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Mianmar para enquanto centenas de milhares protestam contra o golpe militar

Mesmo com repressão dos militares, atos contra o golpe ganham adesão nas principais cidades do país

Por Shibani Mahtani
Atualização:

HONG KONG - Caixas de banco, cozinheiros, trabalhadores de mercearia e centenas de milhares de outras pessoas em Mianmar responderam a um chamado para uma greve geral nesta segunda-feira, 22, para protestar contra o golpe militar, levando cidades à paralisação apesar do medo de uma violenta repressão.

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A demonstração de desafio foi a maior e mais coordenada desde que os militares tomaram o poder em 1º de fevereiro e teve como pano de fundo os avisos oficiais de repressão. Os manifestantes esperavam enviar um sinal de que não aceitarão o regime militar e estão dispostos a paralisar a economia e arriscar a morte para alcançar a democracia.

Os assassinatos de manifestantes "podem acontecer a qualquer momento em Yangon, mas temos que continuar fazendo o que devemos fazer, mesmo se os soldados estiverem prontos para atirar em nós", disse Thura Zaw, uma moradora de 32 anos. "Sob a ditadura militar, ninguém está seguro, quer você vá para a rua ou fique em casa, então optamos por expressar nossa objeção em vez de ficar em silêncio."

Manifestantes erguem os punhos durante protesto em Mandalay. Foto: AP Photo

A resistência vem crescendo desde que as forças armadas depuseram o governo eleito de Mianmar, há três semanas, devolvendo o país ao regime militar após uma experiência quase democrática de uma década. Desde então, os militares detiveram mais de 400 pessoas, incluindo a líder civil Aung San Suu Kyi e o presidente - agora deposto - Win Myint, acusando-os de pequenas infrações para mantê-los presos. O golpe foi condenado pela comunidade internacional, incluindo os Estados Unidos, que impôs algumas sanções.

Em um tweet na noite de domingo, o Secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, disse que Washington "continuará a tomar medidas firmes" contra aqueles que perpetuam a violência contra os manifestantes.

"Apoiamos o povo da Birmânia", disse ele, usando um nome alternativo para o país - a região de Mianmar era conhecida como Birmânia.

Os manifestantes escolheram o dia 22 de fevereiro por causa da semelhança numérica da data com o levante liderado por estudantes contra o regime militar conhecido como "8.8.88", que ocorreu há 33 anos.

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Ao amanhecer em Yangon, a maior cidade de Mianmar, as autoridades ergueram barricadas e levaram tanques e comboios de veículos militares às ruas para impedir que os manifestantes marchassem para o centro da cidade. Os manifestantes simplesmente retiraram as barreiras para fora do caminho ou protestaram na frente deles. Lojas de conveniência, mercados e outros negócios essenciais foram fechados, substituídos por multidões de pessoas carregando cartazes contra o golpe e pedindo a libertação de Suu Kyi.

Cenas semelhantes aconteceram em todo o país: em Pathein, a capital ribeirinha da região de Ayeyarwady; em Mandalay, onde dois manifestantes foram mortos na semana passada; e até mesmo em Naypyidaw, a capital construída propositadamente, cujo layout urbano foi projetado para impedir manifestações em massa. A polícia enviada para esses protestos foi geralmente contida, exceto em Naypyidaw, onde separou grupos e derrubou alguns manifestantes.

Soldado guarda barricada durante protesto em Mianmar. Foto: EFE/EPA/LYNN BO BO

Em Hpa-an, a capital do estado de Kayin, Nai Hongsar, um residente de 38 anos, estava entre os que aderiram à greve. Cerca de 90 por cento das empresas na cidade foram fechadas, disse ele, sem se deixar abater pelos esforços da junta para intimidar os trabalhadores para que voltassem aos seus escritórios.

"Todos os bancos estão fechados", disse ele. "O sistema não esta funcionando . . . já está quebrando."

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Sai Nay Nay Win, um estudante de direito de 22 anos em Lashio, no norte do estado de Shan, disse que a cena na segunda-feira foi "espetacular" e os soldados e policiais não interferiram com os manifestantes que lotaram as ruas a partir do meio-dia.

"Se tivermos sucesso em uma greve total, a máquina do governo não funcionará", disse ele. "Eles têm que fazer concessões".

Apesar da atmosfera às vezes festiva e triunfante nos protestos, os manifestantes estão cada vez mais se preparando para uma repressão. Nos últimos dias, a polícia usou munição letal contra os manifestantes em algumas cidades, matando três pessoas: duas em Mandalay e uma trabalhadora de 20 anos, Mya Thwate Thwate Khaing, que morreu após levar um tiro na cabeça em um ato em Naypyidaw. Antes de ir para as ruas na segunda-feira, alguns manifestantes escreveram seu tipo sanguíneo em seus braços, enquanto outros oraram e prestaram homenagem a divindades budistas em pagodes dourados em todo o país.

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A emissora estatal MRTV anunciava no domingo que "os manifestantes agora estão incitando pessoas, especialmente adolescentes e jovens, a um caminho de confronto onde sofrerão a perda de vidas". O Facebook disse na segunda-feira que se retirou do ar as páginas do MRTV por violações de seus padrões.

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Mas, em vez de intimidar quem estava de fora, as mortes dos três jovens manifestantes levaram muitos à ação. Maung Hla Win, 42, fechou sua loja de peças de automóveis em Yangon na segunda-feira, embora estivesse hesitante em fazê-lo antes, já tendo sofrido grandes perdas durante a pandemia. Mya Thwate Thwate Khaing, disse ele, o lembrava de sua filha adolescente.

"Temo que algo semelhante possa acontecer com ela se continuarmos a ser governados pelos militares", disse ele, observando que sua filha de 19 anos sai às ruas quase diariamente com seus amigos. "Então, acho que é hora de mostrar minha solidariedade."

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