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Na reta final, Karzai consolida aliança com ''senhores da guerra''

Volta do exílio de líder usbeque expõe plano do presidente afegão de buscar apoio de outras etnias para eleição do dia 20

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Por Lourival Sant'Anna
Atualização:

O presidente do Afeganistão, Hamid Karzai, selou sua aliança com os principais chefes de milícias afegãos com a volta do exílio do ex-general Abdul Rashid Dostum, líder da etnia usbeque. Dostum foi recebido ontem com festa por milhares de partidários em Shiberghan, seu reduto no norte do país. Ele chegou ao Afeganistão no domingo à noite, horas depois da divulgação de um comunicado do palácio presidencial, de que não havia nenhum obstáculo para seu retorno ao país. A volta de Dostum aumenta a percepção de que Karzai procura consolidar seu poder aliando-se aos chefes de milícias, também conhecidos como "senhores da guerra". As articulações, porém, não se estendem à milícia Taliban - ontem, em entrevista ao Estado, o porta-voz do Taleban, Qari Yousef Ahmadi, negou que o grupo esteja negociando uma trégua com Karzai (mais informações na página 19). Chefe de gabinete do comandante das Forças Armadas, Dostum, um ex-comunista acusado de crimes de guerra, teve de fugir para a Turquia no ano passado depois de ter sido denunciado pela Procuradoria da República pelo sequestro de Mohammed Akbar Bai, seu desafeto político. O processo tinha o apoio tácito do presidente, que procurava, até o início do ano passado, distanciar-se dos chefes de milícias por pressão da comunidade internacional. Agora, Karzai voltou a cercar-se dos senhores da guerra. No caso de Dostum, o objetivo é neutralizar a ascensão de seu principal adversário na eleição presidencial de quinta-feira, o ex-chanceler Abdullah Abdullah, de mãe tajique e pai pashtun. Com 25% das intenções de voto, contra 44% de Karzai, segundo a última pesquisa do Instituto Republicano Internacional, Abdullah tem forte apoio entre os tajiques do norte e do centro do país, e também atrai votos no sul, de maioria pashtun - etnia de Karzai. "O representante especial (Kai Eide) já disse que, para levar este país adiante, é preciso mais políticos competentes e menos senhores da guerra", disse Alim Siddique, porta-voz da missão da ONU em Cabul. Um funcionário do governo americano afirmou que os EUA deixaram claras ao governo afegão suas preocupações com o futuro papel de Dostum e que sua reputação levanta questões sobre sua culpabilidade por violações de direitos humanos. Na semana passada, Karzai obteve o apoio de outro senhor da guerra, Ismail Khan, líder na importante cidade de Herat, no oeste do país. Os dois candidatos a vice de Karzai também são ex-chefes de milícias acusados de crimes de guerra durante a ocupação soviética (1979-89) e a luta contra os taleban (1995-2001): o marechal tajique Mohamed Qasim Fahim e Karim Khalili, da minoria hazara. Fahim foi ministro da Defesa durante o governo interino de Karzai (entre a queda do Taleban, em dezembro de 2001, e a eleição de outubro de 2004), mas o presidente teve de destituí-lo por pressão da comunidade internacional. O relatório da ONG Afghanistan Rights Monitor, divulgado no dia 30 de junho, acusa Fahim e Khalili de crimes de guerra e afirma que foram abertas ações para impedir que os dois concorressem aos cargos, mas um "procedimento corrupto" permitiu sua manutenção na chapa de Karzai. Outros senhores da guerra, que mesmo depois do desarmamento financiado pelo Japão mantêm grupos armados, vastas extensões de terras e relações de clientelismo em suas regiões, também apoiam o presidente. Quatro candidatos "nanicos" a presidente, de um total de 36 ainda no páreo, retiraram ontem seus nomes em apoio à reeleição de Karzai. PRINCIPAIS CANDIDATOS Hamid Karzai: O atual presidente é pashtun, mas tenta buscar votos em grupos étnicos distintos Abdullah Abdullah: De origem tajique, ex-chanceler de Karzai, promete negociar com o Taleban caso o grupo abandone as armas Ramazan Bashardost: De etnia hazara, estudou na França e adotou discurso de defesa dos pobres Ashraf Ghani: O ex-reitor da Universidade de Cabul é pashtun e promete combater a corrupção

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