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Em vitória de Trump, Suprema Corte decide que governo pode deportar imigrantes que buscam asilo

Medida permite que o governo deporte dezenas de milhares de imigrantes que vivem nos EUA de maneira mais rápida; cerca de 20 mil podem ser impactados

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Por Redação
Atualização:

A Suprema Corte dos Estados Unidos concedeu uma vitória a Donald Trump nesta quinta-feira, 25, em um caso-chave sobre imigração, determinando que o governo pode deportar imigrantes que buscam asilo sem necessidade de o caso ser avaliado por um juíz federal

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A medida, na prática, permite que o governo Trump deporte dezenas de milhares de imigrantes que vivem nos EUA. O caso diz respeito ao limite que as autoridades de imigração tem para deportar rapidamente migrantes que expressam medo de retornar aos seus países de origem, o que os tornaria elegíveis para asilo.

O processo, autorizado pela primeira vez em 1996 e conhecido como "remoção acelerada", leva semanas, em vez dos anos típicos que pode levar para se resolver um caso completo de deportação. Não envolve uma audiência perante um juiz de imigração nem oferece aos imigrantes o direito a uma advogado.

Os juízes da Suprema Corte decidiram, por 7 votos a 2, que os imigrantes não têm o direito de contestar sua remoção rápida no tribunal federal. Embora promulgada em 1996, a remoção acelerada foi usada com moderação até o governo de Barack Obama. Mas o presidente Donald Trump tentou expandir amplamente o poder da imigração e da alfândega dos EUA para usar a remoção rápida como meio de deportar qualquer imigrante que tenha chegado em até dois anos, afetando potencialmente cerca de 20 mil pessoas.

"Trump deixou muito claro que a Imigração e Alfândega dos EUA (ICE) tem autoridade para usar esse processo em todo o país", disse ao site Vox Kari Hong, professor da Faculdade de Direito da Boston College. “Eles podem começar a impedir alguém a qualquer momento, sob suspeita de que tenham cometido uma violação da imigração e deportá-los".

Na prática, se um agente de imigração avaliar que o migrante não corre riscos em seu país de origem, ele pode ser deportado sem passar por uma avaliação de um tribunal federal.

O edifício da Suprema Corte dos Estados Unidos, em Washington Foto: REUTERS/Will Dunham/File Photo

Na decisão, a Suprema Corte determinou que uma lei de imigração da era Clinton, conhecida como Lei de Reforma da Imigração Ilegal e Responsabilidade dos Imigrantes (IIRIRA), que impede os imigrantes de contestarem sua deportação no processo de remoção acelerada, não viola a Cláusula de Suspensão da Constituição, que protege privilégios de habeas corpus que permitem aos tribunais determinar se uma pessoa deve ser libertada devido a detenção ilegal.

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“Nesse caso, no entanto, o entrevistado não pediu para ser libertado. Em vez disso, ele buscou um alívio totalmente diferente: se livrar de sua 'ordem de remoção' e 'uma ordem que orienta o Departamento a fornecer-lhe uma nova oportunidade de solicitar asilo e outro alívio da remoção”, escreveu o juiz Samuel Alito, declarando que esse alívio está fora do escopo do habeas corpus de direito comum.

Vijayakumar Thuraissigiam era um requerente de asilo do Sri Lanka que alegou que o governo o submeteu a uma remoção rápida - argumentou em seu caso na Suprema Corte que a lei é inconstitucional e que os tribunais devem ter o poder de rever a decisão das autoridades de imigração de colocá-lo em remoção rápida.

Thuraissigiam é um tâmil, uma minoria étnica que foi sujeita a violações dos direitos humanos no Sri Lanka. Funcionários do governo o sequestraram, espancaram, torturaram com afogamento simulado e ameaçaram matá-lo. Portanto, ele queria que um tribunal federal revertesse sua remoção acelerada. Mas o governo Trump respondeu que ele não tem o direito de contestar o processo sob a Constituição ou a lei federal e que permitir que os migrantes o façam sobrecarregará os recursos do governo.

“O problema da decisão é que se o governo não enfrentar possíveis repercussões por submeter indevidamente migrantes com pedidos legítimos de asilo a uma remoção rápida, não terá incentivo para evitar que erros ocorram, e a decisão não será analisada por um juíz”, disse Kari Hong. 

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Medidas de Trump 

O governo Trump está tentando expandir a autoridade de agentes de imigração para que as pessoas detidas em qualquer lugar dos EUA e até dois anos depois de chegarem possam ser deportadas rapidamente. Na terça-feira, um tribunal federal de apelações rejeitou a decisão de um juiz que havia bloqueado a política ampliada. Outras questões legais ainda precisam ser resolvidas no caso.

Em uma opinião divergente, a juíza Sonia Sotomayor - acompanhada pela juíza Elena Kagan - argumentou que a decisão "priva (requerentes de asilo) de qualquer meio para garantir a integridade de uma ordem de remoção acelerada, uma ordem que, segundo o Tribunal, não está sujeita a nenhuma supervisão judicial significativa quanto ao seu conteúdo ".

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"A decisão prejudica a capacidade do Judiciário de cumprir seu dever constitucional de proteger a liberdade individual e desmantela um componente crítico da separação de poderes", continuou Sotomayor.

Os juízes Stephen Breyer e Ruth Bader Ginsburg concordaram com a decisão da maioria, mas em uma opinião concorrente de autoria de Breyer, deixaram claro que acreditam que a decisão se aplica apenas neste caso particular. "Concordo que a aplicação desses limites nesse caso específico não viola o comando constitucional da Cláusula de Suspensão", escreveu Breyer. "Mas não precisamos, e não devemos, ir mais longe."

Adotar uma abordagem mais ampla, disse Breyer, "pode levantar uma série de questões difíceis no contexto da imigração", questionando o que poderia acontecer em um caso de habeas corpus ser negado quando uma pessoa é detida depois de viver nos EUA por anos ou se alguém afirma ser um cidadão naturalizado.

"Eu evitaria, portanto, fazer declarações sobre a Cláusula de Suspensão que ultrapassam os princípios necessários para decidir este caso e muito menos chegar a conclusões sobre a Cláusula do devido Processo Legal, uma cláusula constitucional distinta que não está diretamente em questão aqui." 

Como funciona a remoção acelerada

O processo completo de deportação é demorado: os imigrantes têm o direito de buscar proteção nos EUA e devem ter a oportunidade completa de fazê-lo. Sob remoção rápida, no entanto, esse processo é condensado em questão de semanas, o que a maioria dos advogados de imigração afirma não ser propício para a construção de um processo legal a seu favor.

Se um migrante chegar aos EUA sem autorização e manifestar medo de perseguição no país de origem, um agente de Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA determinará primeiro se deve encaminhá-lo a um oficial de asilo nos Serviços de Cidadania e Imigração dos EUA para uma triagem conhecida como entrevista sobre "medo crível”.

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Se eles passarem na triagem, poderão lutar contra a deportação no tribunal de imigração, onde normalmente terão uma audiência inicial curta ante um juiz e um advogado do governo para saber mais sobre seus direitos e como o processo será encaminhado.

Geralmente, eles têm tempo para contratar um advogado e preparar seu caso, o que inclui a coleta de documentos que atestam experiências que podem torná-los elegíveis para alívio de deportação ou proteção sob o sistema de asilo ou acordos internacionais de tortura.

Esses procedimentos exaustivos no tribunal de imigração só são acessíveis aos migrantes se um agente os encaminha inicialmente a um oficial de asilo - caso contrário, eles podem enfrentar uma remoção rápida, na qual podem ser deportados sem nunca pisar em um tribunal ou ver um advogado. 

Como o caso poderia impactar os esforços de Trump para expandir as deportações

Embora promulgada em 1996, a remoção acelerada foi usada com moderação até o governo Obama. O presidente Donald Trump tentou expandir o programa ainda mais. Desde 2004, os EUA só conseguiram submeter uma pequena proporção de migrantes a remoção rápida: indivíduos presos a menos de 160 quilômetros de uma fronteira terrestre dentro de duas semanas após sua chegada.

Mas o governo Trump publicou uma regra no ano passado que também inclui imigrantes encontrados em qualquer lugar dos EUA se eles chegaram nos últimos dois anos, um grupo substancialmente maior.  

Um tribunal federal de apelações em Washington, DC, confirmou a regra no início desta semana, descobrindo que o Congresso havia oferecido ao Departamento de Segurança Interna "critério exclusivo e irreversível" sobre a possibilidade de expandir o escopo da remoção acelerada. A decisão dá aos agentes de imigração e alfândega dos EUA uma luz verde para varrer comunidades em todo o país em busca de imigrantes não autorizados e deportá-los rapidamente.

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Com a decisão, especialistas alegam que agora o uso de remoção acelerada poderá não ser contestado - mesmo quando o governo usar o processo para deportar indevidamente alguém com pedidos de asilo válidos. / The New York Times e Washington Post 

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