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Estilo Hillary inaugura nova diplomacia

Carismática, secretária de Estado busca contato com população e aproximação com governos antagonistas

Por Luciana Alvarez
Atualização:

Aliando pragmatismo e carisma, Hillary Clinton, a nova secretária de Estado dos EUA, conseguiu em pouco tempo se impor como personalidade de destaque na política mundial. Antes de completar dois meses no cargo, Hillary já viajou a países de três continentes, reuniu-se com líderes de China e Rússia, discutiu a paz no Oriente Médio com palestinos e israelenses e deu passos de aproximação em direção aos antigos rivais Síria e Irã - nomeou enviados especiais para Damasco e convidou Teerã a participar de uma futura cúpula sobre o Afeganistão. Além da agenda tradicional de reuniões com autoridades, Hillary incluiu em suas visitas ao exterior encontros com estudantes, mulheres, operários e a participação em programas de TV populares. Sempre sorrindo e brincando com os jornalistas, ela afirmou que seu esforço tenta recuperar a imagem dos EUA "não apenas entre os governos mundiais, mas também entre os povos". A ofensiva de charme parece estar rendendo bons frutos. Instigando a curiosidade popular sobre sua vida de ex-primeira-dama, ex-senadora e ex-candidata presidencial, Hillary foi recebida com euforia digna de uma estrela pop por quase todos os lugares por onde passou. No México, seu próximo destino, a recepção não deve ser diferente. "Hillary é uma política que se tornou diplomata, portanto traz para o novo cargo suas experiências da Casa Branca e Senado, onde desenvolveu excelentes habilidades de comunicadora e líder de opinião", afirmou ao Estado Edward Luck, vice-presidente do Instituto Paz Internacional, da Universidade Columbia. "Seu estilo se encaixa como um luva com o do presidente Obama. Essa abordagem é um novo paradigma não apenas para o Departamento de Estado, mas para a atuação dos Estados Unidos no cenário mundial." Na busca para conquistar apoio de todos os lados, Hillary enfatiza os interesses comuns sobre os pontos de discordância. Foi assim na visita à China, quando diminuiu o tom das críticas às violações aos direitos humanos. Fez o mesmo ao se encontrar com líderes russos e discutir os projetos de redução de armamentos. Para atrair o Irã, usou o ponto que preocupa ambos os países: a instabilidade no Afeganistão. "Ainda é cedo para julgar, mas pelo trabalho que mostrou até aqui, Hillary tem potencial para ser a melhor secretária de Estado que o país já teve", afirmou o professor de Relações Internacionais da Universidade Yale Nikolay Marinov. "Condoleezza (Rice, secretária de Estado que antecedeu Hillary) era uma pessoa de confiança do presidente Bush, mas alguém com menos peso estratégico no governo. Hillary está tentando ser uma voz independente, mesmo que, obviamente, siga as orientações do presidente." PRIMEIROS PROBLEMAS Com uma agenda lotada de atividades, Hillary não escapou de suas primeiras gafes. Respondendo a perguntas de jovens em Bruxelas no dia 6, disse que a democracia americana é mais antiga que a europeia. No mesmo dia, deu ao chanceler da Rússia um botão escrito "reset", em um convite simbólico para "reiniciar" as relações entre os países. Mas, por um erro de tradução, em russo lia-se a palavra "sobrecarregado". Nenhum dos dois incidentes abalou a credibilidade da secretária de Estado, mas a reverência mundial pode durar pouco. O sinal mais claro do fim da lua-de-mel veio de sua viagem ao Oriente Médio, onde não conseguiu agradar a todos, mesmo em uma missão destinada a "ouvir" cada lado. Com todo o cuidado para não interferir na política interna de Israel, cuja coalizão de governo estava sendo formada, Hillary marcou reuniões com os três principais líderes políticos. Mas não pôde evitar contrariar Benyamin Netanyahu - provável futuro premiê, liderando um governo de extrema direita - ao reiterar o "forte compromisso" americano com a solução de dois Estados. Para os palestinos, a mensagem soou mais como continuidade das antigas políticas do que como mudança - o jornal Al Quds se referiu a ela como "Condoleezza Clinton". Hillary continua se recusando a conversar com o Hamas enquanto o grupo não reconhecer Israel e também evitou chamar a presença de assentamentos judeus na Cisjordânia de "ocupação". "Ainda se discutirá muito se temos uma nova substância ou apenas um outro estilo", diz Marinov. "Mas há sim mudanças genuínas, por exemplo, na forma com que os EUA tratam seus aliados. A partir de agora, parece que eles vão ouvir mais, mas também cobrarão mais." Luck concorda que há transformações verdadeiras, mas alerta contra expectativas de viradas radicais. "Os principais interesses americanos não são alterados por uma eleição", afirma. "Mas a forma como se busca alcançar os interesse pode mudar drasticamente - como estamos vendo agora."

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