EUA pressionam países da ONU por apoio à guerra

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Por Agencia Estado
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Altas autoridades dos Estados Unidos foram enviadas sem alarde, nos últimos dias, às capitais de países-chave do Conselho de Segurança (CS) da Organização das Nações Unidas (ONU) e vêm advertindo líderes para votar com os Estados Unidos na questão do Iraque, ou correr o risco de "pagar um alto preço". Para alguns países, como Angola, Guiné e Camarões - nações africanas cujas privações receberam pouca atenção, antes de ocuparem cadeiras no CS -, existe a possibilidade de benefícios no futuro, caso apóiem os esforços de Washington pela aprovação de uma nova resolução na ONU. "Por muito tempo, temos pedido ajuda para reconstruir nosso país depois de anos de guerra", lembrou o embaixador angolano, Ismael Gaspar Martins. "Ninguém está vinculando o pedido ao apoio na questão do Iraque, mas está tudo ocorrendo ao mesmo tempo." O presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, reuniu-se na quinta-feira na capital, Luanda, com o subsecretário de Estado Walter Kansteiner, que desviou-se de uma viagem à África do Sul para encontrar-se com os líderes das três nações africanas no CS. "Na África, a mensagem é simples: O tempo está acabando e achamos que vocês têm de nos apoiar", revelou um diplomata norte-americano que pediu para não ser identificado. Nova resolução - EUA, Grã-Gretanha e Espanha apresentam hoje uma resolução ao CS e querem que ela seja votada até meados de março - quando as condições climáticas no Iraque ainda são favoráveis a uma campanha militar. Para terem sua resolução aprovada, os EUA têm de garantir nove votos dos 15 membros do CS e evitar que França, Rússia e China - que defendem a continuidade das inspeções - exerçam o direito de veto. Os EUA e a Grã-Bretanha são os outros membros com direito a veto. No sábado, Bush minimizou dúvidas sobre se a resolução sobreviveria às profundas divisões no conselho. "Estamos apenas começando" a recrutar os aliados, afirmou ele a jornalistas. "A ordem da Casa Branca é para usar todos os meios diplomáticos necessários", disse outro diplomata norte-americano. "E isso significa realmente todos." Apesar de Washington e Londres considerarem que já têm a autorização necessária para desarmar o Iraque à força, muitos aliados-chave - como a Turquia - têm dito que uma nova resolução os ajudaria a superar a oposição interna. O respaldo do CS daria legitimidade internacional a uma guerra e significaria que Washington poderia dividir com as Nações Unidas os custos da reconstrução do Iraque. Até agora, Washington só tem os votos garantidos de Grã-Bretanha, Espanha e Bulgária. Já que a Alemanha e a Síria afirmam que não vão apoiar a resolução e o Paquistão quase certamente vai optar pela abstenção, os Estados Unidos têm de convencer o trio africano, assim como o Chile e o México, a votarem sim. Caso contrário, a resolução não será aprovada. México e Chile - Diplomatas do México consideraram que a visita de autoridades dos EUA nos últimos dias teve um tom hostil. "Eles na verdade nos disseram: Qualquer país que não nos acompanhar pagará um preço muito alto", relatou um diplomata mexicano. Para grande frustração da administração Bush, o México, que se tem oposto abertamente à guerra, está sendo um dos votos mais difíceis de ser conquistado. O primeiro-ministro espanhol, José Maria Aznar, também fez uma visita ao México na semana passada, mas saiu de mãos vazias. Diplomatas avaliam que a administração Bush tem muito pouco a usar para amedrontar ou seduzir o México, agora que o país não mais recebe ajuda norte-americana e que o que ele mais queria - legalizar o status dos mexicanos ilegais nos EUA - foi tirado da mesa há mais de um ano. Algumas vezes, é difícil saber de antemão o que está em jogo. Em 1991, os EUA cancelaram uma ajuda anual de US$ 24 milhões ao Iêmen depois que o então membro do CS votou contra a resolução autorizando a ação militar contra o Iraque que culminou na Guerra do Golfo. Um fator que atualmente atrapalha a pressão norte-americana é um acordo de bastidores entre México e Chile, segundo o qual os dois países de língua espanhola concordaram em se abster se os cinco membros permanentes do CS (China, EUA, França, Grã-Bretanha e Rússia) não chegarem a um acordo sobre o Iraque. "Estamos apenas garantindo que não seremos manipulados nem comprados por nenhum lado", comentou um diplomata chileno. A França também está fazendo sua parte para rebater o lobby norte-americano e tenta impedir que os países que apoiaram o prosseguimento das inspeções de armas passem para as fileiras dos Estados Unidos. O principal foco da influência francesa é a África, onde já exerceu o papel de potência colonial. Durante uma reunião de cúpula de líderes africanos realizada na semana passada em Paris, o presidente francês, Jacques Chirac, alegou ter obtido apoio unânime entre os presentes de que a melhor forma de desarmar o Iraque é com o prosseguimento das inspeções de armas, não com a guerra. Não está claro ainda se isso significa que os membros africanos do CS da ONU votarão contra a resolução norte-americana. Gaspar Martins, de Angola, apenas constatou que a busca por votos faz parte do jogo da diplomacia internacional. "Se eu fosse Estados Unidos ou França, estaria fazendo o mesmo. Para obter resultados, você precisa oferecer muito diálogo, atenção e comunicação."

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