Ex-motorista de Bin Laden é condenado por apoiar terrorismo

Primeiro detento de Guantánamo a ser julgado, o iemenita Salim Hamdan pode pegar pena de prisão perpétua

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Por Patrícia Campos Mello
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O iemenita Salim Hamdan, ex-motorista do terrorista Osama bin Laden, foi condenado ontem por apoio material a atos de terrorismo. Foi o primeiro veredicto de um detento da prisão de Guantánamo desde que ela foi criada, em 2002. Ao todo, ele foi condenado por cinco das oito acusações, mas acabou absolvido da mais grave - a de conspirar com a Al-Qaeda para cometer atos de terrorismo. Hamdan foi julgado por uma comissão militar de poderes especiais. O júri, composto por seis militares, deve anunciar hoje a sentença. Ele pode pegar até prisão perpétua. O juiz Keith Allred, que presidiu o julgamento, disse que os sete anos que Hamdan esteve preso em Guantánamo poderiam ser descontados da pena. O Pentágono, no entanto, já disse que todos os acusados - culpados ou não - permanecerão presos como "combatentes inimigos" pelo tempo que durar a "guerra ao terror". Ao ouvir o veredicto, Hamdan levantou as mãos e chorou. Os advogados de defesa devem recorrer da decisão e argumentar que ser motorista de Bin Laden não é um crime de guerra. O objetivo é levar o caso até a Suprema Corte. O julgamento abre caminho para que as comissões militares julguem até 80 presos de Guantánamo. Acusações já foram apresentadas contra outros 19 detentos. Críticos afirmam que Hamdan não tinha um papel importante na organização e foi usado como cobaia para testar o funcionamento das comissões militares. A Casa Branca comemorou a condenação. "Estamos satisfeitos que ele tenha recebido um julgamento justo", disse o porta-voz da presidência, Tony Fratto. Mas grupos de defesa dos direitos humanos criticaram o julgamento. "O sistema (de comissões militares) foi desenhado para permitir que os promotores apresentem os supostos crimes dos detentos, enquanto escondem os crimes dos interrogadores do governo", denunciou Antony Romero, da União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU, na sigla em inglês). Os promotores afirmaram que Hamdan fazia parte da cúpula da Al-Qaeda, mas os advogados de defesa argumentaram que ele era um homem com pouco estudo, que era apenas o motorista de Bin Laden. Hamdan tem 37 anos, dois filhos e é semi-analfabeto. Os advogados de defesa apresentaram as respostas escritas por Khalid Sheik Mohammed, o mais famoso detento de Guantánamo e idealizador confesso do 11 de Setembro, que descreve Hamdan como um "beduíno primitivo" que só servia para trocar pneus e lavar o carro. O julgamento de Hamdan foi alvo de várias contestações judiciais e se transformou em uma decisão sobre a validade das comissões militares criadas pelo presidente George W. Bush. Em 2006, a Suprema Corte bloqueou a tentativa de julgar Hamdan na comissão militar porque ela privava os réus de uma série de direitos presentes em tribunais comuns. As comissões aceitam testemunhos obtidos sob tortura, os advogados dos réus não têm acesso a parte das provas e não podem discuti-las com o cliente. O julgamento de Hamdan foi cercado de sigilo. Algumas testemunhas depuseram secretamente e não há gravação das audiências. Charles Swift, advogado que defende Hamdan, disse que o julgamento não segue as leis dos EUA. Recentemente, ele chamou a comissão militar de "um tribunal de mentirinha feito para julgar todo o mundo de quem não gostamos".

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