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ETA definhou ao perder ''''santuário'''' na França

Caso do grupo mostra que fim de apoio de países vizinhos a extremistas é crucial para derrotá-los

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Por Lourival Sant'Anna
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Madri - A história mostra que um país dificilmente consegue derrotar um grupo guerrilheiro ou terrorista enquanto ele conta com a complacência ou o apoio ostensivo de Estados vizinhos, como fazem a Venezuela e o Equador com as Farc. O exemplo cabal é o definhamento do grupo separatista Pátria Basca e Liberdade (ETA) depois que deixou de ter a França como santuário. Quando a ETA surgiu, em 1959, a Espanha estava sob a ditadura fascista de Francisco Franco (que durou de 1936 até sua morte, em 1975). Nesse período, a França reconhecia como perseguidos políticos os militantes da ETA, que usavam o território francês como santuário e base para suas operações contra a Espanha. "Havia um pacto silencioso: o governo da França deixava a ETA atuar em seu território, e em troca a ETA não alentava o nacionalismo dos bascos franceses", disse ao Estado o editor-chefe da agência Vasco Press, Florencio Domínguez, de Bilbao. O País Basco francês, onde vivem 200 mil pessoas, faz parte da reivindicação histórica dos bascos por um Estado unificado. No processo de democratização, a Constituição de 1978 e o Estatuto da Autonomia, de 1979, garantiram generosos direitos às comunidades da Espanha, como o País Basco. Os radicais se sentiram ameaçados. Em reação, no fim dos anos 70 o grupo lançou seus atentados mais sangrentos. Entre 1958 e 1977, a ETA matou 75 pessoas; desde então, foram 800 mortos. No governo de Giscard D?Estaing (1974 a 1981), França e Espanha viveram às turras, como ocorre hoje entre Venezuela e Colômbia. Paris bloqueava o ingresso dos espanhóis na Comunidade Européia e havia conflitos comerciais. Os franceses começaram a mudar de atitude no governo do socialista François Mitterrand (1981 a 1995). A gota d?água foi o atentado da ETA contra o senador socialista espanhol Enrique Casas, em 1984. Segundo Domínguez, os socialistas franceses se perguntaram: "Como é possível que matem alguém como nós?" Mitterrand se engajou na intermediação entre a ETA e Madri. Mas, em setembro de 1984, a ETA esnobou o líder francês, ao não comparecer a uma reunião por ele articulada com um enviado do governo espanhol. No dia seguinte, a França extraditou para a Espanha quatro etarras. A colaboração cresceu a partir do governo de coabitação entre Mitterrand e o premiê Jacques Chirac, de centro-direita, formado em 1986. A polícia francesa lançou operações que levaram à prisão de muitos etarras, e as condenações por suas atividades foram elevadas, na França, de alguns meses de prisão para até 10 anos. Como a França tinha poucos policiais antiterror, começou a fazer vista grossa à entrada de investigadores espanhóis. Essa licença levou à captura, em 1992, de toda a cúpula da ETA, em Bidart, no País Basco francês. Diante da pressão na França, os militantes da ETA se dispersaram pelo mundo e o grupo perdeu força. Hoje, tem cerca de 100 militantes armados, depois de ter chegado a 500 no fim dos anos 70. "A ETA deixou de ser um problema político, entre governos, e passou a ser um problema técnico, entre policiais", conclui Domínguez. Para que isso ocorra com as Farc, muita coisa tem de mudar na Venezuela e no Equador.

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