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Nova entidade latino-americana funcionará por consenso

Recém-criada CELAC marca retorno de Cuba a foros regionais.

Por Claudia Jardim
Atualização:

Na primeira polêmica gerada na recém-criada CELAC (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), presidentes e chefes de Estado membros da organização, de olho na unidade pragmática, decidiram adotar o consenso como procedimento para a tomada de decisões. Isso significa que um voto contrário pode se converter, na prática, em um direito ao veto. Esta medida deixa para trás a proposta de aprovar resoluções por meio de uma votação na qual a posição de uma maioria qualificada validaria qualquer moção que não fora aprovada por consenso. "Se discutiu em vários níveis e como não houve total acordo, em relação às decisões, se (seriam) tomadas por consenso ou por votação, (...) o assunto continuará sendo avaliado nos próximos eventos", anunciou o presidente da Venezuela Hugo Chávez, anfitrião da Cúpula, ao final do encontro. "Enquanto isso, a CELAC continuará tomando suas decisões como tem sido até agora, por consenso", acrescentou. Esta posição era defendida pelo Brasil e pela maioria dos 33 países membros. "O Brasil prefere sempre o consenso. O consenso é a busca do equilíbrio. Tem um sentido agregador", defendeu o subsecretário para a América Latina, Antonio Simões. A contra-proposta, liderada pelo Equador, argumentava que o consenso poderia colocar "freios" no desenvolvimento da organização. Chávez e os líderes da Alba tiveram de convencer o presidente equatoriano, Rafael Correa, de aceitar a imposição do consenso e adiar para um próximo encontro a discussão. O Equador argumenta que com o direito à veto alguns países da Celac podem ser usados pelo governo dos Estados Unidos para frear acordos comerciais e políticos que não correspondam aos interesses de Washington. Integração No encontro, marcado pela heterogeneidade de discursos e projetos políticos, a presidente Dilma Rousseff manifestou que a "integração produtiva" é um dos caminhos para blindar a região das consequências da crise financeira internacional. Dilma disse que a integração regional tem a mesma importância, para seu governo que a necessidade de continuar impulsionando o desenvolvimento econômico associado ao combate à pobreza. "O que nós estamos fazendo é perceber que associar nosso desenvolvimento ao desenvolvimento da América Latina, além de (ser) um imperativo ético é também condição para dar sustentabilidade ao próprio desenvolvimento", afirmou a presidente em seu discurso de abertura da Cúpula na noite da sexta-feira. . "A Celac é um pouco a expressão da capacidade que nós, os diferentes países, tivemos de encontrar conosco mesmos, de olhar para nós mesmos e de percebermos a importância estratégica e geopolítica dessa região", afirmou a presidente que antecipou sua volta à Brasília, ao decidir não participar do encerramento da Cúpula. Chávez, o anfitrião - se mostrou preocupado com a aparência de Forum Político e não de uma instituição, desenhada para a CELAC no encontro em Caracas. "Há que dar uma estrutura (...) apesar de que alguns não considerem muito importante, é necessário se não quisermos que isso morra ao nascer", afirmou Chávez, cuja posição era compartilhada por Cuba, Equador, Nicarágua e Panamá. Apesar das reclamações, por enquanto, o grupo não contará com uma secretaria ou orçamento próprio. Venezuela, Chile - que assumiu a presidência pró-tempore - e Cuba farão parte da troika, grupo rotativo de articulação e acompanhamento da organização. Bloqueio a Cuba Após 47 anos de exclusão da Organização de Estados Americanos (OEA) - até então a única organização hemisférica - a criação da CELAC marca o retorno de Cuba ao cenário de articulação política, dessa vez, sem Estados Unidos. Na bagagem, o presidente cubano Raúl Castro, leva uma declaração dos países da CELAC condenando o bloqueio econômico imposto por Washington. No documento ratificado pelos presidentes, ao qual a BBC Brasil teve acesso, a entidade reitera "a mais enérgica condenação" à aplicação de leis e medidas "contrárias ao Direito Internacional" como a lei Helms-Burton. Firmada em 1996 pelo então presidente americano Bill Clinton, a lei estabelece que qualquer companhia que mantenha relações comerciais com Cuba pode ser submetida a represálias legais por parte das autoridades norte-americanas. Crítico do governo dos Estados Unidos, o presidente do Equador insistiu, em seu discurso, ter esperança de que a CELAC seja capaz de alcançar certo nível de institucionalização a ponto de substituir a OEA e sua Comissão Interamericana de Direitos Humanos. "É hora de ter um foro mais próprio, mais nosso, mais próximo à realidade, sem os vícios a favor da América do Norte (...) que tem o atual sistema interamericano", disse Correa. "Essa é a esperança com a CELAC." Além da aprovação de uma cláusula democrática, que visa dissuadir tentativas de golpe de Estado na região, a CELAC aprovou 22 documentos que tratam sobre o combate ao narcotráfico, terrorismo, integração econômica, entre outros. A próxima reunião de Cúpula será realizada no Chile, em 2012. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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