
01 de março de 2019 | 06h47
BUENOS AIRES - Um tribunal argentino declarou inocente nesta quinta-feira, 28, o ex-presidente Carlos Menem da acusação de encobrir os autores do atentado contra o centro judaico Amia em 1994, ação pela qual condenou seu ex-chefe de inteligência e um ex-juiz, entre outros ex-funcionários e cúmplices.
Os juízes emitiram sentenças de seis anos de prisão para o ex-magistrado responsável pelo caso, Juan Galeano, e de quatro anos para o ex-chefe de inteligência do governo de Menem, Hugo Anzorreguy, por desviarem a investigação sobre o ataque, que deixou 85 mortos e 300 feridos.
"Sinto tranquilidade. Queríamos a verdade e que pagassem pelo que fizeram. Deve-se seguir investigando", disse, ao sair da corte, Jorge Burstein, de uma organização de parentes das vítimas.
A Argentina acusou ex-governantes iranianos pela bomba na Associação Mutual Israelita (Amia), mas nunca conseguiu levá-los a julgamento. Além disso, suspeita-se que tiveram uma poderosa conexão local, a qual ainda não foi identificada.
O encobrimento consistiu em pagar ao suposto vendedor da caminhonete-bomba, Carlos Telleldín, cerca de US$ 400 mil para que acusasse um grupo de policiais, e em ordenar a liberdade dos primeiros acusados.
A chamada "pista spiria" apontava a princípio para a família Kanoore, amiga dos Menem, ambos descendentes de sírios, e à família Haddad, de origem libanesa, que comprava no mercado explosivos do tipo amonal, como o utilizado para detonar a Amia.
"Está aliviado. Nunca houve uma ordem de Menem para interromper a investigação", disse, ao final do julgamento, o advogado do ex-presidente, Omar Daer.
O maior atentado da história da Argentina continua impune. O Irã sempre rejeitou que seus ex-governantes, entre eles o ex-presidente Ali Rafsanjani, fossem interrogados. Dois ex-policiais foram sentenciados a 3 anos de prisão e dois ex-procuradores, a 2 anos, enquanto Telleldín deverá cumprir 3 anos e 6 meses preso. Sua mulher, Ana Boragni, foi condenada a 2 anos.
Junto com Menem, presidente argentino entre 1989 e 1999, foram absolvidos o ex-líder da associação judaica Rubén Beraja, um advogado e dois ex-membros dos serviços de segurança.
Organizações de parentes das vítimas foram demandantes e condenaram o acobertamento, em um enfrentamento com autoridades da organização. Adriana Reisfeld, presidente da Memória Ativa, havia dito que eram aguardadas condenações para os 13 acusados. Sua irmã, Noemi, morreu no ataque, aos 36 anos.
A promotoria havia pedido quatro anos de prisão para Menem, hoje senador de 88 anos, que tem direito ao foro privilegiado. O ex-presidente tinha declarado que contava com informação secreta que não podia revelar. "Tratam-se de razões de Estado que podem afetar o governo atual, os interesses da nação e a convivência pacífica com outras nações", disse seu advogado em 2016.
Não foi o primeiro processo contra o ex-presidente. Em 2013, Menem foi condenado a sete anos e meio de prisão por contrabando de armas à Croácia e ao Equador, embora depois a Justiça o tenha absolvido por "se exceder nos prazos razoáveis" para provar o delito. Em 2015, foi sentenciado a quatro anos e meio de prisão por pagamento de "extras" (sem declarar) a altos funcionários.
Em sua defesa, o ex-juiz Galeano afirmou que "a investigação da Amia foi vítima da miséria interna dos serviços de inteligência e segurança". Em 2004, após quase uma década na prisão, os policiais acusados falsamente e Telleldín foram absolvidos por um tribunal que anulou a causa que Galeano julgava em razão de irregularidades.
Outra ação por acobertamento foi aberta em 2017 contra a ex-presidente Cristina Kirchner por impulsionar no Congresso um acordo com o Irã para julgar os iranianos em um país neutro. O acordo nunca se cumpriu. / AFP
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