Ideólogo do Khmer é preso por crimes contra a humanidade

Chea, de 82 anos, é acusado de envolvimento nas atrocidades do grupo cambojano nos anos 70

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Por AP E NYT
Atualização:

Phnom Penh - O principal líder ainda vivo do Khmer Vermelho foi preso ontem no Camboja por crimes de guerra e contra a humanidade - três décadas após o regime deixar 1,7 milhão de mortos por fome, trabalho forçado e execução. Nuon Chea, de 82 anos, era o ideólogo do Khmer Vermelho e o número 2 de Pol Pot, o líder do grupo comunista, que morreu em 1998. Chea foi detido em sua casa em Pailin, no noroeste do Camboja, e levado de helicóptero para Phnom Penh, onde foi colocado sob custódia de um tribunal apoiado pela ONU. O tribunal investiga os abusos cometidos entre 1975 e 1979, período em que o Khmer Vermelho esteve no poder no Camboja. "Chegou a hora de Chea oferecer sua versão da história do Khmer Vermelho ao tribunal", disse Youk Chang, diretor do Centro de Documentação do Camboja, um grupo independente que investiga os crimes do Khmer Vermelho. "Tantas pessoas morreram. Há muitas valas comuns, prisões, documentos e fotos que podem mostrar o que ele fez naquela época", disse Chang. Nuon Chea é o segundo membro de alto escalão do Khmer Vermelho a ser detido. O primeiro, Kaing Guek Eav, mais conhecido como Duch, entregou-se em 1999. Duch, de 64 anos, dirigiu a prisão de Tuol Sleng (S-21), em Phnom Penh - onde pelo menos 14 mil pessoas morreram. Ele foi indiciado pelo tribunal em julho por crimes contra a humanidade. Promotores enviaram os nomes de três outros membros do grupo, não divulgados, para possível indiciamento. Duch, que se converteu ao cristianismo, admitiu participação nas atrocidades e, num depoimento em 1999, acusou Nuon Chea de ser o principal responsável pelos assassinatos. Durante parte do período do regime do Khmer, Chea teve "comando direto" sobre a S-21, onde muitos membros expurgados do grupo comunista foram detidos, torturados e executados, disse Duch a um investigador do governo. "Nuon Chea enviava os detidos para mim", acrescentou. Chea nega qualquer responsabilidade nas atrocidades cometidas pelo regime, mas diz que está pronto para enfrentar o tribunal. "Admito que houve erros. Mas eu tinha minha ideologia. Queria libertar meu país. Queria que as pessoas tivessem bem-estar", afirmou Chea à Associated Press em 2004. "Não usei a sabedoria para descobrir a verdade do que estava acontecendo, para verificar quem estava fazendo coisas erradas e quem estava fazendo coisas certas. Admito esse erro", disse ele numa entrevista. O chefe militar do Khmer Vermelho, Ta Mok, morreu em 2006, enquanto estava preso. Depois de ter sido derrubado do poder em 1979, o grupo continuou travando uma guerra de guerrilha, que só foi encerrada uma década atrás, com um acordo tácito para que vários de seus líderes vivessem em paz. Outros membros de alto escalão do Khmer - Ieng Sary, ex-chanceler, e Khieu Samphan, ex-chefe de Estado - ainda vivem livremente no Camboja, mas com a saúde abalada. Acredita-se que eles também estejam na lista que os promotores enviaram ao tribunal.

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