
25 de fevereiro de 2017 | 05h00
Dez dias atrás, um norte-coreano foi assassinado no aeroporto de Kuala Lumpur, na Malásia. Não era um homem qualquer. Era Kim Jong-nam, meio-irmão do atual dirigente da Coreia do Norte, Kim Jong-un. Pensou-se num assassinato político, ordenado pelo ditador. Apesar do silêncio que cerca a capital, Pyongyang, sabe-se que Kim Jong-un mata facilmente. Não hesitou em mandar assassinar o tio, Jang Song-thaek, número 2 do regime.
Perguntas e Respostas: o agente nervoso VX
Outro indício é o modus operandi, típico de tiranos opacos. Kim Jong-nam estava no aeroporto quando duas mulheres se aproximaram. Uma delas esfregou um líquido no rosto da vítima. A análise mostrou que se tratava de um veneno fulminante: o agente VX.
Falta saber o motivo. A mãe do homem assassinado, uma atriz famosa nos anos 60, foi a primeira mulher do dirigente da época, Kim Jong-il. Alguns anos mais tarde, Kim Jong-il juntou-se a outra mulher, uma dançarina, que lhe deu um filho: Kim Jong-un. São esses os dois irmãos. Normalmente, seria Kim Jong-nam, o assassinado, que herdaria o poder com a morte do pai. Mas esse irmão mais velho não tinha grande atração pelo poder. Preferia a boa vida, festas e música.
Em maio de 2001, quando o pai ainda vivia e reinava, Kim Jong-nam foi preso no aeroporto de Tóquio com um passaporte dominicano falso. Interrogado, deu o nome verdadeiro e explicou: viera se divertir na Disneylândia japonesa.
Quando essa epopeia burlesca chegou a Pyongyang, Kim Jong-nam perdeu a condição de herdeiro para o meio-irmão mais jovem. Na época da confusão, a Coreia do Norte concluiu que essa atração exagerada pelo Mickey era incompatível com as altas funções de líder. Ressalte-se que o clã da segunda mulher de Kim Jong-il trabalhou para provar que Kim Jong-nam era indigno.
E o que aconteceu com o homem assassinado? Kim Jong-nam, bem provido de dinheiro, passou a levar uma vida de vagabundo de luxo. Como havia estudado na Suíça, falava um francês perfeito e vinha com frequência à França, mas sempre com nome falso.
Uma francesa comenta o caso. Jamais suspeitou do amigo. Descreveu o sujeito como bom companheiro, divertido, brincalhão, que lia muito e tinha uma imensa coleção de discos. Estava sempre em Paris. Essa amiga o viu ainda no mês passado, jovial e generoso como sempre.
Esse era o homem que foi morto na Malásia, seguramente por ordem de seu meio-irmão. E por quê? Porque gostava de ouvir as belas e melancólicas canções de Serge Gainsbourg. Há outras razões, claro, mas quais? Mistério! / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ
*É CORRESPONDENTE EM PARIS
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