Kirchnerista vê ameaça de retrocesso na América Latina se perder eleição

BUENOS AIRES - O candidato governista à presidência da Argentina, Daniel Scioli, ampliou à América Latina o retrocesso que ele prevê para o país caso perca o segundo turno, dia 22, para o conservador Mauricio Macri. Classificada como “tática do medo” pela oposição, a estratégia é apontar a crise institucional argentina de 2001 como resultado da última grande união para derrotar o peronismo, representado por Scioli.

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Por Rodrigo Cavalheiro
Atualização:

“Só uma vitória nossa pode consolidar a integração latino-americana”, disse Scioli ao Estado na noite de sábado, no intervalo de uma das partidas de futsal em que costuma jogar alguns minutos no time Villa La Ñata, que disputa a primeira divisão argentina.

Favorito segundo as pesquisas, Daniel Scioli vota em Tigre Foto: AP Photo/Jorge Saenz

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Questionado sobre o que mudaria na geopolítica regional em caso de uma vitória de Macri, o governista foi mais objetivo que de costume. “Nos últimos anos, houve um fortalecimento na região do espírito de integração, com eixo central no mercado interno e na distribuição de renda”, disse. “Macri só propõe mudança sem dizer o que mudará.”

A agressividade de um candidato que apresenta como credencial a moderação está relacionada ao resultado do primeiro turno. Scioli, que esperava chegar a 40% e abrir 10 pontos para dispensar um segundo turno, obteve 36,8% dos votos. Macri atingiu 34,3%. Um reflexo do desempenho ruim foi a surpreendente derrota na Província de Buenos Aires, onde estão 37% dos eleitores do país. 

O chefe de gabinete de Cristina, Aníbal Fernández, perdeu para a candidata de Macri, Maria Eugenia Vidal. Fernández tem alta rejeição entre o eleitor antikirchnerista, em razão de acusações não comprovadas de ligação com o narcotráfico. O sistema eleitoral argentino induz o voto vinculado, o que tirou eleitores de Scioli na área mais povoada. “Aníbal era uma pedra no sapato. Esperamos que muitos dos que não votaram em Scioli por rejeição a Aníbal voltem, por não suportar Macri”, disse um dos coordenadores da campanha sciolista.

Tática. A expressiva votação da direita, sinal da adesão de indecisos e de eleitores que não participaram da primária de agosto, surpreendeu o próprio Macri. “Sei que eu não era a primeira opção de muitos”, disse. 

A campanha de Macri reforça o viés antikirchnerista e de mudança, em lugar de detalhar propostas. Uma exceção é a economia, onde Macri foi claro em anunciar o fim do controle cambial que vigora desde 2011. A restrição está relacionada ao baixo nível de reservas em dólar (US$ 26,9 bilhões), ligado por sua vez à dificuldade do país em obter créditos e investimentos externos. “Não nos faltarão reservas porque já conversei com China e Brasil”, afirmou Scioli. O candidato diz ter feito um acordo com a presidente Dilma Rousseff para contar com US$ 8 bilhões das reservas brasileiras.

Questionado sobre a alta na bolsa argentina após seu mau resultado, o governista afirmou que os mercados “são especulativos. “O que vejo na população é uma preocupação em não voltar ao passado, que fez estragos na economia real. O peronismo perdeu duas eleições nos últimos 30 anos. Uma levou à hiperinflação e outra à crise institucional de 2001”, disse.

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Após o desempenho que o deixou mais próximo da Casa Rosada, Macri tirou alguns dias de folga. Seu silêncio contribuiu para manter a divisão kirchnerista na mídia local. Ontem, Macri escreveu em sua conta no Facebook que “o governo aplica agora uma tática obscura de levar pesadelos e medo à população, com o único objetivo de assustá-los sobre a possibilidade de mudar.”

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