Moscou envia sinais dúbios

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Por Ellen Barry
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Por falar em mensagens dúbias, os líderes russos esta semana não pouparam boas palavras sobre o presidente Barack Obama. Suas declarações sobre o Afeganistão foram "animadoras", suas propostas de controle de armas foram "um sinal novo", e seus planos de conversar com o Irã foram "sinais encorajadores". Mas os cumprimentos vieram com o equivalente geopolítico de um soco no nariz. Para aceitar US$ 2,15 bilhões de ajuda russa, o presidente do Quirguistão anunciou na terça-feira em Moscou a decisão de fechar uma base aérea em Manas utilizada pelos EUA. A medida coloca um formidável obstáculo ao maior objetivo de política externa de Obama, o de dar prosseguimento à guerra no Afeganistão. Talvez isso não devesse surpreender. Desde o discurso irado do presidente russo, Dmitri Medvedev, horas depois de Obama ser eleito, os sinais de Moscou para o novo governo americano oscilaram entre o hostil e o conciliatório. Moscou está nitidamente explorando a ideia de cooperação. Mas também insiste, com demonstrações de força, para que Obama considere prioritários os interesses da Rússia. "Não tenho claro quem está tomando as decisões importantes ou qual é exatamente a mensagem", disse Strobe Talbott, vice-secretário de Estado do presidente Bill Clinton e atualmente presidente da Brookings Institution. "É um modo estranho de preparar a mesa para um diálogo sério e construtivo. Os russos afirmam que desejam uma discussão." O Afeganistão tem sido visto como uma importante área de cooperação entre os países, pois a Rússia teme uma disseminação do radicalismo islâmico na região. Há muito que Moscou vem tentando tirar os EUA das bases arrendadas na Ásia Central. Os comentários russos, desde então, têm sugerido que se Obama quiser prosseguir com seus planos de deslocar mais 30 mil soldados para o Afeganistão terá de obter apoio da Rússia. Isso significa enfrentar as queixas russas sobre questões que incluem os planos americanos para a instalação de um escudo antimíssil no Leste Europeu e a expansão da Otan. "Do ponto de vista russo, há uma janela de oportunidade para negociar, e se formos sentar para negociar, é melhor termos boas cartas do nosso lado", disse Oksana Antonenko, do International Institute for Strategic Studies, em Londres. "O que eles veem como melhor cenário é uma barganha", disse ela. "Não é uma parceria." A medida foi chocante porque ocorreu em meio a sinais de que Moscou estava disposto a se entender com Obama. Nas duas últimas semanas, Moscou anunciou que estava pronto para abrir uma rota de suprimento da Otan para o Afeganistão através da Rússia. E um funcionário da Defesa disse à agência Interfax que Moscou havia desistido do plano de instalar mísseis em Kalinigrado, perto da fronteira polonesa. Aí veio o anúncio sobre a base de Manas. É um lembrete de que os russos não compartilham o entusiasmo dos europeus por Obama. O presidente parece disposto a desacelerar o cronograma do escudo antimísseis e da expansão da Otan, mas não a engavetar os projetos. Os líderes russos, ansiosos para renegociar a relação, querem ter certeza de que têm a sua atenção. * Ellen Barry é colunista

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