Juíza indicada por Obama enfrenta ceticismo republicano no Congresso

Hispânica de origem humilde, Sonia Sotomayor promete imparcialidade em suas decisões na Suprema Corte

PUBLICIDADE

Por Patrícia Campos Mello
Atualização:

Sonia Sotomayor, a primeira hispânica indicada para ser juíza da Suprema Corte dos EUA, afirmou ontem que será "fiel à lei" caso seja confirmada no cargo. Sonia tentou tranquilizar os senadores republicanos no primeiro dia de sua audiência de confirmação no Senado. Os republicanos temem que ela deixe de lado a imparcialidade e a atribuição de interpretar a lei ao pé da letra - eles acham que ela será influenciada em suas decisões pelo fato de ser hispânica e mulher. "Neste último mês, muitos senadores me perguntaram sobre minha filosofia jurídica - é simples, fidelidade à lei; a tarefa de um juiz não é fazer leis, é aplicar a lei", disse Sonia no depoimento aos senadores. No sistema judiciário americano, as decisões dos juízes são extremamente importantes porque estabelecem precedentes e afetam a regência de casos no futuro. Republicanos têm uma visão conservadora e esperam que os juízes não estabeleçam grandes mudanças nas leis. E eles temem que Sonia sim leve em consideração, em suas sentenças, a condição social das pessoas envolvidas e sua própria origem hispânica e humilde. O presidente dos EUA, Barack Obama, ao escolher Sonia, disse esperar "empatia" nas decisões, e queria "alguém que entenda a justiça não apenas como uma teoria legal abstrata ou uma nota de rodapé em um livro de casos; alguém que enxergue a maneira como as leis afetam a realidade diária das pessoas". Republicanos ontem deram uma amostra do tipo de ataques que reservam a Sonia nos próximos dias - as audiências de confirmação devem se estender até sexta-feira. Em pronunciamentos, senadores republicanos questionaram a imparcialidade da indicada. Duas declarações de Sonia foram mencionadas. Em uma palestra de 2002, Sonia disse: "Eu espero que uma mulher latina sábia, com a riqueza de suas experiências, chegue a conclusões melhores do que um homem que não teve essa vida." Em outro evento, Sonia afirmou que "no tribunal de apelos é onde a política é feita". "Eu não vou votar, e espero que nenhum senador vote, em alguém que não será imparcial na aplicação da justiça", disse o senador republicano Jeff Sessions. "Chame do que quiser - empatia, preconceito ou simpatia -, não importa, essa não é a lei." Outro republicano, Lindsey Graham, disparou: "O comentário sobre a latina sábia - se eu tivesse dito qualquer coisa remotamente parecida com isso, minha carreira teria acabado. Ser latina acrescenta à Corte, mas não a torna melhor do que ninguém." Outro alvo de ataques será a decisão de Sonia no caso Ricci vs. De Stefano, em que 17 bombeiros brancos processaram a cidade de New Haven depois de o município ter anulado um concurso público porque nenhum bombeiro negro tinha conseguido se classificar. Sonia deu ganho de causa à cidade, dizendo que não houve discriminação contra os brancos. A Suprema Corte reverteu a decisão no mês passado. Já os democratas retrataram Sonia como experiente, ponderada e destacaram seus 17 anos como juíza. Também elogiaram muito a história de vida da juíza. Filha de porto-riquenhos, Sonia cresceu em um conjunto habitacional para pobres, no Bronx, foi diagnosticada com diabetes aos 8 anos e perdeu o pai aos 9. Sua mãe lutou para que Sonia e o irmão fizessem faculdade. Sonia tentou tranquilizar os republicanos, assumindo o compromisso de manter "a interpretação da Constituição" e "aplicar a lei de acordo com os fatos". Mas ela deixou claro que segue a linha desejada pelo presidente Obama, de empatia. "Nos meus 17 anos como juíza, testemunhei as consequências de minhas decisões", ela disse. "Minha experiência pessoal e profissional me ajudam a ouvir e entender, com as leis sempre comandando o veredicto de cada caso." Apesar das críticas, os republicanos não têm a ilusão de que vão bloquear a indicação. Os democratas têm os 60 votos (58, mais dois independentes) necessários para evitar a obstrução dos republicanos. QUESTÕES POLÊMICAS Visão latina - Posição favorável a ações afirmativas é alvo de críticas; em decisão polêmica, votou pelo cancelamento de um exame de promoção no Corpo de Bombeiros de New Haven, pois nenhum negro se havia classificado. Declaração de que ?latina sábia? tomaria decisões melhores que homem branco provocou controvérsia Aborto - Sua posição liberal indica que é pró-aborto, mas seu voto pode ser uma surpresa, pois nos 18 anos como juíza federal nunca julgou o mérito da questão. Em 2002 respaldou decisão do governo Bush de não financiar programas de planejamento familiar que incluíssem a opção do aborto Criminalidade - Ex-promotora, Sonia adota posições conservadoras quanto à lei criminal e é favorável à pena de morte. Decisões anteriores indicam que será favorável à condenação severa de jovens criminosos, questão a ser levada ao Supremo em breve Financiamento eleitoral - Tramita no Supremo processo sobre limites ao financiamento de empresas para campanhas políticas; em 1996, Sonia defendeu regulamentação para enfraquecer lobby político de grupos com mais dinheiro

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.