MADRI - O governo da Espanha enviou nesta terça-feira, 18, tropas para conter a entrada de imigrantes no enclave de Ceuta, no norte da África, pelo segundo dia seguido. Alguns saltaram as cercas de proteção. Outros, tentaram chegar a nado. A onda migratória começou na segunda-feira, depois que Marrocos relaxou os controles de fronteira, após uma crise diplomática com o governo espanhol.
As cenas dos últimos dois dias foram dramáticas. Soldados atônitos tentavam separaradultos e menores e carregavam crianças nos braços, enquanto funcionários da Cruz Vermelha ajudavam os que saíam do mar congelados e exaustos. Um socorrista espanhol resgatou um bebê que estava a ponto de se afogar. Uma mulher inconsciente deitada na areia foi carregada para fora da praia em uma maca.
O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, viajou a Ceuta, depois de prometer "restaurar a ordem" no local, onde chegaram cerca de 8 mil migrantes desde segunda-feira.
Elevando o tom contra um parceiro-chave no controle do fluxo migratório, Madri convocou a embaixadora marroquina na Espanha para expressar seu descontentamento e sua rejeição à entrada em massa de migrantes marroquinos em Ceuta. Em resposta, o Marrocos chamou sua embaixadora na Espanha, Karima Benyaich, que retornará ao seu país, afirmou a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores.
Ao mesmo tempo, Sánchez chegou a Ceuta para, segundo ele, mostrar a determinação do seu Executivo em restaurar a ordem na cidade e nas fronteiras o mais rapidamente possível, afirmou antes, em um anúncio na TV.
Controladas pela Espanha durante séculos e reivindicadas por Rabat, Ceuta e Melilla constituem as únicas fronteiras terrestres entre a União Europeia e a África. “Esta chegada repentina de migrantes irregulares é uma crise séria para a Espanha e também para a Europa”, alertou o líder espanhol.
Desde segunda-feira, cerca de 4 mil migrantes já foram devolvidos ao Marrocos, de acordo com o Ministério do Interior espanhol.Em Ceuta, o fluxo de migrantes continuou, embora a um ritmo mais lento na tarde desta terça-feira, com grupos de migrantes nadando do lado marroquino, apesar do destacamento da polícia espanhola e do Exército na área.
Dezenas de viaturas militares percorreram a areia da praia de Tarajal, em Ceuta, onde centenas de migrantes se reuniram durante a tarde. Os policiais mal os deixaram sentar na areia, antes de conduzi-los até a cerca que separa os dois territórios e expulsá-los por alguns portões.
Alguns imploraram para ficar. “Por favor, não temos nada, somos estudantes, queremos uma vida nova”, disse um deles.
Durante o dia, as forças espanholas dispararam gás lacrimogêneo para dissuadir as pessoas de atravessar, enquanto a polícia marroquina interceptou alguns grupos que tentavam cruzar a cerca de metal da fronteira e bloquearam a passagem de migrantes para o interior.
Pedro Sánchez garantiu que "quem entrar irregularmente" será devolvido, segundo os acordos "assinados há anos com o Marrocos". A delegação do governo na cidade informou que uma pessoa se afogou enquanto tentava chegar ao enclave pelo mar.
Crise diplomática
Esta crise surge para a Espanha em um momento de tensões diplomáticas bilaterais com Marrocos, um aliado fundamental contra a imigração irregular.
Rabat se irritou depois que o governo espanhol decidiu, em abril, acolher o líder do movimento de independência do Saara Ocidental, Frente Polisário, Brahim Ghali, para receber tratamento contra a covid-19 em um hospital.
É uma questão "humanitária", insistiu González Laya nesta terça-feira, sem conseguir acalmar o país vizinho, que há décadas está em conflito com a Frente Polisário por esta ex-colônia espanhola que Marrocos considera parte de seu território.
“Marrocos é um país aliado, amigo da Espanha e assim deve continuar a ser” mas “esta cooperação deve sempre, sempre, basear-se no respeito às fronteiras mútuas”, afirmou Pedro Sánchez.
Bruxelas mostrou sua solidariedade com a Espanha e apelou a Rabat, por meio da comissária europeia para Assuntos Internos, Ylva Johansson, para impedir a saída de migrantes do seu território. Em Rabat, as mais altas autoridades ficaram em silêncio./AFP