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O país sem paralelos que Obama herdará

Por Jack Rosenthal
Atualização:

Faz semanas que o mundo espera a presidência de Barack Obama por meio de filtros históricos. Alguns enxergam paralelos com Abraham Lincoln. Outros, preocupados com a convulsão econômica, esperam outro New Deal. E alguns, veem um novo John F. Kennedy. Os paralelos, porém, são discretos. São mais instrutivas as diferenças entre o agora e o então. A mais óbvia é a questão racial. Quase igualmente chocante é a transformação no papel feminino. As palavras "segurança nacional" adquiriram um significado diferente. A revolução digital alterou tanto a mídia quanto a mensagem. E talvez aquilo que mais tenha mudado seja a posição dos EUA diante do mundo. Questão racial A eleição de Obama é a epítome de uma evolução notável. A maioria de nós cresceu indignada com a segregação racial nos EUA e achava que os direitos civis poderiam ser impostos por decreto. O choque de realidade não demorou. Quando fui trabalhar no Departamento de Justiça pela primeira vez, os únicos negros que encontrei eram balconistas e motoristas. No início da década de 60, foram necessárias intermináveis negociações no Congresso, a marcha de Washington, a violência em Birmingham e Selma, o assassinato de JFK, as habilidades legislativas de Lyndon Johnson e os esforços dos defensores dos direitos civis, das igrejas, sindicatos e outras organizações para criar uma nova lei. Mulheres O contraste nessa área pode ser representado pela seguinte pergunta: além de Esther Peterson, presidente do gabinete feminino do Departamento do Trabalho, qual outra mulher foi nomeada por Kennedy para um cargo importante? Naquela época, Madeleine Albright era anfitriã dos jantares do marido, um repórter. As mulheres eram esposas ou namoradas, e não secretárias de Estado. Segurança nacional Durante a Guerra Fria, a segurança ocupava o imaginário coletivo tanto quanto hoje, mas não era algo que interferisse tanto na vida das pessoas. Segredos e documentos eram protegidos. Os lugares, não. Para entrar na maioria dos prédios públicos não havia necessidade de autorização. Para embarcar em um avião para Nova York, uma pessoa precisava apenas de US$ 9,95. Não era necessário mostrar a carteira de motorista e as meias. Mídia Na época da Crise dos Mísseis, em 1962, em uma instalação secreta do governo, nas montanhas da Virgínia, havia espaço para 50 repórteres, a maioria a serviço de jornais. Na época, o telejornal noturno durava 15 minutos. Newton Minow, presidente da comissão federal de comunicações durante o governo JFK, disse que a revolução na mídia é o que mais teria impressionado Kennedy. Lugar dos EUA no mundo Em 1961, os EUA estavam no ápice do seu poderio e prestígio. Dwight Eisenhower havia deixado um legado de paz e prosperidade. Hoje, não há nem uma coisa nem outra. Nada de paz: duas guerras. Nenhum prestígio: Guantánamo e Abu Ghraib tornaram-se sinônimos de tortura e Kyoto virou sinônimo de arrogância. E nada de prosperidade: os EUA tornaram-se a fonte contagiosa da convulsão econômica global. *Jack Rosenthal é presidente da Fundação The New York Times

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