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Impasses ameaçam acordo nuclear entre Irã e potências

Europeus e americanos não descartam abandonar negociação caso Teerã não ceda; chanceler iraniano diz que descompasso entre potências atrapalha negociações

Por Jamil Chade e Lausanne
Atualização:
Mohamed Javad Zarif, chanceler iraniano, disse que a falta de coordenação entre as potências também prejudica negociações Foto: Brendan Smialowski/REUTERS

LAUSANNE - Ao mesmo tempo em que o governo americano admite nesta quarta-feira, 1, que pode abandonar as negociações nucleares com o Irã e adotar novas sanções contra o país xiita, a Alemanha alerta que o processo está à beira de um colapso e o que era um acordo praticamente fechado vive seu momento mais delicado em quase dois anos de negociações. Em resposta às ameaças, o Irã alertou que em caso de fracasso, a chance de novas negociações "pode jamais se repetir". 

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A troca de acusações e a pressão ocorre às vésperas de uma nova reunião na noite desta quarta na qual as potências internacionais do P5+1 - China, EUA, Rússia, Grã-Bretanha, França e Alemanha - esperam uma nova oferta iraniana. 

"Se sentirmos que não há progresso, estamos disposto a voltar para casa sem um acordo e deixar a mesa de negociação", declarou Josh Earnest, porta-voz da Casa Branca. "Se não houver acordo, o Irã pode ser alvo de novas sanções, mais severas e o presidente Barack Obama pode considerar novas opções", disse. "Até agora, não tivemos um empenho tangível." 

Na tarde desta quarta em Lausanne, as potências internacionais e Teerã não conseguiram fechar um acordo nuclear e o processo corre o risco de fracassar. Numa iniciativa para colocar pressão total sobre os iranianos, EUA, Alemanha e Françaalertaram que chegou a hora de Teerã ceder, às vésperas de mais uma noite sem dormir para negociadores e ministros. Para os iranianos, porém, não haverá um acordo enquanto não receberam garantias de que as sanções serão suspensas. 

Questionado se o processo poderia entrar em colapso, o Ministério das Relações Exteriores da Alemanha, confirmou. "Naturalmente". 

O prazo para um acordo venceu na terça-feira. No entanto, os negociadores optaram por prorrogar o processo, na esperança de chegar a um entendimento. Agora, porém, a delegação americana também alertou que está disposta a deixar a negociação se o Irã não mudar de posição. Washington insistiu que ainda não tem garantias da parte do Irã de que todos os caminhos para uma eventual bomba estejam fechados. "Apesar de haver uma prorrogação, não se trata de um processo sem fim", alertou a Casa Branca. 

Na madrugada de terça-feira, os ministros da Rússia, Irã e Grã-Bretanha haviam declarado que já existia um "acordo de princípio" sobre "todos os pontos". Mas faltaria traduzir isso a uma declaração final e estabelecer uma agenda para tratar dos assuntos ainda pendentes, até julho.

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Numa reviravolta que deixou até negociadores perplexos, porém, o debate do rascunho da declaração emperrou. "O trabalho está agora em resolver os detalhes e por isso está em uma fase difícil", justificou Mohamed Javad Zarif, chanceler iraniano. "Nossos amigos precisam decidir se querem negociar com o Irã com base no respeito ou se querem continuar com base na pressão", alertou. 

O entendimento, mesmo que parcial, tentaria dar uma resposta às pressões feitas por Israel, Arábia Saudita, por republicanos no Congresso americano ou por ultraconservadores no Irã. O acordo também seria visto como a inauguração concreta de uma nova relação de Teerã com a comunidade internacional. 

Zarif preferiu transferir a responsabilidade para a falta de coordenação entre as potências. Segundo ele, nem todas as potências estão neste momento com uma posição comum. "Temos de atender cada uma delas com suas preocupações legais e políticas", se queixou. 

Sanções. A questão das sanções é central para que uma declaração possa ser anunciada. O negociador chefe dos iranianos, Abas Araghchi, chegou a alertar durante o dia que não haveria sequer um acordo parcial se não fossem informados com detalhes sobre como poderiam ter benefícios econômicos. 

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Teerã, apoiado pelos russos, pede que as sanções aprovadas na ONU sejam imediatamente abolidas, o que abriria o acesso para o país aos bancos e crédito estrangeiros. Os embargos unilaterais de americanos e europeus poderiam ser suspensos em um segundo momento. Mas os americanos querem um fim gradual das sanções. 

Outro obstáculo é a proposta dos EUA de que uma nova rodada de sanções não tenha de passar pelo Conselho de Segurança da ONU para ser implementada caso o Irã não cumpra o acordo. O temor de Washington é de que, se esse fosse o caminho, o embargo poderia ser vetado por russos ou chineses. 

Prazos. Outro impasse é a duração do acordo e o que poderia ocorrer dentro do Irã em termos de pesquisa tecnológica. Teerã estaria disposto a reduzir de 20 mil para 6 mil o número de suas centrifugas usadas para o enriquecimento de urânio. Mas sob determinadas condições. 

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Pela proposta dos EUA, a ideia é de que o congelamento das atividades nucleares seja garantido por dez anos. A partir dai, Teerã poderia progressivamente voltar a manter algum tipo de programa de enriquecimento, numa graduação que levaria cinco anos. 

No centro do debate está o uso de centrífugas de uma nova geração, mais eficientes. O Irã insiste que quer recuperar seus direitos imediatamente dez anos depois. Mas as potências alertam que o uso dessa nova tecnologia teria de ser vetada também por mais cinco anos.

Urânio. Por fim, o destino do urânio enriquecido do Irã também é incerto. As potências querem que o material seja deslocado para instalações na Rússia, o que permitiria um monitoramento internacional. Mas os iranianos insistem em refutar esta recomendação. 

Sem um acordo nesse ponto, a opção foi a de adiar a decisão para junho. Há cinco anos, quando Brasil e Turquia negociaram um acordo com o Irã, a transferência do material já havia sido aceita por Teerã. Os iranianos, porém, estavam em outra fase do enriquecimento.

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