EUA movimentam tropas em Taiwan após China testar míssil hipersônico

Pequim nega lançamento, mas americanos estão preocupados com a possibilidade de uma corrida armamentista envolvendo tecnologia capaz de driblar sistemas de defesa

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Por Redação
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TAIPEI — Os Estados Unidos realizaram exercícios militares no estreito de Taiwan no fim da semana passada em conjunto com o Canadá, em meio ao aumento das tensões no Pacífico, segundo autoridades americanas. O anúncio foi fortemente condenado pela China, que acusou os americanos e canadenses de terem “prejudicado seriamente a paz e a estabilidade na região”.

Os comentários de Pequim vieram um dia após o jornal britânico Financial Times revelar que os chineses testaram em agosto um míssil hipersônico com capacidade nuclear que circundou a Terra antes de acelerar em direção ao seu alvo, e que isso teria surpreendido a inteligência militar americana, segundo cinco fontes não identificadas pelo jornal. Pequim negou nesta segunda-feira a a realização do teste. 

Bombardeiro chinês PLA Xian H-6, após incursão de mais de 50 aeronaves militares na zona de defesa aérea de Taiwan. Foto: EFE/EPA/Ministério da Defesa do Taiwan

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O Financial Times afirmou que “cinco pessoas com conhecimento do teste disseram que os militares chineses lançaram um foguete que carregou um veículo planador hipersônico que voou em órbita baixa antes de seguir em direção a seu alvo”. O míssil teria errado a meta em cerca de 38 quilômetros, mas ainda assim o experimento demonstrou que a China fez “um progresso surpreendente em armas hipersônicas e está muito mais avançada do que os americanos sabiam.” O teste também levantou novas questões sobre por que os EUA frequentemente subestimam a modernização militar da China. "Não temos ideia de como eles fizeram isso", disse uma quarta fonte do jornal.

Segundo o porta-voz do Ministério chinês das Relações Exteriores, Zhao Lijian, o que ocorreu foi "um teste de rotina de um veículo espacial, com o objetivo de testar a tecnologia deste tipo de dispositivo reutilizável". 

Os Estados Unidos, a Rússia e a China estão desenvolvendo armas hipersônicas, incluindo veículos planadores lançados ao espaço em um foguete, mas que orbitam a Terra com seu próprio impulso. Eles voam a cinco vezes a velocidade do som, menos que um míssil balístico, mas não seguem a trajetória parabólica fixa desses projéteis e são manobráveis, o que os torna mais difíceis de rastrear.

"Estamos muito preocupados com o que a China está fazendo atualmente no âmbito hipersônico", disse nesta segunda o representante permanente de Washington para questões de desarmamento, Robert Wood, que após sete anos em Genebra abandonará seu cargo na próxima semana e voltará para Washington. 

O embaixador americano disse que a Rússia também conta com essa capacidade hipersônica. E, de acordo com o diplomata, os Estados Unidos "se abstiveram de prosseguir" o desenvolvimento militar dessa tecnologia, que se refere a objetos capazes de voar na velocidade Mach 5, inclusive acima disso. Estes artefatos são manobráveis, o que dificulta sua detecção e interceptação. Diante do desenvolvimento deste tipo de armamento, "não temos outra opção a não seja reagir na mesma linha", alegou Wood.

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Exercicíos militares em Taiwan

O contratorpedeiro de mísseis guiados Arleigh Burke USS Dewey trafegou pela estreita via navegável que separa Taiwan da China juntamente com a fragata canadense HMCS Winnipeg na quinta e sexta-feira, disseram os militares dos EUA. "O trânsito de Dewey e Winnipeg pelo Estreito de Taiwan demonstra o compromisso dos Estados Unidos e de nossos aliados e parceiros com um Indo-Pacífico livre e aberto", afirmaram em documento.

Considerada por Pequim uma província rebelde, a democrática Taiwan está sob crescente pressão militar e política para ser reintegrado ao resto da China, mas os governantes de Taipé prometeram defender a liberdade da ilha. 

Ao longo de um período de quatro dias desde 1º de outubro, Pequim chegou a enviar cerca de 150 aeronaves à Zona de Identificação de Defesa Aérea de Taiwan — apesar de ser considerada espaço aéreo internacional, o território considera que pode exigir que as aeronaves que por ali trafegam se identifiquem por motivos de segurança nacional.

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"Os Estados Unidos e o Canadá se uniram para provocar e criar problemas, pondo seriamente em risco a paz e a estabilidade do Estreito de Taiwan", disse o Comando Conjunto Oriental do Exército de Libertação Popular da China, segundo o qual suas forças monitoraram os navios e "montaram guarda" durante sua passagem. “Taiwan faz parte do território chinês. As forças conjuntas sempre mantêm alerta máximo e se opõem resolutamente a todas as ameaças e provocações.”

Os navios da Marinha americana têm transitado pelo estreito quase uma vez por mês, assim como os de aliados dos EUA, incluindo o Reino Unido no mês passado, para irritação de Pequim, que acusou Washington de alimentar tensões regionais.

Os EUA e a Rússia também estão desenvolvendo mísseis hipersônicos e, no mês passado, a Coreia do Norte disse que testou um míssil hipersônico recém-desenvolvido. Em um desfile de 2019, a China apresentou o avanço do armamento, incluindo seu míssil hipersônico, conhecido como DF-17.

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O Pentágono também desenvolve um planador hipersônico denominado ARRW (pronuncia-se "Arrow", que significa "flecha" em inglês), mas seu primeiro teste em grande escala em abril deste ano fracassou.

Os mísseis balísticos voam para o espaço sideral antes de retornar em trajetórias inclinadas em velocidades mais altas. As armas hipersônicas são difíceis de defender porque voam em direção a alvos em altitudes mais baixas, mas podem atingir mais de cinco vezes a velocidade do som — ou cerca de 6.200 km por hora.

Corrida armamentista 

"A tecnologia hipersônica é somente um aspecto de todas as preocupações que temos em relação à militarização da China. Sua força nuclear estratégica é, para nós, uma grande preocupação há muito tempo", disse o embaixador. "Por isso, esperamos poder criar um marco bilateral com a China para discutirmos sobre a redução de riscos", insistiu.

Wood também se preocupa com o risco de uma corrida armamentista vinculada ao desenvolvimento deste novo tipo de armas. "Não sabemos como nos defender dessa tecnologia e a China e Rússia também não sabem", afirmou.

A ameaça à segurança representada pela ascensão da China será tema importante das discussões futuras da Otan, disse o secretário-geral da aliança, Jens Stoltenberg, ao jornal Financial Times, marcando uma nova abordagem diferente dos objetivos do grupo.

Stoltenberg afirmou que, embora a China não fosse um “adversário”, estava agindo de forma que impacta na segurança europeia por meio de suas capacidades cibernéticas, novas tecnologias e mísseis de longo alcance. Como defender os aliados da Otan dessas ameaças será abordado "completamente" pela aliança para a próxima década, disse ele.

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A aliança militar passou décadas focada no combate à Rússia e, desde 2001, ao terrorismo. O novo foco na China surge em meio a uma mudança determinada na orientação geopolítica dos EUA da Europa para um conflito hegemônico com Pequim. / REUTERS, AP e AFP

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