
03 de junho de 2020 | 02h00
QUITO - Assim como o novo coronavírus, a desinformação também perdeu o controle no Equador, com "fake news" que iam do lançamento de corpos ao mar e descoberta de mortos nas praias à proliferação de remédios "milagrosos" - às vezes perigosos - contra a doença.
No dia 25 de janeiro, vídeos sobre a suposta origem da doença circulavam nas redes sociais. Eram imagens de um mercado de animais vivos, mas não haviam sido gravadas em Wuhan, China, e sim a mais de 3.200 quilômetros, na Indonésia.
Quando a China registrava quase 80 mil casos e cerca de 250 mortes, em 29 de fevereiro, o Equador relatava o primeiro contágio, o Brasil ostentava apenas um caso, e o México, três. Na Colômbia e na Argentina, o vírus ainda era assunto de outros países.
Um mês depois, o Equador contabilizava 2.748 casos, três vezes mais do que a Argentina, para uma população inversamente proporcional. Os serviços de saúde entraram em colapso, e a desinformação se espalhou livremente, com consequências tangíveis para os equatorianos.
"Não comprem peixe! Mortos por coronavírus são lançados ao mar no Equador e no Peru", dizia a legenda de dois vídeos compartilhados milhares de vezes nas redes sociais. Um deles mostrava, na realidade, corpos de migrantes em uma praia líbia, em 2014, e o outro, o traslado em uma embarcação de um morto, cujo corpo havia sido jogado ao mar, relataram seus parentes à AFP.
"Sou comerciante de frutos do mar. Isso afetou minhas vendas", contou por WhatsApp um usuário do Equador.
A rápida expansão de casos no país causou incerteza sobre o paradeiro final dos corpos. Circularam suspeitas de fossas comuns, com fotos de túmulos cavados em descampados - imagens freneticamente compartilhadas nas redes. Do material verificado pela AFP Factual, porém, uma foto havia sido tirada no México, em 2018, e a outra, no Equador, mas em 2016, sem qualquer vínculo com a atual pandemia.
Além do Facebook, o governo identificou cerca de 25 grupos com aproximadamente 4 mil usuários cada, no Telegram e no WhatsApp, cruciais na disseminação da desinformação com áudios falsos. A entidade diz ter "desmentido mais de 300 publicações desde março".
Segundo dados da rede internacional de Fact-Checking (IFCN, em sua sigla em inglês), "as duas categorias de informações falsas que mais chamam a atenção são sobre 'autoridades' - ou seja, desinformação de caráter político -, com 230, e as curas falsas, com 181 casos".
Como em outras regiões, surgiram receitas caseiras para curar a covid-19: tomar água morna "a cada 10 minutos", alho, gengibre, mel, fazer gargarejos de sal, ou de bicarbonato, entre outros. Até mesmo o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, publicou em março uma receita para esses fins, a qual o Twitter se encarregou de apagar.
Autoridades de saúde e especialistas concordam: no melhor dos cenários, esses ingredientes apenas aliviam sintomas, mas não curam o novo coronavírus, nem impedem seu contágio. E também alertam: ingerir alguns destes produtos em grandes quantidades pode ser prejudicial à saúde e até fatal.
Hoje, Peru, México e principalmente o Brasil tiraram o Equador do protagonismo que teve no início da crise, que atualmente apresenta cerca de 40 mil casos e 3.400 mortos - em contraste com o meio milhão de casos e quase 30 mil mortos do Brasil. / AFP
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