Estratégia para sair do Afeganistão

PUBLICIDADE

Por Leslie H. Gelb
Atualização:

Somente se o número de nossos soldados chegar a 100 mil e os combates alcançarem os refúgios dos taleban no Paquistão talvez Washington procure se esforçar para encontrar a estratégia alternativa no Afeganistão - retirar a maior parte das forças americanas e redirecionar nosso poderio para dissuadir e contornar pelos meios diplomáticos a ameaça terrorista. Mas então, será tarde demais. O presidente Barack Obama defronta-se atualmente com o clássico problema infernal: fazer muito mais para impedir a derrota e confiar na sorte, ou retirar-se e encarar as acusações de derrotismo, e talvez novos ataques terroristas. O objetivo de Obama é "garantir" que o Afeganistão não se torne um santuário para os terroristas, o que efetivamente reafirma seu slogan de campanha pedindo a vitória naquele país. Por isso decidiu enviar outros 17 mil soldados americanos para se juntar aos 35 mil que já estão no Afeganistão. Mas seu objetivo de eliminar o Taleban não é factível. Obama precisa levar em consideração outra alternativa. Nossa estratégia no Afeganistão deveria enfatizar o que sabemos fazer melhor (conter, dissuadir e formar coalizões) e reduzir aquilo em que nos saímos pior (construir nações em guerras sem fim). Isso contribuiria para reduzir nossos custos crescentes e garantiria nossos interesses, usando nosso poderio de modo mais criativo e prático. Também deveria permitir - o que aliás é crucial - que nos concentrássemos mais nos recursos americanos e na nossa influência na situação muito mais crítica no Paquistão. REFÚGIO Não podemos derrotar os taleban no Afeganistão, como ficou demonstrado nos últimos sete anos. Os números são parte do problema: em sua maioria, os talebans são membros da maior tribo do Afeganistão, os pashtuns. O que contribui para complicar ainda mais é o fato de que o Taleban e a Al-Qaeda construíram no noroeste do Paquistão um refúgio quase inexpugnável. Estes fatores tornam uma eventual derrota do inimigo no Afeganistão infinitamente mais difícil que no Iraque. O que podemos fazer é reduzir efetivamente o risco de ataques terroristas do Afeganistão contra seus vizinhos, os EUA e seus aliados. E podemos fazê-lo de um modo que permita a retirada das forças americanas, embora mantendo no país a ajuda econômica e militar. O primeiro passo é fornecer um apoio econômico, significativamente maior, bem como armas e treinamento, enquanto as forças de combate dos EUA sairiam gradativamente, num prazo de três anos. Poderíamos usar este período para aumentar as operações contra os rebeldes para proteger melhor os afegãos e dar-lhes a possibilidade de lutar por conta própria. O segundo passo é tentar separar os elementos menos radicais do Taleban de sua liderança. Obama já estuda a possibilidade de aproximar-se de talebans moderados. Nenhum grupo é monolítico quando testado com incentivos e ameaças. Os talebans não são exceção. Embora queiram expulsar os EUA, eles não têm nenhum interesse específico na exportação do terror. Por piores que sejam os talebans, o interesse vital dos EUA não exige sua exclusão do poder no Afeganistão. Em terceiro lugar, embora devêssemos conversar com o Taleban, Washington não pode confiar na sua palavra e, portanto, precisa pensar num esforço de dissuasão factível. Quanto mais os taleban se estabelecerem no interior do Afeganistão, mais vulneráveis serão à punição americana. Eles podem ser alcançados por aviões não tripulados ou por ataques aéreos. Em quarto lugar, Obama precisa cercar o Afeganistão com uma coalizão de países vizinhos para mostrar ao Taleban que ele não tem onde procurar ajuda, após os americanos saírem. O grupo incluiria China, Índia, Rússia, aliados da Otan, e o próprio Irã. Todos têm um interesse considerável em impedir a disseminação das drogas afegãs e do extremismo islâmico. Depois, está o Paquistão, o cerne do problema e a solução. O futuro pacífico da região depende da firmeza e da capacidade dos líderes do Paquistão em dar um governo decente a seu povo. China, Índia, Irã e Rússia poderiam cooperar com Washington simplesmente porque não há motivação maior do que o pesadelo de extremistas no controle das armas nucleares do Paquistão. A retirada não precisa significar uma derrota para os EUA e uma vitória para os terroristas, se for efetivamente usado todo o poderio americano. Mas tentar eliminar a ameaça do Taleban e da Al-Qaeda no Afeganistão é algo impossível, enquanto encontrar uma forma de conviver, conter e dissuadir o Taleban é um objetivo que pode ser alcançado. Além disso, a estratégia de contenção e dissuasão se adapta melhor ao poderio americano do que a atual estratégia de combate aos rebeldes e de construção de uma nação. Obama e o Congresso devem aos afegãos e aos americanos a criação de uma estratégia para uma saída, antes de tomarem outra importante decisão no sentido de ampliar a guerra. *Leslie H. Gelb é colunista

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.