta-feira, em Bariloche. Já a Venezuela de Hugo Chávez caiu em uma espécie de arapuca. O polêmico acordo entre Colômbia e EUA deixou como herança a criação de um mecanismo vago o bastante para embaraçar futuros acordos militares entre sócios do bloco e países de fora da América do Sul. Entre os acordos que poderiam ser freados estão os que envolveriam a Venezuela e a Rússia - em março, antes da polêmica sobre as bases colombianas, Chávez afirmou que permitiria que bombardeiros russos utilizassem a ilha caribenha de La Orchila. Meses antes, Venezuela e Rússia realizaram exercícios militares conjuntos, o que irritou Washington. O comércio de armas também será monitorado pelo Conselho de Defesa da Unasul. O texto, entretanto, é confuso e chegou a ser classificado como ininteligível pelo presidente peruano, Alan García. O documento defende a adoção de "mecanismos concretos de implementação e garantias para todos os países aplicáveis aos acordos existentes com países da região e extraregionais", sem mais detalhes. A reunião de cúpula, em si, expôs e aprofundou fissuras na região andina. Os ataques e cobranças entre Venezuela, Equador e Bolívia, de um lado, e Colômbia e Peru, de outro, estamparam conflitos que se arrastam há décadas e poderiam minar o projeto de integração idealizado, originalmente, pelo Brasil. Mas no fim do debate, o acordo EUA-Colômbia foi mantido intacto. "As pessoas (presidentes) precisavam fazer sua catarse, colocar para fora seus sentimentos, desabafar, falar para a sua televisão", resumiu o chanceler brasileiro, Celso Amorim. "Claro que as duas horas finais de debate não acrescentaram nada porque o documento estava pronto. Mas, talvez, se houvesse tentativa de aprová-lo duas horas antes, não fosse possível", completou, para justificar a catarse coletiva. O documento final da reunião de Bariloche elencou seis tópicos. O de número três expôs os limites para que outros países da região - em especial, a Venezuela - se aventurem no mesmo caminho da Colômbia. Também deixou um sutil compromisso de que as ações militares americanas na Colômbia não se estenderão pelos vizinhos. "Para um bom entendedor, meia palavra basta", afirmou Amorim. Para Amorim, embora a reunião não tenha alcançado um acordo geral sobre as questões de segurança e de soberania na América do Sul, esse tópico trouxe um "avanço" no processo de solução do dilema gerado pelo acordo EUA-Colômbia. A próxima etapa desse processo se dará em setembro, quando o Conselho de Defesa - chanceleres e ministros da Defesa - e o Conselho de Combate ao Narcotráfico se reunirão para detalhar este e outros tópicos que ficaram pendentes em Bariloche. O local natural do encontro será o Equador. Mas, como esse país rompeu relações diplomáticas com a Colômbia, haverá resistência de autoridades de Bogotá em participar. Essa rodada ministerial deverá detalhar o que se entende por garantias para acordos militares e definir o que são e como serão implantados os mecanismos de geração de confiança entre os Estados. Mas terá também a tarefa de destrinchar o Livro Branco do Comando de Mobilidade Aérea, documento denunciado por Chávez como um plano estratégico americano que define Palanquero, na Colômbia, como uma "base expedicionária".

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