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Exército do Sudão rejeita extraditar ditador que depôs

Oficiais dizem que crimes de Omar al-Bashir em 30 anos no poder serão julgados no Sudão; manifestações por democracia crescem

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Por Redação
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CARTUM - Um dia após anunciar a deposição do presidente Omar al-Bashir, oficiais das Forças Armadas, que tomaram o poder no país, disseram que não vão extraditar o ex-chefe de Estado, que o Tribunal Penal Internacional quer julgar por crimes contra a humanidade relacionados com atrocidades cometidas na região de Darfur.

Sudaneses ignoram toque de recolher e mantêm protestos em todo o país Foto: Reuters

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Ele será julgado no Sudão, disseram militares. A extradição abriria um precedente que poderia ser usado contra os próprios militares, que prometeram deixar o poder em dois anos. O ator e ativista George Clooney, que chegou a ser preso por protestar contra a guerra em Darfur, aderiu à pressão pela extradição de Bashir.

Milhares de manifestantes sudaneses acamparam nesta sexta-feira diante da sede das Forças Armadas, desafiando o toque de recolher decretado após a deposição de Bashir na quinta-feira. A inesperada queda de Bashir foi o ápice de meses de protestos em todo o país, atos liderados por profissionais frustrados com o caos econômico e o isolamento internacional em razão das três décadas de um brutal regime.

Os protestos ganharam força no fim de semana quando uma multidão sentou diante da sede das Forças Armadas, onde também fica a residência presidencial. Médicos denunciaram pelo Twitter que mais de 35 pessoas foram mortas nos últimos dias.

Os militares criaram uma junta e indicaram o general Awad Mohamed Ahmed Ibn Auf como presidente interino. O anúncio enfureceu a multidão, que exige uma breve transição para um governo civil. Alguns argumentam que pouca coisa mudou. “Eles removeram um ladrão e colocaram outro”, dizia um dos cartazes levados pelos manifestantes. Awad renunciou ontem, e em seu lugar assumiu o general Abdel Fattah Burhan Abdelrahman.

A Associação Sudanesa de Profissionais, que organizou a maioria dos recentes protestos, disse no Twitter que rejeita o anúncio do Exército. “Essa rejeição tem como base a experiência do povo sudanês de lidar com todo tipo de decepções e com o teatro do absurdo, especialmente do atual regime.” “Resistiremos ao estado de emergência, ao toque de recolher e a todos os procedimentos que os golpistas anunciarem”, acrescentou. “Seremos vitoriosos como fomos no passado contra todo tipo de violência e terrorismo que o regime tentou usar contra o povo.”

Horas antes das orações de sexta-feira, após as quais os manifestantes retomariam os protestos, o presidente interino tentou atender às demandas da população, dizendo que o período de transição pode ser de até um mês se o “caos acabar”. Os militares “não querem forçar o povo a nada” e desejam criar uma atmosfera para o diálogo”, disse.

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Outro oficial, identificado como general Omar Zein Abedeen, disse que a extradição de Bashir deixaria “uma marca muito feia no Sudão”. Por décadas, o governo Bashir sobreviveu à fome, a guerras, a bombas e a acusações de genocídio, mas só conseguiu ser afetado pelo ultraje público com relação à má situação da economia.

A chefe da agência de direitos humanos das Nações Unidas, Michelle Bachelet, pediu ontem aos novos líderes do Sudão que cooperem com o Tribunal Penal Internacional. Muitos também pedem o julgamento dos responsáveis pelas brutais táticas usadas pelas forças de segurança e os serviços de inteligência do Sudão desde dezembro para dispersar os protestos contra o governo.

Os disparos deixaram mais de 60 manifestantes mortos desde meados de março, disseram grupos de defesa dos direitos humanos e médicos. De acordo com denúncias feitas pelas redes sociais, as forças de segurança retiravam as pessoas de suas casas e as espancavam, além de entrar nos hospitais atirando, às vezes até mesmo contra médicos e enfermeiros.

O paradeiro de Bashir ainda era incerto ontem. Há dias ele não aparece em público e a única informação sobre ele foi dada pelo presidente interino, que na quinta-feira disse que ele estava “em um lugar seguro”. Um funcionário sudanês disse que ele estaria preso na residência oficial, em Cartum, sob intensa vigilância. / NYT

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