Israel e a luta dos gays

Direitos dos homossexuais são usados para relações públicas

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Por É PROFESSORA DE HUMANIDADES NA FACULDADE DE STATEN ISLAND , DA UNIVERSIDADE DE NOVA YORK , SARAH , SCHULMAN , É PROFESSORA DE HUMANIDADES NA FACULDADE DE STATEN ISLAND , DA UNIVERSIDADE DE NOVA YORK , SARAH e SCHULMAN
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"Nos sonhos começam as responsabilidades", escreveu Yeats em 1914. Essas palavras têm tido eco nos movimentos dos gays, lésbicas, bissexuais e transexuais que vêm presenciando mudanças dramáticas no relacionamento com o poder. Depois de gerações marcadas pelos sacrifícios e pela organização, os gays em diversas regiões do mundo conseguiram proteção contra a discriminação e o reconhecimento de suas relações. Mas essas mudanças também deram origem a um fenômeno abominável: a cooptação de gays brancos por forças políticas contrárias à imigração e aos muçulmanos, na Europa Ocidental e em Israel.Na Holanda, alguns gays foram atraídos pelas mensagens de Geert Wilders, que herdou muitos seguidores depois do assassinato do líder gay na luta contra a imigração Pim Fortuyn. Na Noruega, Anders Behring Breivik, o extremista que massacrou 77 pessoas em julho, disse ter sido influenciado pelo escritor americano gay Bruce Bawer, um feroz crítico da imigração muçulmana. No ano passado, segundo o jornal The Guardian, a Liga Inglesa de Defesa, de conotação racista, contava com 115 membros gays nas suas fileiras. A Federação Alemã de Gays e Lésbicas divulgou declarações citando os imigrantes muçulmanos como inimigos dos gays.Essa descrição dos imigrantes - geralmente muçulmanos de origem africana ou turca, sul-asiáticos e árabes - como "fanáticos homofóbicos" ignora de maneira oportunista a existência dos gays muçulmanos e seus aliados dentro de suas comunidades. E também deixa invisível o papel dos cristãos fundamentalistas, da Igreja Católica Romana e dos judeus ortodoxos na perpetuação do medo, e mesmo do ódio, contra os gays. E esta mensagem negativa hoje se disseminou, a partir das suas raízes na xenofobia europeia, para se tornar um instrumento poderoso no conflito palestino-israelense.Em 2005, o governo israelense iniciou uma campanha, intitulada "Marca Israel", dirigida a homens entre 18 e 34 anos. A campanha tinha por objetivo mostrar Israel como um país "relevante e moderno". Posteriormente, o governo expandiu o projeto para abranger a comunidade gay.No ano passado, segundo o website de notícias Ynet, o Departamento de Turismo de Tel-Aviv iniciou uma campanha de US$ 90 milhões para rotular a cidade como "destino internacional de férias para gays".A promoção, que teve apoio do Ministério do Turismo, incluiu representações de jovens casais do mesmo sexo e o financiamento de filmes israelenses em festivais de cinema gay nos EUA.Essa mensagem está sendo articulada até nos altos escalões do governo. Em maio, o premiê Binyamin Netanyahu declarou que o Oriente Médio "era uma região onde gays são enforcados".Relações públicas. Para o crescente movimento global gay contra a ocupação israelense essa é uma estratégia deliberada de Israel para ocultar as contínuas violações dos direitos humanos dos palestinos por trás de uma imagem de modernidade expressa pela vida dos gays israelenses. Segundo Aeyal Gross, professor de Direito na Universidade de Tel-Aviv, "os direitos dos gays tornaram-se basicamente um instrumento de relações públicas", apesar de "políticos conservadores e religiosos serem ainda ferozmente homofóbicos".Tal estratégia não só procura manipular os ganhos obtidos a duras penas pela comunidade gay de Israel, mas também ignora a existência das organizações palestinas que batalham pelos direitos dos gays. A homossexualidade está legalizada desde os anos 50 na Cisjordânia, quando leis proibindo a sodomia, impostas sob influência colonial inglesa, foram abolidas do Código Penal jordaniano, adotado pelos palestinos. E ainda mais importante é o emergente movimento gay palestino, hoje com organizações de peso como Aswat e Al-Qaws. Esses grupos deixam claro que a opressão dos palestinos vai além do limite da sexualidade: como disse Haneen Maikay, diretor do grupo Al-Qaws, "quando você passa por um posto de fronteira não importa qual é a sexualidade do soldado".O que tornou os gays, lésbicas e transexuais e seus aliados tão suscetíveis às estratégias israelenses, e o seu corolário, a tendência entre alguns gays brancos de privilegiar sua identidade racial e religiosa, fenômeno que o teórico Jasbir K. Puar chama de "homonacionalismo" - o legado emocional da homofobia. Os direitos dos gays cada vez mais amplos levam algumas pessoas de boa vontade a achar erroneamente que o país está muito avançado pela maneira como reage à homossexualidade.Em Israel, os soldados gays e a relativa abertura de Tel-Aviv são indicadores incompletos de direitos humanos - como ocorre também nos EUA, onde a ampliação dos direitos gays em alguns Estados não serve de contrapeso às violações de direitos humanos cometidas.A conquista há tanto tempo buscada de alguns direitos para os gays não deve nos fazer esquecer as lutas contra o racismo na Europa e nos EUA, nem a perseverança dos palestinos na sua busca de uma terra que possam chamar de nação. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

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