França e Equador suspeitam de Uribe

Governo colombiano sabia que líder das Farc morto negociava com Paris e Quito libertação de reféns, afirmam os dois países

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Por Andrei Netto e PARIS
Atualização:

Ao ordenar o ataque à base das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), na fronteira com o Equador, e matar o número 2 do grupo, Raúl Reyes, o presidente colombiano, Álvaro Uribe, sabia que estava sacrificando o maior interlocutor da guerrilha com os governos da França e do Equador, na intrincada negociação para libertação dos 40 reféns políticos mantidos em cativeiro na selva. A porta-voz da chancelaria francesa, Pascale Andréani, confirmou ontem que Bogotá tinha conhecimento de que Paris mantinha contato para a libertação de reféns com Reyes. "Tínhamos contatos com Raúl Reyes, e os colombianos sabiam disso", afirmou Pascale em Paris. Em Genebra, relata o correspondente Jamil Chade, o ministro da Justiça do Equador, Gustavo Jalkh, também confirmou que Quito estava envolvido em um diálogo com o grupo armado para a liberação de alguns reféns, entre eles Betancourt. "Havíamos dito isso ao governo colombiano, que sabia até mesmo dos detalhes da operação", disse Jalkh, praticamente repetindo a declaração da porta-voz francesa. Reyes seria o contato em um eventual encontro com o presidente francês, Nicolas Sarkozy, que na semana passada anunciou a disposição de ir à América Latina para libertar a refém franco-colombiana Ingrid Betancourt. A denúncia de que Uribe sabia do papel central de Reyes nas negociações com a França para a libertação dos reféns das Farc havia sido feita na segunda-feira ao Estado por Fabrice Delloye, diplomata e ex-marido de Ingrid. Ontem, um comunicado emitido na Colômbia pelo comando dos guerrilheiros aumentou a controvérsia. "O comandante Reyes caiu cumprindo a missão de concretizar, por intermédio do presidente venezuelano, Hugo Chávez, um encontro com o presidente Sarkozy, no qual se tentaria encontrar uma solução para a situação da refém Ingrid Betancourt e para o acordo humanitário", segundo mensagem do grupo. FIM DO SILÊNCIO A palavra oficial da diplomacia francesa sobre a denúncia veio à noite, em Paris. Por volta de 21h (17h de Brasília), depois de um dia de silêncio, o porta-voz da presidência, David Martinon afirmou que "o presidente da República declarou publicamente sua disposição em ir à fronteira da Colômbia com a Venezuela para recuperar Ingrid Betancourt, se esta fosse a condição para sua libertação." O texto segue informando que "a possibilidade foi discutida com o presidente Chávez em meio à visita do chanceler francês, Bernard Kouchner, a Caracas, em fevereiro, e segue valendo". De forma indireta, o governo de Álvaro Uribe também admitiu a informação ao revelar o suposto conteúdo de e-mails enviados por Reyes a partir de computadores localizados no acampamento das Farc onde ocorreu a ofensiva militar, no território equatoriano. Nas mensagens (leia mais ao lado), Reyes diz que precisa falar com Noel Saez, ex-cônsul francês em Bogotá e emissário do governo Sarkozy na selva colombiana, sobre a situação de Ingrid. Nos mesmos computadores, constaria documentos indicando que Chávez teria entregue às Farc US$ 300 milhões, aparentemente em meio às negocições para a libertação dos reféns da guerrilha. Nos bastidores diplomáticos em Paris, é cada vez mais evidente a insatisfação do governo da França em relação às ações de Uribe no caso Betancourt. Oficialmente, entretanto, até a noite de ontem nenhum porta-voz do governo de Nicolas Sarkozy havia condenado a ofensiva militar da Colômbia em território equatoriano. Apesar da crise na América Latina - e fiel ao pragmatismo de Sarkozy -, o governo francês já trabalha para forjar um novo interlocutor com as Farc. Até o momento, os nomes mencionados em Paris são os de Luciano Marin Arango, conhecido como Iván Márquez, e Rodrigo Granda, ex-porta-voz da organização guerrilheira, exilado em Cuba.

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