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O começo do fim da ditadura Assad?

Por É PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE e RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA PUC-SP
Atualização:

Análise: Reginaldo NasserÉ muito significativa a explosão que atingiu o complexo de segurança do governo sírio em Damasco, ontem, causando a morte de pelo menos quatro autoridades do primeiro escalão do governo Bashar Assad. O atentado é a primeira manifestação concreta de fragilidade dos serviços de segurança do presidente, em mais de 16 meses de distúrbios e repressão em todo país. E é preciso colocar o fato em perspectiva, pois ele se soma a uma série de outros episódios significativos dos últimos dez dias: a deserção de um general e de um embaixador, ambos da elite sunita, bastante próximos de Assad; a reunião do ministro das Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov, com lideres da oposição síria em Moscou; o início de violentos combates em Damasco; e o reconhecimento, por parte da Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), de que o conflito passou para o estado de "guerra civil".Entre estudiosos de guerras civis, é quase consenso que o sucesso dos rebeldes depende basicamente de três fatores. Primeiro, os níveis de eficácia das instituições que têm como objetivo canalizar as demandas da sociedade. Depois, o grau de fracionamento da elite, em particular aquela que tem o domínio sobre o aparato coercitivo. Por último, a unidade ideológica e capacidade de organização da oposição.Assim, tudo leva a crer que esses acontecimentos na Síria estejam ligados entre si, indicando uma provável desintegração do regime existente. Embora os dois primeiros desses fatores se revelem cada vez mais intensos, o terceiro ainda causa dúvidas e é justamente nesse ponto que o governo Assad, ainda que precariamente e de modo retórico, procura manter certa credibilidade perante aqueles que falam em nome da comunidade internacional.Na verdade, as situações revolucionárias demandam um posicionamento das grandes potências para agirem, colocando em questão a posição que ocupam no sistema internacional - seja para aquelas que apoiam o regime existente (Rússia e China) ou aquelas que lutam por sua queda. Esse é um quarto fator que pode definir os rumos da situação na Síria.Vinte anos após o colapso da União Soviética, os líderes russos ainda não conseguiram definir precisamente qual é o seu papel global. A política externa russa versa mais sobre o que seus líderes não querem, e não o que eles querem. Mas credibilidade e a percepção do poder, por vezes, são quase tão importantes quanto o poder real.A Síria é um dos únicos países fora da ex-União Soviética onde a Rússia continua a desfrutar de influência visível. A ausência de Moscou no processo de transição, caso ocorra a queda do regime, poderia causar um impacto simbólico profundo em toda geopolítica do Oriente Médio. Além disso, é bom lembrar que o interesse russo em Damasco ressurgiu após a invasão do Iraque pelos EUA e a guerra da Ossétia do Sul em 2008, lembrando as tensões da Guerra Fria.Seja qual for o desfecho da crise síria no interior das fronteiras de Damasco, o certo é que ela demonstra com clareza a diversidade de interesses geopolíticos e econômicos entre as potências da comunidade internacional e sua importância para a resolução da crise.

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