Em eleição manipulada, Assad escolhe rivais

Pela Constituição da Síria, presidente decide quem pode participar, o que deixa pouco espaço para opositores

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Por Redação
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DAMASCO - Eleitores sírios participaram nesta quarta-feira, 26, de uma votação presidencial cujo resultado não se discute. O poder do presidente Bashar Assad sobre o processo eleitoral é tão absoluto que a votação certamente lhe conferirá uma confortável vitória, garantindo seu quarto mandato de sete anos, o que confirma sua sobrevivência diante dos dez anos de rebelião contra seu governo.

A eleição entrega também uma mensagem de reprimenda à política dos EUA e de seus aliados em relação à Síria, uma diplomacia com o foco em garantir a transição do país à democracia. Quando o próximo mandato de Assad terminar, em 2028, ele terá ocupado a presidência por 28 anos, superando no cargo os 27 anos de seu pai, Hafez.

Eleitores de Assad nas ruas de Damasco: eleição com cartas marcadas Foto: Omar Sanadiki/REUTERS

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Em um gesto simbólico de poder, Assad foi votar na devastada região de Duma, o subúrbio de Damasco que sofreu um ataque químico em 2018, atribuído ao governo sírio pela ONU, que matou pelo menos 40 pessoas. Uma multidão de apoiadores cantava “Nossas almas, nosso sangue por você, Bashar”, quando o presidente chegou à seção de votação acompanhado de sua mulher, Asma.

A área estava sob controle rebelde na última eleição, em 2014, e sua escolha como local de votação ressaltou o sentimento de triunfo que permeou a campanha de Assad.

Esta é a segunda eleição realizada à sombra da guerra síria, sob os termos da nova Constituição, criada em 2012, que permitiu a participação de candidatos de oposição pela primeira vez desde a década de 60. A Carta também coloca Assad como o árbitro absoluto para decidir quem pode concorrer, o que deixa pouco espaço para uma competição verdadeira. Dois outros candidatos estão na disputa, mas são figuras desconhecidas, sem base eleitoral. 

Em comunicado conjunto, emitido na terça-feira, EUA, Reino Unido, França, Alemanha e Itália qualificaram a eleição como ilegítima. “Essa eleição fraudulenta não representa nenhum progresso na direção de um acordo político em relação à guerra de mais de uma década”, disse o comunicado.

A eleição também representa, segundo Robert Ford, que foi embaixador americano na Síria nos primeiros anos da rebelião contra Assad, o fracasso do esforço diplomático apoiado pelos EUA com o objetivo de obter uma transição por meio de um processo de paz organizado pela ONU, em Genebra, que se arrastou por sete anos sem dar nenhum resultado.

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A eleição ocorre somente na parte do país controlada pelo governo, pois dois terços da Síria continuam fora do controle de Assad. O fornecimento de eletricidade é errático e os estoques de combustível, escassos. Vastas áreas foram destruídas. Mais de 90% da população vive na pobreza, segundo a ONU. 

A fome aumenta conforme o colapso da moeda local torna itens básicos mais caros do que a maioria das pessoas comuns consegue pagar. Parece improvável que a eleição alivie de qualquer maneira essa rotina de sofrimento ou dê qualquer nova direção à política do governo. / WP, TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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