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Eleição no Nepal deve abolir a monarquia

Ex-rebeldes maoístas vão participar de votação para Constituinte

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Por Angela Perez
Atualização:

Os nepaleses vão hoje às urnas eleger a Assembléia Constituinte, que deve acabar com os 238 anos de monarquia no Nepal, onde os reis são considerados a encarnação do deus hindu Vishnu. O escritor nepalês Nanda R. Shrestha disse ao Estado, por telefone, que será uma surpresa se a monarquia resistir, já que o rei Gyanendra e seu filho são amplamente vistos como corruptos pela população. A monarquia tornou-se inesperadamente impopular depois de 2001, quando o príncipe herdeiro, bêbado e drogado, matou o pai - o rei -, a mãe e sete outros membros da família real antes de se suicidar (leia quadro). O rei Gyanendra, irmão caçula do rei assassinado, assumiu o trono, adotou inúmeras medidas impopulares e atraiu a fúria de muitos nepaleses. Em fevereiro de 2005, o autoritário monarca assumiu poderes absolutos, alegando a necessidade de acabar com a rebelião maoísta, mas um ano depois foi forçado a abandoná-los em meio a um levante da população por mais democracia. Gyanendra foi o grande perdedor do acordo de paz assinado em novembro de 2006 entre sete partidos políticos e os guerrilheiros maoístas - que lutaram entre 1996 e 2006 para depor a monarquia, deixando 13 mil mortos. Hoje, o rei é uma pessoa comum e seu cargo é apenas figurativo. Vive recluso no palácio em Katmandu, que foi nacionalizado, assim como a maioria dos imóveis reais. O novo hino nacional não faz nenhuma referência ao monarca, cuja imagem desapareceu das moedas e dos edifícios oficiais. "A monarquia foi efetivamente enterrada quando a aliança de sete partidos decidiu em dezembro sua abolição. A Assembléia Constituinte somente formalizará essa decisão", disse ao Estado a indiana Radha Kumar, especialista em conflitos étnicos no Sudeste Asiático do Council on Foreign Relations, de Washington. "Pesquisas de opinião indicam que 49% dos nepaleses gostariam de um papel cerimonial para o rei, mas ao mesmo tempo rejeitam o atual monarca e seu filho", disse Kumar, acrescentando que dificilmente a Constituinte criará um meio de satisfazer essas aspirações. Segundo Kunda Dixit, editor do Nepali Times, "as pessoas querem a monarquia, mas não esse rei. Como conciliar isso? Para a maioria das pessoas, incluindo os monarquistas, o trabalho não vale a pena". Dos mais de 50 partidos que disputam as eleições, sairão os ocupantes das 601 cadeiras da Assembléia Constituinte, que está encarregada de redigir uma nova Carta e deve transformar a única monarquia hindu do mundo em uma república. Para os 27 milhões de habitantes do Nepal - um país himalaio espremido entre a Índia e a China - a eleição de hoje é uma chance de paz e do renascimento de sua economia. O resultado será crucial para o avanço do processo de paz, assim como para configurar um Estado centralizado ou federativo. Os maoístas propõem um sistema presidencialista, enquanto o Partido do Congresso Nepalês (do primeiro-ministro Girija Prasad Koirala) defende um premiê eleito pelo Parlamento com um presidente cerimonial. Os maoístas asseguram que obterão a maioria se as eleições forem "livres e justas", mas ao mesmo tempo ameaçaram rebelar-se em caso de derrota, apesar de as pesquisas não indicarem um vencedor claro. Para Kumar, "se os maoístas não obtiverem bons resultados, pode haver outro período de instabilidade" no Nepal. "Então, a esperança é a de que os sete partidos da aliança e os maoístas se saiam bem o suficiente para formar uma assembléia que funcione", acrescentou. A missão de paz da ONU no Nepal atribuiu aos ex-rebeldes maoístas a maioria dos incidentes de violência que ocorreram durante a campanha. Ontem, oito pessoas foram mortas no país. Funcionários disseram que um candidato foi assassinado a tiros, um manifestante foi morto pela polícia e seis ex-rebeldes morreram em um confronto com as forças de segurança.

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