Jornalistas, vítimas de um clima inédito nos EUA

Em uma semana de manifestações, mais de 140 profissionais da mídia foram fisicamente agredidos, a maioria por policiais e alguns por manifestantes

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Por Redação
Atualização:

WASHINGTON - Mais de 100 jornalistas foram alvos da polícia ou de manifestantes desde o início dos protestos nos Estados Unidos, como resultado de um clima de desconfiança na mídia incentivado pelo presidente Donald Trump, além de outros fatores menos perceptíveis.

Segundo o site Press Freedom Tracker, mais de 140 jornalistas foram fisicamente agredidos, em sua maioria pela polícia (118), mas também por manifestantes (25), em uma semana durante os protestos ocasionados pela morte de George Floyd. Isso é mais do que o total registrado nos últimos dois anos, de acordo com o mesmo banco de dados do site. 

Cerca foi levantada perto da Casa Branca para evitar aproximação de manifestantes Foto: Olivier DOULIERY / AFP

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Ao menos 33 jornalistas foram presos, como Gustavo Martínez Contreras, repórter do jornal local de Nova Jersey, o The Asbury Park Press, e Bridget Bennett, uma fotógrafa independente da AFP situada em Las Vegas, que foi liberada, mas terá que comparecer ao tribunal no final de julho. 

Balas de borracha, gás lacrimogêneo, cassetetes e escudos foram usados "para atacar (membros da) imprensa como nunca antes na história deste país", denunciaram 28 associações profissionais em uma carta aberta à polícia. 

Em várias cidades ou Estados, os legisladores locais se posicionaram contra esses abusos. 

Para muitos, esses ataques frequentes são o resultado de um clima alimentado pelo presidente americano, que diariamente acusa a imprensa, na melhor das hipóteses, de mentir e, na pior das hipóteses, de manipular as informações para prejudicá-lo. 

"Quando o líder do mundo livre não respeita a imprensa, por que devemos esperar que as pessoas o façam?", Perguntou Tom Jones, do Poynter Media Observatory. 

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Esses ataques fazem parte de uma tendência crescente de desconfiança em relação à mídia, mais visível nas últimas duas décadas nos Estados Unidos, embora também em outros países. "Durante anos", afirma Jones, "alertamos que as palavras de Trump iam além da retórica e resultariam em violência". 

Na prática

Os espancamentos de vários jornalistas australianos por policiais na segunda-feira 1.º durante o esvaziamento da Casa Branca antes da saída de Donald Trump representaram um claro exemplo do que está acontecendo, ressaltaram vários analistas. "É o que esperaríamos ver na Praça Tahrir (Egito), Praça Maidan (Ucrânia) ou no Teerã, mas não em Washington", escreveu no Twitter Suzanne Nossel, diretora da associação PEN America.

"Felizmente não fomos feridos, mas psicologicamente não é fácil", disse Dan Lampariello, repórter da WBFF-TV, uma emissora local da Fox, que foi perseguida duas vezes por manifestantes no sábado à noite em Baltimore. O jornalista voltou ao campo, mas acompanhado por um especialista em segurança e ficou longe da manifestação. 

Manifestantes pedem justiça em protesto perto da Casa Branca Foto: AFP

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Por mais de uma década, os canais de notícias cobrem ao vivo os principais eventos e são onipresentes no campo trabalho. A imagem reina. A presença de uma câmera pode provocar reações, às vezes agressivas, algo mais difícilde acontecer quando se trata de jornalistas que atuam na rádio ou da mídia escrita. 

A isso soma-se a democratização do smartphone e os avanços tecnológicos que simplificam as transmissões de vídeo. "Todo mundo filma tudo", diz Patricia Gallagher Newberry, presidente da Sociedade de Jornalistas Profissionais (SPJ). 

"Torna-se difícil discernir" um manifestante ou espectador que captura suas próprias imagens de "um jornalista que captura imagens porque esse trata-se do seu trabalho". Em muitos casos, os jornalistas presos se identificaram verbalmente como tal. 

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No entanto, "às vezes a polícia não escuta, não se importa ou nem acredita no jornalista, porque qualquer pessoa com uma câmera pode dizer 'eu sou da imprensa' para se aproveitar da situação", analisa Patricia Newberry, que também leciona em uma universidade. / AFP

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