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Herdeiros do 'Clarín' não seriam filhos de desaparecidos políticos, dizem advogados

DNA de filhos adotivos da dona do diário não teria coincidido com os de mais de 50 famílias de desaparecidos entre 1975 e 1976

Por Marcia Carmo
Atualização:

BUENOS AIRES - Os herdeiros do grupo Clarín, Marcela e Felipe Noble Herrera, não são filhos de desaparecidos políticos na ditadura argentina (1976-1983), segundo anunciaram advogados da família que disseram ter recebido a notícia, na sexta feira, do Banco Nacional de Dados Genéticos (BNDG). O perfil genético de Marcela e de Felipe, filhos adotivos da empresária Ernestina Herrera de Noble, de 86 anos, não teria coincidido com os de mais de 50 famílias de desaparecidos entre 1975 e 1976, de acordo com o advogado Gabriel Cavallo. O grupo Clarín é o principal de mídia da Argentina. "A partir de agora, vamos desenhar uma estratégia para terminar com a perseguição (contra os dois jovens)", disse Cavallo. O jornal Clarín publicou em seu site que "era falsa" a acusação de que Marcela e Felipe poderiam ser filhos de desaparecidos naqueles anos de chumbo. 'Resultados não conclusivos' No entanto, num comunicado divulgado na madrugada deste sábado, a entidade de direitos humanos Avós da Praça de Maio afirmou que os exames não eram conclusivos e que os novas comparações deverão ser realizadas pelo BNDG. "Não existem resultados negativos. Temos que esperar novos exames. Estamos cautelosas e na expectativa para saber se Marcela e Felipe são ou não filhos de desaparecidos políticos", diz o texto, divulgado pela agência oficial de notícias Telam. Em sua manchete, na edição online, o Clarín sugeriu que o caso está encerrado. "Foram dez anos de perseguição política e judicial contra a família Noble Herrera que se intensificou, com inusitada dureza e ódio, nos últimos três anos", escreveu o jornal. Segundo histórico médico, Marcela teria nascido em março de 1976 e Felipe em abril do mesmo ano, o que levou os advogados da família a concluírem que o caso está encerrado. De acordo com o Clarín, a justiça entregou Marcela à diretora do Clarín no dia 14 de maio de 1976 e Felipe no dia sete de julho do mesmo ano. A emissora de televisão TN (Todo Noticias), do mesmo grupo, noticiou que "o caso acabou". Na mesma linha informaram os sites do jornal La Nación e o Infobae. Segundo resultado negativo Foi o segundo resultado negativo divulgado em uma semana. Na segunda-feira, o BNDG informou que os exames deram negativo na comparação com os dados genéticos de duas famílias que tinham entrado na justiça reclamando parentesco com Marcela e Felipe. As famílias Lanuscou Miranda e Gualdero-García argumentaram que eles poderiam ser filhos de seus parentes desaparecidos. "Eu sempre achei Marcela muito parecida com minha sobrinha. Mas me enganei", disse Daniel Lanuscou à rádio Diez, de Buenos Aires. O caso ganhou contornos políticos durante o governo do ex-presidente Carlos Menem (1989-1999), segundo afirmou o Clarín, e também durante a disputa pública entre o grupo Clarín e o governo do então presidente Nestor Kirchner (2003-2008), morto em outubro passado, e o atual governo de sua esposa, a presidente Cristina Kirchner. "Como pode existir qualidade institucional se não existe identidade? Estela, nenhum poder midiático, com perfil mafioso, vai deter esta luta. Se não encontrarmos justiça na Argentina vou acompanhá-las nos tribunais internacionais", disse a presidente num discurso, em 2010, ao lado da presidente da entidade Avós da Praça de Maio, Estela de Carlotto. Avós da Praça de Maio A entidade de direitos humanos localizou 103 filhos de desaparecidos políticos que cresceram com identidades diferentes, após terem sido roubados pelos militares, assim que nasceram. A entidade estima que 500 bebês, hoje com mais de trinta anos, foram roubados e entregues a outras famílias com outras identidades. Logo após o discurso da presidente, em 2010, Marcela e Felipe gravaram um depoimento para a televisão e assinaram páginas nos jornais dizendo que sentiam "pressões políticas" e "o uso político da história deles". Marcela e Felipe foram perseguidos por policiais para que entregassem, em suas casas, objetos pessoais como pentes e escovas de dentes para análises de DNA. Os exames também teriam dado negativo. Em junho, os dois se apresentaram para novo exame de sangue que foi comparado com todo o banco de dados genéticos, como pediam as Avós da Praça de Maio. "Não podemos ter certeza se são ou não filhos de desaparecidos políticos. Temos que aguardar os exames", disse Carlotto, após o resultado do exame de segunda-feira.

 

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