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Judeus religiosos buscam influenciar Exército

Relatos de atrocidades evidenciam disputa acirrada entre liberais seculares e ortodoxos

Por Ethan Bronner
Atualização:

Relatos de soldados israelenses que dizem ter testemunhado abusos cometidos contra civis durante os combates em Gaza puseram em evidência o debate em Israel a respeito das regras da guerra. Expuseram também a disputa entre liberais seculares e nacionalistas religiosos pelo controle do Exército e da sociedade. Vários dos relatos - divulgados por um instituto secular de inclinação à esquerda que deu origem aos kibutzim - mostram uma impaciência crescente em relação aos soldados religiosos, retratando-os como guerreiros santos autoproclamados. Um soldado, identificado pelo pseudônimo de Ram, é citado dizendo que em Gaza, "o rabinato trouxe muitos panfletos e artigos e a mensagem contida neste material era bastante clara: Somos o povo judeu, viemos a esta terra por um milagre, Deus nos trouxe de volta a este território e, agora, precisamos combater para expulsar os não judeus que estão interferindo na nossa conquista desta terra santa. O sentido geral com que muitos soldados encararam essa operação foi o de uma guerra religiosa". Durante as primeiras quatro décadas de existência de Israel, o Exército, como muitas das instituições do país, era dominado por membros dos kibutzim que enxergavam a si mesmos como seculares, ocidentalizados e cultos. Nas últimas duas décadas, os nacionalistas religiosos, muitos deles vindos dos assentamentos na Cisjordânia, assumiram postos cada vez mais altos no Exército. Em muitos casos, nacionalistas religiosos foram promovidos a posições de comando precisamente por meio do tipo de curso universitário pré-militar administrado por movimentos religiosos, em vez do secular - como era feito tradicionalmente. Isso significa que a concorrência entre os dois movimentos se acirrou e o conteúdo dos cursos tornou-se ideológico e carreirista. "O corpo de oficiais da Brigada do Golan, uma unidade de elite, apresenta agora forte presença de formandos religiosos direitistas provenientes das academias preparatórias", destacou Moshe Halbertal, professor de filosofia judaica e coautor do código de ética militar, que se descreve como religioso, mas politicamente liberal. Aqueles que se opõem à direita religiosa demonstraram especial preocupação com a influência exercida pelo principal rabino do Exército, o general de brigada Avichai Rontzki, colono da Cisjordânia extremamente ativo durante a guerra. Ele transformou uma citação hebraica clássica num slogan durante a guerra: "Aquele que é piedoso com os cruéis será, afinal, cruel com os piedosos." Um panfleto distribuído na época entre os soldados continha uma determinação do rabino condenando a demonstração de misericórdia diante do inimigo, provocando controvérsia. O Ministério da Defesa o repreendeu. Após a retirada de colonos e soldados israelenses de Gaza, em 2005, foi pedida a desativação de certos programas religiosos do Exército porque alguns soldados que participavam da operação afirmaram que não mais obedeceriam a ordens futuras para desmantelar assentamentos. Halbertal diz que o debate envolve três tópicos : a santidade da terra contra o valor da vida; a relação entre messianismo e sionismo; e o papel dos não judeus num Estado judaico soberano. A esquerda acusa a direita de converter o território de Israel num fetiche em vez de permitir que a vida tenha precedência, diz ele. A esquerda religiosa também rejeita a natureza messiânica do discurso sionista e argumenta que a tradição judaica valoriza toda a vida, sem dar preferência à vida dos judeus.

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