Juiz que prendeu Menem é suspeito de enriquecimento ilícito

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Por Agencia Estado
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Um provérbio espanhol foi muito repetido nos últimos dias pelos assessores do ex-presidente Carlos Menem: "Cria cuervos y te comerán los ojos" (crie corvos e eles comerão teus olhos). A referência ibérica foi ocasionada pela detenção de Menem por ordem do juiz Jorge Urso, ele próprio um antigo apadrinhado político do ex-presidente. Os menemistas, para os quais a lealdade é um valor inquestionável, estão furiosos com Urso, a quem acusam de ter subitamente tirado a poeira do processo das armas para ver-se livre de uma acusação de enriquecimento ilícito. É que o juiz, segundo investigações da revista "Veintitrés", teria uma vida um pouco abastada demais para seu cargo e salário. Poucos dias depois, convocava Menem para prestar depoimento. Na Justiça argentina são comuns os fortes vínculos com a política partidária. Urso começou sua carreira sob a proteção de Miguel Angel Toma, que foi secretário de Segurança de Menem e passou a ter ativa participação no Partido Justicialista (mais conhecido como "Peronista"). Em 1993, foi designado juiz federal pelo Senado, com coincidente avassaladora maioria peronista. Em meados dos anos 90, o então ex-ministro da Economia Domingo Cavallo acusou diversos juízes, entre eles Urso, de serem os juízes "do guardanapo", uma hipotética lista que o ministro do Interior, Carlos Corach, teria feito durante um almoço em um guardanapo, indicando quais juízes federais obedeciam cegamente às negociatas do governo Menem. Antes disso, Urso havia dado provas da lealdade a Menem: investigara e arquivara um grave escândalo de corrupção envolvendo a diretora da Previdência, Matilde Menéndez. Além disso, também havia arquivado uma denúncia de Cavallo sobre o empresário Alfredo Yabrán, considerado o líder das máfias no país e extremamente vinculado a Menem. Urso também absolveu a cunhada e ex-secretária de Menem, Amira Yoma, do "Narcogate", o maior escândalo de tráfico de drogas da história argentina. De olhos azuis, sempre em impecáveis ternos com gravatas combinando, Urso é conhecido como um homem obsessivo, que gosta de montar a cavalo, motocicletas e revólveres. Com a mesma obsessão com que pratica seu hobby hípico, Urso preparou sua desvinculação do menemismo, que naufragava, para aparecer como o primeiro juiz na história da Argentina que coloca um presidente na prisão. Outra figura de protagonismo no caso das armas também tem vínculos chamativos: o promotor Carlos Stornelli, filho de um oficial do exército que foi interventor da Rádio Belgrano durante a última ditadura militar (1976-83). Além disso, nos anos 80, seu pai manteve constantes contatos com militares golpistas, os carapintadas, liderados pelos coronéis Aldo Rico e Mohammed Ali Seineldín. Além dos vínculos com a linha-dura do exército através de seu pai, sua própria esposa, Claudia Reston, é parente de um ex-ministro do Interior da ditadura. Há menos de uma semana, durante as cerimônias do dia do Exército, Stornelli foi visto abraçando altos oficiais aposentados, acusados de terem cometido crimes contra a humanidade.

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