EUA vão mudar função de soldados no Iraque para mantê-los no país

Para driblar obrigação de retirada, militares que atuam em combate serão renomeados ?conselheiros? ou ?instrutores?

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Por Elisabeth Bumiller
Atualização:

Apesar de o acordo com o governo iraquiano estabelecer que os soldados combatentes americanos devem ser retirados das principais cidades do Iraque até o fim de junho, planejadores militares reconhecem silenciosamente que muitos desses soldados permanecerão na ativa - mas renomeados como "instrutores" e "conselheiros". Ou seja, soldados que deveriam ser afastados de confrontos continuarão envolvidos em combates. A diferença é que serão chamados por outro nome. "Às vezes são feitos disparos contra os instrutores e eles são obrigados a responder", disse John A. Nagl, tenente-coronel da reserva e um dos autores do novo manual de campo de combate à insurgência elaborado pelo Exército. Trata-se de um tema difícil para o presidente eleito Barack Obama, cuja promessa de campanha de "acabar com a guerra" incendiou seus eleitores e ajudou a impulsioná-lo até a Casa Branca. Mas, agora que Obama começou a reunir-se com seus novos conselheiros militares - os dois principais, o secretário da Defesa, Robert Gates, e o almirante Mike Mullen, chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, são remanescentes do governo de George W. Bush -, tornou-se claro que a definição dele de acabar com a guerra significa deixar no Iraque vários milhares de soldados americanos. PRAZOS SOBREPOSTOS Um dos motivos para isso é que Obama está enfrentando prazos de retirada cada vez mais próximos, que muitas vezes se sobrepõem, alguns dos quais foram definidos pelo governo Bush e pelos iraquianos, e outros pelo próprio Obama. Depois de junho de 2009, aproxima-se maio de 2010, 16 meses após Obama ter assumido o cargo, o mês estabelecido por ele como limite para ter retirado do Iraque todas as forças americanas. Depois, vem dezembro de 2011, o prazo estabelecido pelo acordo de status das forças para que tenham sido retirados do Iraque todos os soldados americanos. Para tentar atingir essas metas sem arriscar a frágil e relativa estabilidade do Iraque, os planejadores militares dizem que vão designar alguns soldados combatentes para funções de treinamento e apoio aos iraquianos, mas esses soldados ainda estariam armados e ainda participariam de patrulhas de combate com seus colegas iraquianos. Assim, apesar do seu papel ser redefinido, os perigos que eles enfrentam seriam os mesmos. "Quando você está num combate, não faz diferença se você é conselheiro: sua vida está em risco", disse Andrew Krepinevich, especialista militar do Centro de Avaliações Orçamentárias e Estratégicas, um grupo de pesquisas. "As balas não vêm endereçadas, algumas com ?conselheiro? e outras com ?soldado? escrito nelas." Há 146.000 soldados americanos no Iraque, incluindo equipes de serviço e apoio. NEGOCIAÇÃO O general Ray Odierno, comandante máximo no Iraque, evita falar sobre o possível número de soldados que permaneceria nas cidades após o prazo estabelecido para junho de 2009. E disse que a quantidade exata de homens terá de ser negociada com os iraquianos. Mas alguns especialistas, como Michael E. O?Hanlon, bolsista do Instituto Brookings, argumentam que cerca de 10 mil soldados americanos deveriam permanecer em Bagdá na segunda metade de 2009, e outros milhares espalhados pelas cidades de todo o país. De sua parte, o general Odierno deixou claro que os iraquianos ainda precisarão de ajuda - e os EUA certamente não desaparecerão do país. "Eu diria que ainda manteremos nossa parceria de extrema proximidade com as forças de segurança iraquianas em todo o país, mesmo após o verão (no Hemisfério Norte)", disse ele aos repórteres. Funcionários do Exército dizem que podem atingir este objetivo por meio da mudança nominal da função dos soldados que permaneceram no país. Oficialmente, um soldado combatente é uma pessoa treinada naquilo que são chamadas de especialidades ocupacionais militares codificadas para o combate - entre elas a infantaria, artilharia e as Forças Especiais - para enfrentar o inimigo. Mas os soldados combatentes podem receber missões diferentes. Do ponto de vista dos militares, o soldado combatente não é tão definido pela maneira como é chamado quanto pela atividade que desempenha. Ninguém espera que a presença americana termine rapidamente - em especial, o secretário da Defesa, Robert Gates. Quando Charlie Rose perguntou a Gates durante entrevista concedida à rede de TV pública PBS na semana passada qual seria o tamanho da força americana "residual" presente no Iraque depois de 2011, Gates respondeu que apesar de desempenharem missões diferentes, "eu estimaria que haverá provavelmente dezenas de milhares de soldados americanos ainda no Iraque".

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