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O financiamento chinês

Por Mac Margolis
Atualização:

Para nós, do Novo Mundo, o Ocidente sempre foi o imã. Os Estados Unidos pararam de expandir só quando os colonos esbarraram no Pacífico. Canadá cresceu para o Oeste, assim como o Brasil. Será o Oriente a renovação das Américas? Há poucos dias, os líderes latinos viajaram para Pequim para a primeira cúpula dos países da Comunidade dos Estados do Caribe e da América Latina (Celac) e a China. O presidente chinês, Xi Jiping, falou em turbinar o comércio no novo bloco para $500 bilhões até 2025. Assim, para os mais entusiasmados, nasceu um novo eixo Leste-Sul de desenvolvimento, com a China ao volante. Há quem vislumbre no sol do Oriente uma porta de saída da sombra de Washington - um provedor de crédito farto, a juros camarada, sem amarras ideológicas. Se antes a China, com suas bugigangas baratas, ameaçava a nossa indústria capenga, hoje o dragão nos parece bonzinho. Já em 2013, a maioria dos latinos viram com simpatia a ascensão da China e 68% julgaram positivo ou muito positivo o papel chinês no hemisfério, seis pontos porcentuais a frente dos americanos. A pesquisa, da Universidade de Vanderbilt, dos EUA, ouviu 41 mil pessoas em 26 países. Tanto melhor. A relevância da China no hemisfério ocidental é inegável e sua presença, bem-vinda. Quanto mais motores na economia, melhor girará o mercado global, até mesmo das Américas. Mas quem imagina um novo padrinho na praça, um Tio Xi dos emergentes para se contrapor ao Tio Sam, pode se decepcionar. À China não interessa viagens sentimentais. Quer, sim, garantir o suprimento de matérias primas para saciar sua indústria e mercados para absorver seus manufaturados. Apesar da diplomacia correta e lisonjeadora, a Cúpula latina nada tinha de ideologia companheira. Como embaixador mexicano em Pequim, Jorge Guajardo passou seis anos tentando decifrar os bafos do dragão e saiu com a paciência escaldada. "Há um deslumbramento com a China que não corresponde à realidade", me disse. "É uma economia de comando, em que os acordos não valem o escrito. Pequim sempre solta cifrões que não se materializam." O México, é claro, tem uma agenda particular. Colado aos EUA, projetou-se como a fábrica principal do maior mercado consumidor do mundo, para depois amargar o rolo compressor dos manufaturados chineses. No entanto, sua experiência é didática. "É besteira imaginar que a China substituirá os EUA no comércio mundial", diz Luiz Augusto Castro Neves, ex-embaixador brasileiro na China. "Mesmo que fosse um desejo nosso - e não é - não é desejo chinês. Pequim quer boas relações com os EUA." É esse o contexto da virada latina para o leste. Pequim ocupa um novo quadrado no tabuleiro global. Não faz filantropia e seus recursos não chegarão às Américas sem poréns. Kevin Gallagher, estudioso da China da Universidade de Boston, descobriu recentemente que o Banco de Desenvolvimento da China cobra juros mais altos da América Latina que o Banco Mundial. Pela prática, o financiador mereceu a pecha de "banco de fomento que não fomenta." Não diga isso ao presidente venezuelano Nicolás Maduro, que saiu do país, boina na mão, em busca de socorro para a prostrada economia bolivariana, que já beira o calote. Em Pequim, Maduro garante ter conseguido US$ 20 bilhões. Mas de dinheiro na mão, nada. Os chineses prometeram investimento para prospectar o petróleo venezuelano, cujas reservas a China já controla. De bobo, os novos melhores amigos da América Latina nada têm.Mac Margolis é colaborador da 'Bloomberg View' e colunista do Estado

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