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'Meu objetivo era a universidade', diz afegã de 25 anos fotografada fazendo prova com filho no colo

Professor tirou foto de Jahantab Ahmadi, de 25 anos, sentada no chão e com o bebê nas mãos enquanto respondia perguntas em teste de admissão de universidade na região central do país; imagem viralizou na internet e desencadeou onda de solidariedade

Atualização:

CABUL - Sentada no chão com seu bebê no colo, Jahantab Ahmadi faz uma prova rodeada de estudantes sentados em suas cadeiras. A impressionante foto causou grande comoção no Afeganistão, onde muitas mulheres são analfabetas.

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O contraste é evidente entre o desconforto da jovem mãe, concentrada sob o véu azul, com um lápis na mão, e o restante dos candidatos, instalados em suas cadeiras perfeitamente alinhadas durante os testes de admissão da Universidade particular de Nasir Khusraw, no centro do país.

"Não quero que me privem dos meus estudos", disse Jahantab Ahmadi, de 25 anos, com seu terceiro filho nos braços.

Sentada no chão e com o bebê no colo, Jahantab Ahmadi faz prova para admissão em universidade afegã Foto: AFP PHOTO / Yahya Erfan / Yahya Erfan

Ela vem de um pequeno vilarejo da província de Daikundi, na qual o trigo, o milho e as batatas garantem uma baixa renda, e quer "trabalhar fora de casa". "Eu quero ser médica para servir as mulheres da minha comunidade ou da minha sociedade", diz Jahantab.

Para poder participar do exame, em meados de março, ela teve que caminhar duas horas pelas montanhas. Depois, utilizou o transporte público para enfrentar nove horas em entradas esburacadas até chegar na capital provincial, Nili. 

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No começo da prova, que foi realizada ao ar livre, se sentou em uma das cadeiras como os outros candidatos. Mas sua filha Khizran, de apenas um mês, estava com dor de ouvido e não parava de chorar.

Para acalmar a criança e não atrapalhar os concorrentes, Jahantab conta que se sentou no chão atrás de outro candidato. "Tinha que me concentrar no bebê e fazer a prova."

Jahantab se mudou com a família para a capital Cabul depois de sua foto ter comovido o país Foto: AFP PHOTO / WAKIL KOHSAR

Um professor da universidade imortalizou o momento. A foto se espalhou rapidamente nas redes sociais do país sem que ela soubesse. "Meu amigos no povoado me disseram: 'tiraram uma foto sua'. Eu respondi: 'como não percebi que estavam me fotografando?' E eles disseram: 'você estava concentrada em sua prova'", relembra Jahantab com timidez.

"Objetivo da minha vida"

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As redes sociais se interessaram pela história. A Associação da Juventude Afegã lançou uma campanha na internet para ajudar a financiar os estudos de Jahantab e arrecadou US$ 14 mil, uma fortuna em um país onde 39% da população vive na pobreza.

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"É uma verdadeira campeã mundial. Mostrou que uma mulher hazara pode fazer o que for preciso em qualquer condição ou circunstância", escreveu um homem no Facebook se referindo à etnia de Jahantab, que é considerada a mais liberal entre as quatro principais do Afeganistão.

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Outro internauta disse esperar que "esta jovem tão dedicada alcance seus objetivos". 

Jahantab Ahmadi também impressionou Zahra Yagana, defensora dos direitos das mulheres que entrou em contato com ela e a convenceu a ir para Cabul estudar.

A jovem afegã está morando com o marido, Musa Mohammadi (E) e os outros filhos na casa de uma ativista que defende direitos das mulheres Foto: AFP PHOTO / WAKIL KOHSAR

Agora, Zahra está ajudando Jahantab a se matricular em uma universidade particular da capital afegã e abriga a jovem mãe com seu marido e os filhos do casal. 

"Se ela tivessse que estudar em Daikundi, seria muito difícil", diz a ativista. "(Lá), o nível de educação é baixo. Na há moradia universitária e teria que viver pagando aluguel", diz Zahra.

"Procuraremos um alojamento (em Cabul). Muitos amigos aqui prometeram ajuda. Encontraremos também um trabalho para o marido dela e arrecadaremos fundos para que seus filhos possam estudar", disse a ativista.

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É a solução ideal para Jahantab Ahmadi, cujo "objetivo na vida era ser aceita na universidade", diz.

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"Mas por causa da nossa pobreza, fiquei sem estudar durante três ou quatro anos", lamenta a jovem, que terminou o ensino médio depois de se casar aos 18 anos.

O Afeganistão tem uma das taxas de alfabetização mais baixas do mundo: cerca de 36% da população, segundo dados oficial, estatística que é muito pior no caso das mulheres. "Não quero ficar para trás", completa Jahantab. / AFP

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