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Em viagem à Colômbia, papa sela papel de mediador em conflitos no continente

Pontífice argentino chega nesta quarta-feira a Bogotá para sacramentar negociação que levou ao fim das Farc; participação de Francisco já foi decisiva em reaproximação entre EUA e Cuba

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Por Redação
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BOGOTÁ - O papa Francisco chega nesta quarta-feira à Colômbia para promover o acordo de paz entre o governo colombiano e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Na véspera da viagem, o pontífice disse que chega ao palco de um conflito que durou mais de 50 anos com uma mensagem de reconciliação e paz. A visita coroa uma diplomacia ativa do Vaticano, principalmente na América Latina, onde intermediou acordos em Cuba e na Colômbia. 

Banca em Cartagena vende camisetas do papa, que vai à Colômbia promover a paz entre o governo e a guerrilha Foto: EFE/Ricardo Maldonado Rozo

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Nos nove meses desde que a Colômbia aprovou um histórico acordo de paz com o maior grupo rebelde do país para encerrar o mais duradouro dos conflitos na América Latina, a Igreja Católica emergiu como uma força orientadora para trazer rebeldes de volta à vida civil. O papa Francisco deve se esforçar para retomar tais esforços durante a viagem desta semana ao país sul-americano.

Hoje os padres estão celebrando missa nos rústicos campos onde os rebeldes depuseram suas armas. Assistentes sociais católicos estão ajudando antigos guerrilheiros a localizar parentes que não encontram há décadas. Nas comunidades rurais atingidas mais pesadamente pelo conflito de 53 anos, equipes da Igreja com psicólogos e assistentes sociais explicam o acordo de paz e facilitam encontros com os rebeldes dos quais muitos desconfiam.

O papa tem sido um dos principais defensores da paz nesse país profundamente católico, apelando aos líderes a favor e contra o acordo para que entrem em acordo quanto às suas diferenças. Ele vai conduzir uma prece pela reconciliação nacional na cidade de Villavicencio, onde 6 mil vítimas de todo o país devem se reunir. E ele vai beatificar um bispo colombiano assassinado em 1989 por guerrilheiros do Exército de Libertação Nacional, outro grupo esquerdista rebelde que agora negocia a paz.

Mas o pontífice também deve entrar em contato direto com a profunda discordância quanto ao acordo, que se disseminou mesmo dentro da Igreja.

“Certos setores são resistentes”, disse Fernan Gonzales, coordenador para paz e desenvolvimento em uma organização jesuíta em Bogotá. “Isso mistura questões relativas tanto à moralidade católica quanto a posições políticas.” 

As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), foram formadas em meados da década de 60 para criar uma insurreição armada, derrubar o sistema e abrir caminho para a redistribuição de terras em meio à desigualdade econômica no país.

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Grande parte das Farc tem sido historicamente hostil à religião, tanto por sua opinião de que a Igreja Católica era uma força reacionária que dava apoio ao Partido Conservador durante os dez anos de guerra civil conhecida como “La Violencia”, como da parte do ateísmo dos grupos rebeldes de ideologia comunista. Dezenas de padres foram assassinados e dezenas de igrejas danificadas ou destruídas no passar do tempo.

“Quase todas essas mortes foram atribuídas às guerrilhas de esquerda, em particular às Farc”, concluiu um relatório de 2004, apresentado à Comissão de Relações Exteriores do Senado americano.

Apesar do banho de sangue, a Igreja assumiu a posição de força de mediação. Durante quatro anos de negociações em Havana, que levaram ao acordo do ano passado, os padres acompanharam vítimas a Cuba para depor sobre atrocidades enfrentadas e defenderam grupos indígenas.

O próprio papa Francisco deu aos negociadores um forte incentivo quando visitou Cuba em 2015, dizendo que eles não tinham o direito de abandonar os esforços de paz. Ele disse que visitaria a Colômbia só quando um acordo fosse assinado.

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No total, o conflito deixou mais de 250 mil mortos, 60 mil desaparecidos e milhões de deslocados. Uma reduzida maioria de colombianos rejeitou o acordo em um referendo antes que ele fosse aprovado no Congresso. “As pessoas ainda acham que as Farc devem pagar com prisão e sangue”, disse Diego Lerma, um funcionário da Igreja que colabora com os esforços de reconciliação.

O primeiro ano de efetivação do acordo foi marcado pelas conquistas em busca de publicidade, como o desarmamento das Farc e pelos visíveis fracassos do Estado em levar serviços a comunidades situadas em áreas de difícil acesso, onde o governo historicamente teve pouca presença e onde os rebeldes estão iniciando um novo capítulo como civis.

Antigos guerrilheiros chegando a muitas das 26 zonas de desmobilização encontraram pouco mais que campos de lama, e meses depois muitos continuam vivendo em tendas em vez das construções com água corrente e eletricidade, prometidas pelo governo.  Vinte e dois ex-integrantes das Farc ou seus parentes foram mortos desde o fim das hostilidades, segundo um advogado do grupo rebelde, desde a semana passada transformado em partido político.

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Embora marxistas em sua ideologia, muitos dos rebeldes lembram-se de terem recebido sua primeira comunhão quando crianças e irem à Igreja com suas famílias. Eles guardaram terços para proteção e rezavam quando as bombas caíam. “Não acredito que nenhum de nós seja totalmente ateu”, disse Elkin Sepúlveda, que aderiu às Farc com 15 anos. “Todos temos em nossa cabeça os costumes de nosso avós. E, na maioria, nossos lares eram católicos.” / AP