Intervenção pode gerar mais danos do que benefícios, diz Brasil na ONU

Para embaixadora, decisão da diplomacia brasileira não significa apoio ao governo líbio

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Por Gustavo Chacra e correspondente do Estado em Nova York
Atualização:

A representação brasileira nas Nações Unidas se absteve na votação que aprovou uma intervenção militar na guerra civil Líbia. Após a resolução passar na votação do Conselho de Segurança, a embaixadora brasileira Maria Luiza Viotti atribuiu a posição do país ao texto da resolução.

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"O problema está no texto da resolução. As medidas adotadas podem gerar mais danos do que benefícios. Mas não significa uma aceitação do comportamento do governo líbio". Além disso, segundo a representante brasileira junto à ONU, os movimentos no mundo árabe têm crescido internamente, e uma intervenção externa alteraria esta narrativa, tendo repercussões na Líbia e em outros países.A abstenção brasileira ocorre às vésperas da visita do presidente dos EUA, Barack Obama, ao Brasil, neste fim de semana. O governo brasileiro há anos tenta conseguir apoio para a inclusão do país entre os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU. Na votação de ontem, a posição da administração brasileira foi contrária aos interesses dos americanos.A votação dividiu o Conselho de Segurança. Nem mesmo os europeus estavam unidos. A Alemanha também optou pela abstenção. Além de alemães, brasileiros, russos e chineses, a Índia também não apoiou a nova resolução. Na votação anterior, em fevereiro, quando aprovaram que Kadafi seja julgado pelo Tribunal Penal Internacional, houve unanimidade.Na avaliação de alguns países, mesmo a zona de exclusão aérea não será suficiente. A embaixadora dos EUA junto à ONU, Susan Rice, disse antes da votação que talvez sejam necessárias medidas ainda mais restritivas para conter o regime líbio. Franceses e libaneses debatiam o estabelecimento de uma zona de exclusão terrestre.

 

Leia a íntegra da declaração da embaixadora

 

“Senhor Presidente,

O Brasil está profundamente preocupado com a deterioração da situação na Líbia. Apoiamos as fortes mensagens da Resolução 1970 (2011), adotada por consenso por este Conselho. O Governo do Brasil condenou publicamente o uso da violência pelas autoridades líbias contra manifestantes desarmados e exorta-as a respeitar e proteger a liberdade de expressão dos manifestantes e a procurar uma solução para a crise por meio de diálogo significativo.

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Nosso voto de hoje não deve de maneira alguma ser interpretado como endosso do comportamento das autoridades líbias ou como negligência para com a necessidade de proteger a população civil e respeitarem-se os seus direitos. O Brasil é solidário com todos os movimentos da região que expressam suas reivindicações legítimas por melhor governança, maior participação política, oportunidades econômicas e justiça social.

 

Condenamos o desrespeito das autoridades líbias para com suas obrigações à luz do direito humanitário internacional e dos direitos humanos. Levamos em conta também o chamado da Liga Árabe por medidas enérgicas que dêem fim à violência, por meio de uma zona de exclusão aérea. Somos sensíveis a esse chamado, entendemos e compartilhamos suas preocupações.

 

Do nosso ponto de vista, o texto da resolução em apreço contempla medidas que vão muito além desse chamado. Não estamos convencidos de que o uso da força como dispõe o parágrafo operativo 4 (OP4) da presente resolução levará à realização do nosso objetivo comum – o fim imediato da violência e a proteção de civis.

 

Estamos também preocupados com a possibilidade de que tais medidas tenham os efeitos involuntários de exacerbar tensões no terreno e de fazer mais mal do que bem aos próprios civis com cuja proteção estamos comprometidos.

 

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Muitos analistas ponderados notaram que importante aspecto dos movimentos populares no Norte da África e no Oriente Médio é a sua natureza espontânea e local. Estamos também preocupados com a possibilidade de que o emprego de força militar conforme determinado pelo OP 4 desta resolução hoje aprovada possa alterar tal narrativa de maneiras que poderão ter sérias repercussões para a situação na Líbia e além.

 

A proteção de civis, a garantia de uma solução duradoura e o atendimento das legítimas demandas do povo líbio exigem diplomacia e diálogo. Apoiamos os esforços em curso a esse respeito pelo Enviado Especial do Secretário-Geral e pela União Africana.

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Nós também saudamos a inclusão, na presente resolução, de parágrafos operativos que exigem um imediato cessar-fogo e o fim à violência e a todos os ataques a civis e que sublinham a necessidade de intensificarem-se esforços que levem às reformas políticas necessárias para uma solução pacífica e sustentável. Esperamos que tais esforços continuem e tenham sucesso.

Obrigada.”

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