México e Chile enfrentam dilema no CS da ONU

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Por Agencia Estado
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Nos primeiros dias do governo do presidente Vicente Fox, em dezembro de 2000, o então chanceler Jorge Castañeda anunciou que a busca de uma das dez vagas rotativas no Conselho de Segurança das Nações Unidas era objetivo prioritário da nova política externa do México mais democrático que surgira com a chegada da oposição ao poder. No início do ano passado, quando o país assumiu por dois anos uma das duas cadeiras do CS reservadas para a América Latina, o chanceler deixou claro que aquele era apenas um passo para realizar o objetivo mais ambicioso, de garantir um assento permanente para o México numa eventual reforma do órgão. Castañeda deixou o governo em janeiro. A votação da nova resolução que os Estados Unidos, a Inglaterra e a Espanha propuseram ao Conselho de Segurança para legitimar uma guerra contra o Iraque transformou o sonho de liderança internacional do ex-chanceler num pesadelo para Fox. Ao lado do presidente do Chile, Ricardo Lagos, Fox é um dos alvos principais da intensa campanha que o presidente George W. Bush e os primeiros-ministros Tony Blair e José Maria Aznar iniciaram no último fim de semana para garantir dois do mínimo de mais cinco votos de que necessitam entre seis membros não permanentes do Conselho para alcançar nove (eles já contam com o apoio da Bulgária) e colocar a resolução em votação. Bush telefonou para Fox e para Lagos no sábado. Os dois presidentes já receberam o pedido de apoio de Blair e Aznar os visitou pessoalmente, no fim de semana. Um alto funcionário do Departamento de Estado disse há dias que os mexicanos "vão se dar mal" se mantiverem sua posição atual de apoio à continuação das inspeções. O embaixador americano na Cidade do México, Tony Garza, foi apenas um pouco mais diplomático. "Nos bons tempos, seus amigos descobrem quem você é; em tempos ruins, você descobre quem são seus amigos", declarou, antes de Bush telefonar para Fox. Com a amizade entre Bush e Fox azedada desde o ano passado pela recusa do México de alinhar-se automaticamente com as posições americanas sobre o Iraque no Conselho de Segurança, o líder mexicano enfrenta agora duas péssimas alternativas. Se recusar o apoio a Washington, pode provocar a mesma mistura de ira e desprezo que os americanos manifestam hoje em relação à França, que assumiu a liderança dos países que se recusam a apoiar uma solução de força para desarmar o Iraque e insistem na continuação das sanções. Com uma economia totalmente dependente do mercado americano e tendo apostado seu futuro numa relação estreita com Washington, Fox não pode dar-se ao luxo de tomar uma decisão que a administração Bush verá como um gesto de hostilidade, que é como seriam recebidos o voto contrário ou, nas atuais circunstâncias, mesmo uma abstenção. Mas se apoiar os EUA, o presidente mexicano irá contra a opinião de 86% das pessoas em seu país, segundo pesquisa de opinião feita na semana passada pela TV Azteca. "O único caminho para a paz é o desarmamento do Iraque", disse Fox hoje. "O mundo quer a paz, mas apenas o desarmamento pelos próprios iraquiano assegurará a paz", disse ele. Em Nova York, o embaixador mexicano das Nações Unidas, o ex-senador Adolfo Aguilar Zinser, tem afirmado que "as inspeções devem seguir seu curso". O ministro da Justiça, Santiago Creel, tem insistido, dentro do governo, que o México vote com a França, a Rússia e a Alemanha em favor da continuação das inspeções. O presidente do Chile, Ricardo Lagos, enfrenta uma situação não menos delicada. O recém-concluído acordo de livre comércio que negociou com Washington está prestes a ser submetido à ratificação dos congressos dos dois países e pode ser bloqueado no Capitólio, se Santiago deixar de apoiar os EUA na votação na ONU. O assessor especial da Casa Branca para a região, Otto Reich, foi enviado a Santiago esta semana para pedir a solidariedade chilena e transmitir uma estimativa dos danos que uma resposta negativa causaria para as relações entre os dois países. A exemplo do resto da América Latina, esmagadora maioria dos chilenos é contrária a um apoio de seu país a uma resolução que leve à guerra. Ciente disso e empenhado em conseguir cobertura política para um eventual voto favorável à resolução, Lagos convocou os presidentes de todos os partidos políticos para uma reunião em La Moneda. O presidente chileno deixou patente a tensão do momento, há dois dias, ao negar que esteja sofrendo pressões. Afirmar isso, "é uma falta de respeito com os países grandes e os países pequenos", disse ele, exasperado. "Não quero falar de pressões, porque elas não existem. Mas todos sabemos as conseqüências de tomar uma ou outra atitude, sem necessidade de dizer se isso é ou não é uma pressão". O líder chileno disse que seu país, "modestamente, exercerá seu voto da forma que nos pareça mais adequada". Para Washington, a única forma adequada de o México e o Chile votar é a favor da resolução que condena o Iraque e abre o caminho para a guerra. Sem o apoio dos dois países do hemisfério, a proposta americana e inglesa não tem chances.

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