Governadores ignoram Bolsonaro e oferecem acordo direto com EUA para defesa do clima

Governos de 23 Estados brasileiros se colocaram como porta de entrada para compartilhar ações que envolvam o combate ao desmatamento e redução de emissões de gases de efeito estufa

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Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA - Em uma carta enviada ao presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, governos de 23 Estados brasileiros se colocaram como porta de entrada para compartilhar ações que envolvam o combate ao desmatamento e redução de emissões de gases de efeito estufa. Trata-se de uma ação direta dos governadores ao presidente americano, às vésperas do encontro que será feito entre o presidente Jair Bolsonaro, Joe Biden e lideranças de mais 40 países, nos dias 22 e 23 de abril.

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“Celebrando a decisão do seu governo em fortalecer a agenda ambiental internacional e o Acordo de Paris, expressamos nossa intenção de implementar ações conjuntas, propondo a cooperação entre os Estados Unidos e os governos estaduais brasileiros, responsáveis pela maior parte da Floresta Amazônica, a mais extensa floresta tropical do mundo”, afirmam os governadores da chamada Coalizão Governadores Pelo Clima.

Até o momento em que a reportagem recebeu a carta, apenas quatro unidades da federação estavam de fora da iniciativa: Santa Catarina (Carlos Moisés - PSL), Rondônia (Coronel Marcos Rocha - PSL), Roraima (Antonio Denarium - sem partido) e Distrito Federal (Ibaneis Rocha - MDB).

Soldado brasileiro em meio a madeira extraída ilegalmente em Rondônia: governo americano intensifica pressão e exige resultados Foto: Brazilian Army/Reuters

No documento, que é assinado por nomes como João Doria (SP), Flávio Dino (MA), Ronaldo Caiado (GO), Wilson Lima (AM) e Mauro Mendes (MT), os governadores afirmam que os Estados brasileiros têm “enormes capacidades de contribuir com a captura de emissões globais”, reduzindo a pobreza, desenvolvendo novos arranjos econômicos e fortalecendo comunidades indígenas.

“Nossos Estados possuem fundos e mecanismos criados especialmente para responder à emergência climática, disponíveis para aplicação segura e transparente de recursos internacionais, garantindo resultados rápidos e verificáveis”, declaram os governadores.

Afirmam ainda que, “certos do alto nível de convergência de interesses e desejando tempos saudáveis para nossos povos, ficamos abertos para estabelecer um canal de interação com o seu governo para avançarmos em passos práticos”.

Na próxima quinta-feira, durante a cúpula do clima organizada pelos Estados Unidos, a Casa Branca espera que o Brasil apresente um compromisso político claro e pragmático com a preservação ambiental. Isso inclui um cronograma de redução gradual do desmatamento e uma meta mais ambiciosa do que a atual para redução de emissões de carbono. O evento será o mais importante teste das relações entre os dois países desde que teve início a presidência de Joe Biden, em janeiro.

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“A coalizão Governadores Pelo Clima, ampla e diversa, envolvendo progressistas, moderados e conservadores, de situação e de oposição, sinaliza o desejo do Brasil por união e construção colaborativa de soluções em defesa da humanidade e de todas as espécies de vida que estão ameaçadas pela degradação de ecossistemas”, declaram os chefes do Executivo estadual.

Leia a íntegra da carta

Brasil, abril de 2021

Caro presidente Joe Biden, Inicialmente, registramos nossos cumprimentos e felicitações pela vitória eleitoral, com o desejo de muito sucesso em sua gestão, ao lado da vice-presidente Kamala Harris. Os Governadores do Brasil abaixo subscritos, representantes de estados que compreendem 90% do território nacional, manifestam interesse no desenvolvimento de parcerias e de estratégias de financiamento, visando impulsionar o equilíbrio climático, a redução de desigualdades, a regeneração ambiental, o desenvolvimento de cadeias econômicas verdes e o estímulo à adoção de tecnologias para reduzir as emissões de atividades econômicas tradicionais nas Américas, além do esforço conjunto na construção de uma sociedade mais saudável e resiliente a pandemias.

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A coalizão Governadores Pelo Clima, ampla e diversa, envolvendo progressistas, moderados e conservadores, de situação e de oposição, sinaliza o desejo do Brasil por união e construção colaborativa de soluções em defesa da humanidade e de todas as espécies de vida que estão ameaçadas pela degradação de ecossistemas.

Conscientes da emergência climática global, os governos subnacionais brasileiros signatários estão cientes da sua responsabilidade com a redução dos gases de efeito estufa, a promoção de energias renováveis, o combate ao desmatamento, o cumprimento do Código Florestal para a conservação das florestas e da vegetação nativa, a melhoria da eficiência na agropecuária, a proteção e o bem-estar dos povos indígenas e demais comunidades tradicionais, e a busca de formas consorciadas de viabilizar massivos reflorestamentos, integrados aos sistemas sociobioprodutivos regionais.

Ao mesmo tempo, buscam-se soluções concretas para a superação da pobreza, ainda prevalente em nosso continente, em especial nas áreas de florestas. Estas são ações que, além da remoção de carbono, da proteção da biodiversidade e da redução da pobreza, podem evitar futuras pandemias.

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Visando avançar com visão sistêmica, a aliança Governadores Pelo Clima está estruturando políticas climáticas, sociais e econômicas interligadas como base do desenvolvimento sustentável, e vem construindo intercâmbios com Governadores dos Estados Unidos, lideranças da América Latina e governos da Europa e do Reino Unido, sede da COP26, onde desejamos apresentarnovações e parcerias de alto impacto, que considerem o protagonismo das agendas locais e suas singularidades, para alcançarmos o desenvolvimento sustentável da maneira mais ampla e com maior impacto positivo possível na vida das pessoas.

Celebrando a decisão do seu governo em fortalecer a agenda ambiental internacional e o Acordo de Paris, expressamos nossa intenção de implementar ações conjuntas, propondo a cooperação entre os Estados Unidos e os governos estaduais brasileiros, responsáveis pela maior parte da Floresta Amazônica, a mais extensa floresta tropical do mundo, e de outros biomas que, somados, abrigam a mais ampla biodiversidade já registrada e que são capazes de regular ciclos hídricos e de carbono em escala planetária. Por outro lado, historicamente, são as áreas que mais concentram a pobreza e falta de acesso às políticas públicas básicas em nosso país. Unir, portanto, uma agenda robusta de conservação ambiental, recuperação produtiva das áreas degradadas, proteção dos biomas em risco, com foco na redução das desigualdades sociais, é urgente para esse novo cenário.

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Para que a temperatura global não ultrapasse 1,5°C até o fim do século, a humanidade precisa reflorestar uma área do tamanho do território dos Estados Unidos. Nesse desafio, o Brasil pode ampliar o verde da Terra não apenas na Amazônia, mas também em biomas de grande capacidade de captura de carbono, inestimável biodiversidade e relevância socioeconômica, como Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Pampa e o Pantanal, que perdeu grandes áreas em incêndios em 2020. No entanto, fazer isso, ao mesmo tempo em que avançamos em uma nova economia, capaz de promover o bem estar efetivo das comunidades tradicionais, é o grande desafio para que a meta da redução das emissões não sobrecarregue ainda mais os países mais pobres.

Nossa parceria pode somar rapidamente capacidade técnica, grandes áreas regeneráveis de terra e governanças locais, com a imensa capacidade de investimentos da economia americana, conectando políticas públicas, conhecimentos científicos, instrumentos inovadores e iniciativas empresariais.

Nossos Estados possuem fundos e mecanismos criados especialmente para responder à emergência climática, disponíveis para aplicação segura e transparente de recursos internacionais, garantindo resultados rápidos e verificáveis.

Assim, é possível viabilizar ações descentralizadas, em múltiplos pontos do território brasileiro, possibilitando a proteção de biomas nativos, a restauração de áreas degradadas, a inclusão de comunidades locais com capacitaçãoplanejada e geração de muitos empregos, e a incorporação de empresas, em diversas cadeias econômicas de baixas emissões, integrando as economias do Brasil e dos EUA, nos eixos de bioenergia, agricultura de baixo carbono, energias renováveis e bioeconomia de floresta em pé e manejada, com uso de modernas tecnologias para agregação de valor aos produtos da floresta, promovendo práticas sustentáveis de comércio internacional.

Juntos, podemos constituir com agilidade a maior economia de descarbonização do planeta, criando referências para impulsionar a transição da economia mundial para um modelo carbono neutro, orientando uma retomada verde pós-pandemia. Os Estados brasileiros têm enormes capacidades de contribuir com a captura de emissões globais, aumentando a ambição da NDC nacional, reduzindo a pobreza, desenvolvendo novos arranjos econômicos e fortalecendo comunidades indígenas.

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Certos do alto nível de convergência de interesses e desejando tempos saudáveis para nossos povos, ficamos abertos para estabelecer um canal de interação com o seu governo para avançarmos em passos práticos.

A terrível pandemia atual, somada à urgência climática, exigem ações imediatas para evitar novas doenças em escala planetária, tendo como princípio a união de nações, conhecimentos, capacidades e, sobretudo, solidariedades e sonhos que nos elevem a um novo patamar de sabedoria coletiva. Unir esforços imediatamente para vacinação é a maior prioridade.

Acreditamos que é possível iniciar aqui um novo ciclo da sociedade, tornando o nosso continente mais justo, sustentável, inclusivo e próspero, para as atuais e futuras gerações. Há muito o que reparar, restaurar, curar e construir, e também há muito a inventar para a conquista de um futuro saudável e seguro.

Atenciosamente,

Paulo Câmara Governador do Estado de Pernambuco

Gladson Cameli Governador do Estado do Acre

Renan Filho Governador do Estado de Alagoas

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Waldez Góes Governador do Estado do Amapá

Wilson Lima Governador do Estado do Amazonas

Rui Costa Governador do Estado da Bahia

Camilo Santana Governador do Estado do Ceará

Renato Casagrande Governador do Estado do Espírito Santo

Ronaldo Caiado Governador do Estado de Goiás

Flávio Dino Governador do Estado do Maranhão

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Mauro Mendes Governador do Estado do Mato Grosso

Reinaldo Azambuja Governador do Estado do Mato Grosso do Sul

Romeu Zema Governador do Estado de Minas Gerais

Helder Barbalho Governador do Pará

Carlos Roberto Massa Júnior Governador do Estado do Paraná

João Azevêdo Governador do Estado da Paraíba

Wellington Dias Governador do Estado do Piauí

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Cláudio Castro Governador do Estado do Rio de Janeiro

Fátima Bezerra Governadora do Estado do Rio Grande do Norte

Eduardo Leite Governador do Estado do Rio Grande do Sul

Belivaldo Chagas Governador do Estado de Sergipe

João Doria Governador do Estado de São Paulo

Mauro Carlesse Governador do Estado de Tocantins

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