Mundo rico vive boom do emprego

À medida que mercado de trabalho se torna mais seletivo, capitalismo tem melhorado nível dos trabalhadores 

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Por The Economist
Atualização:

Todos dizem que o emprego está acabando. Que os trabalhadores perderam o controle de suas vidas, que são mal pagos e explorados, que as máquinas ameaçam extinguir seus empregos. Só há um problema nesse quadro: ele não bate com a realidade. A maior parte do mundo rico está experimentando um boom de empregos sem precedentes. Não apenas existe pleno emprego, mas, em média, os empregos ficaram melhores. O capitalismo está melhorando com mais rapidez o nível dos trabalhadores, à medida que os mercados de trabalho se tornam mais seletivos. 

Fila em mutirão do emprego no centro de São Paulo. Foto: Felipe Rau/Estadão - 26/3/2019

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Nos EUA, a taxa de desemprego é de apenas 3,6%, a mais baixa em meio século. Menos comentada é a abundância de empregos em todo o mundo rico. Dois terços dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) tem taxa de emprego recorde na faixa de 15 a 64 anos. No Japão, 77% dessa faixa estão empregados. Mesmo na França, Espanha e Itália, onde o desemprego é relativamente alto, a taxa de emprego para a população que atinge a idade de trabalho está próxima ou excede os níveis de 2005. 

O boom de empregos no mundo rico é cíclico, resultado de uma década de incentivo econômico e recuperação verificados desde a grande recessão. Mas também reflete mudanças estruturais. As populações estão mais preparadas. Os sites são eficientes em combinar vagas e candidatos qualificados. E cada vez mais mulheres trabalham. Na verdade, as mulheres representam quase todo o crescimento nas taxas de emprego do mundo rico desde 2007. Por último, reformas em programas de previdência social, tanto para deixá-los menos generosos como para endurecer os meios de ingresso, parecem ter levado mais as pessoas a procurar emprego. 

Graças ao boom de vagas, o desemprego quase desapareceu em muitos países. Foi substituído por uma série de queixas sobre a qualidade e o rumo do trabalho. Esses são pontos menos tangíveis e mais difíceis de julgar. As queixas mais sérias são de que a automação vem destruindo vagas e os empregos, embora abundantes, são de baixa qualidade. 

De novo, a realidade não combina. Na indústria manufatureira, máquinas substituíram trabalhadores por décadas. Isso parece ter contribuído para um bolsão de desemprego persistente entre os americanos. Mas, segundo a OCDE, não se vê um apocalipse do emprego originado por máquinas e algoritmos. Uma grande faixa de pessoas apenas com educação secundária ou menos tem mais empregos que em 2000.

É também verdade que empregos de nível médio estão se tornando mais difíceis de encontrar à medida que a estrutura da economia muda e o setor de serviços se expande. Por volta de 2026, haverá nos EUA mais pessoas trabalhando em casa do que secretárias, segundo projeções oficiais. Mas, à medida que os mercados convencionais de trabalho decrescem, são criados mais empregos de alto nível que empregos menos qualificados. Ao mesmo tempo, empregos menos qualificados estão sendo mais bem pagos, em parte em razão do aumento do salário mínimo. No mundo rico, empregos que pagam menos de dois terços da média nacional são cada vez mais raros. 

Quanto à precariedade, nos EUA, os empregos de tempo integral tiveram a mesma proporção de contratações em 2017 que em 2015. O trabalho temporário responde por apenas 1% dos empregos. Na França, mesmo com as recentes reformas para tornar o mercado de trabalho mais flexível, a faixa de novas contratações permanentes atingiu a maior alta de todos os tempos. O verdadeiro trabalho precário é encontrado em países do sul da Europa e a culpa não é nem de empregadores sanguessugas nem da tecnologia, mas de leis antiquadas que amarram os mercados de trabalho, deixando de fora os jovens para manter em empregos protegidos trabalhadores que neles se encastelaram. 

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Seguro-desemprego

O impacto dos benefícios de trabalho abundante está ficando claro. Com as empresas competindo por trabalhadores, mais do que estes por emprego, os salários crescem, aumentando a fatia dos trabalhadores no bolo – embora não tão rapidamente quanto o boom pode sugerir. Especialistas preocuparam-se por anos com a diminuição do número de beneficiados pelo seguro-desemprego. Agora, o mercado de trabalho está fazendo isso por eles. De fato, um dos atrativos do boom de empregos é seu potencial para resolver problemas sociais sem que governos gastem muito. 

Os legisladores têm lições a tirar. Os economistas subestimaram o potencial do emprego, o que levou a políticas fiscais e monetárias hesitantes. Assim como sua perspectiva otimista nos anos 2000 ajudou a alimentar a crise, o pessimismo sobre o crescimento do emprego atrasou a recuperação. A esquerda tem de aceitar que muitas de suas críticas ao capitalismo não têm respaldo nos fatos. 

A vida na base do mercado de trabalho não é alegre – longe disso. Mas a situação da maioria dos trabalhadores está melhorando. A falha em entender isso pode levar a uma intervenção desnecessária do governo. Já a direita deveria admitir que os empregos aumentaram apesar das regulamentações que constituem sua política. O boom não vai durar para sempre. A recessão vai liquidá-lo. Mas, enquanto isso, é bom prestar atenção nele. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ  © 2018 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

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