Nas fotos, guerra contra o terror não tem corpos

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Por Agencia Estado
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Mal as torres caíram, na manhã de 11 de setembro, começou uma guerra feroz: a guerra das fotos, guerra desencadeada, de Londres a Nova York e de Paris a Washington, pelas grandes agências de fotografia e pelas grandes publicações. Como todo o drama do dia 11 de setembro, essa guerra de fotos é ao mesmo tempo clássica e inédita. Quais são suas características originais? A primeira é que jamais um acontecimento provocou tantas fotografias. Desde o choque e, em seguida, durante cinco a seis dias, os fotógrafos metralharam. A segunda é que a queda das torres, ou seja, um dos acontecimentos mais mortíferos da história (exceto a bomba de Hiroshima, os bombardeios de Coventry ou de Dresden, durante a II Guerra), curiosamente não gerou muitos negativos sangrentos de cadáveres, de corpos massacrados. Entre os negativos mais duros estão os que permitem observar os desesperados no alto de uma das torres. Nós os vemos oscilar à beira do espaço, à beira da morte, mas nada de corpos massacrados ou carbonizados, nada de carniça. Essa ausência é explicável: os 6 mil mortos desapareceram nas profundezas do desastre sem que possamos vê-los. Mas houve também uma vontade de decência: os jornais poderiam ter publicado os restos dos corpos extraídos dos escombros pelos bombeiros, eles não o fizeram. O número de negativos, profissionais e amadores, de muito boa qualidade é vertiginoso. A Paris-Match que, na França, é "líder", recebeu 3 mil negativos nas primeiras horas após o atentado. Assim, a revista pôde refazer seu número em curso antes da meia-noite e, então, antecipar 24 horas sua publicação. Os grandes jornais têm o direito de preferência (em troca de uma soma consensual): têm, então, o direito de ver em primeiro lugar nas grandes agências (Associated Press, Gamma, Sygma, Magnum), podem conseguir uma "prioridade de revelação", ou seja, consultam os negativos antes dos outros jornais. Mas em um acontecimento como esse - tão surpreendente, tão universal e coberto por centenas de fotógrafos - os preços não sobem tanto quanto em outros casos. Foi assim que, na França, a foto mais cara da primeira semana atingiu apenas 200 mil francos (a foto das pessoas hesitando em saltar). O direito de "ver primeiro" não teve tanta importância na circunstância, devido ao número gigantesco de negativos e de sua qualidade. Era possível encontrar, na enorme quantidade, quase tudo o que se queria. Durante a segunda semana, os preços aumentaram. Que preços? Tradicionalmente, os preços continuam confidenciais. Eis alguns rumores mencionados pelo Le Monde: a Focus teria pago um total de um milhão de euros entre a Gamma, a Sygma e a Sipa. No que diz respeito à Paris-Match fala-se em dois milhões de francos na primeira semana. Mas as somas desembolsadas foram compensadas pela venda: Paris-Match habitualmente vende 750 mil exemplares. Ela vendeu 1,5 milhão. A Paris-Match que, muitas vezes, é criticada por sua avidez e sua pouca delicadeza desarmou seus detratores ao destinar um milhão de dólares às vítimas de Nova York. Mas decididamente a Paris-Match tem um gosto especial por fotos terríveis: na semana seguinte, houve uma explosão química, na França, em Toulouse, com 19 mortos e cerca de mil feridos graves. E a Paris-Match publicou imagens aterrorizantes: uma mulher muito ferida e seus dois gêmeos feridos na cabeça, todos aguardando socorros, imagens sangrentas etc. O mesmo número justificou a escolha dessas fotos brutais: "Mostrar é informar e denunciar uma tragédia que jamais deveria acontecer". É uma grande questão, que apresenta aspectos jurídicos - na França, uma lei limita determinadas reproduções - mas, além do aspecto legal, é nos jornais que se deve fazer a pergunta: as revistas e jornais devem publicar tudo ou seu dever é exercer uma censura sobre seus próprios negativos quando esses negativos são insuportáveis? Na minha opinião, eu recusaria determinadas fotos.

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