O papel do Tio Sam

A abordagem hamiltoniana, de desenvolvimento estrutural de longo prazo, foi, em grande parte, abandonada

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Desde a aurora da república, o governo federal jogou um papel vital na vida econômica americana. O governo promoveu o desenvolvimento industrial no século 18, o transporte no 19, as comunicações no 20 e promove a biotecnologia hoje. Mas o papel federal foi historicamente bem limitado. O homem que iniciou esse papel, Alexander Hamilton, era um nacionalista. Seu principal objetivo era fortalecer o poder e a eminência nacionais, e não tornar indivíduos ricos ou iguais. Essa versão de nacionalismo econômico significa que ele e as pessoas que seguiram seu caminho - os Whigs, ou os primeiros republicanos e os primeiros progressistas - se concentravam no desenvolvimento estrutural de longo prazo, não na provisão imediata de empregos. Eles tinham em vista construir a infraestrutura, as instalações de educação e pesquisa necessárias para a grandeza futura. Esse nacionalismo levou também gerações de líderes a assumir que havia uma harmonia básica de interesses entre capital e trabalho. As pessoas dessa tradição rejeitam as iniciativas para dividir o país entre os que têm e os que não têm. Por último, esse nacionalismo significava que a política enfatizava mais dinamismo e oportunidade que segurança, igualdade e conforto. Enquanto governos europeus do século 19 e começo do 20 concentravam-se em proteger produtores e trabalhadores, o governo americano estava mais centrado em inovação e educação. Por causa dessas prioridades e dessas restrições ao papel federal, o governo podia ser enérgico sem se tornar gigantesco. Durante todo o século 19, o governo federal consumiu cerca de 4% do Produto Interno Bruto nacional em tempo de paz. Mesmo durante o New Deal, ele consumia menos de 10%. Nesse ínterim, os Estados Unidos prosperaram. Mas a abordagem hamiltoniana foi, em grande parte, abandonada. O abandono veio em três fases. Primeiro, a era progressista. Os progressistas estavam certos ao aumentar os regulamentos para proteger trabalhadores e consumidores. Mas os progressistas tardios tiveram uma fé excessiva no poder dos planejadores governamentais para racionalizar a vida nacional. Isso era uma antítese da tradição hamiltoniana, que era muito mais cética sobre quanto podemos saber e muito mais respeitosa da complexidade do mundo. Segundo, o New Deal. Franklin Roosevelt estava certo ao reagir energicamente à Depressão. Mas o lema do New Deal - que as pessoas não comem no longo prazo; elas comem todos os dias - acabou sendo corrosivo. Os políticos depois disso deram menos atenção a estruturas de longo prazo e mais a quantos empregos elas "criam" num mês específico. Os americanos foram corrompidos pelo fascínio da dívida, sacrificando o desenvolvimento futuro em nome de gastos e cortes de impostos atuais. Terceiro, a Grande Sociedade. Lyndon Johnson estava certo ao usar o governo para fazer mais para proteger americanos das vicissitudes do capitalismo. Mas ele fez uma série de promessas sem limites, em especial sobre a assistência médica. Ele tentou prender os eleitores ao Partido Democrata com uma teia de subsídios à classe média. Excessos. Em cada caso, um bom impulso foi levado a excessos. Um governo que era enérgico e limitado transformou-se em um que é onidirecional e fiscalmente insustentável. Um governo que recebia confiança e era orientado para visões de longo prazo, agora sofre desconfiança porque condescende com cada desejo momentâneo dos eleitores. Um governo que dedicava seus recursos à inovação e desenvolvimento futuros agora dedica seus recursos à assistência médica a idosos de classe média. Fiz essa incursão pela história porque estamos tendo um grande debate sobre qual deveria ser o papel do governo, de modo que, evidentemente, estamos tendo um debate sobre qual foi o papel do governo. Dois dos escritores mais instigantes do país fizeram tentativas de descrever essa história - imperfeitamente, a meu ver - para apontar um caminho para o futuro. Em seu livro novo e esclarecedor, Land of Promise (Terra da promessa, em tradução literal), o historiador político Michael Lind celebra a tradição hamiltoniana, mas, no seu modo de ver, o hamiltonismo avança para algo que parece um liberalismo moderno. Mas a tradição hamiltoniana difere substancialmente do liberalismo. Em seu novo e absorvente livro, Our Divided Political Heart (Nosso coração político dividido, em tradução literal), E. J. Dionne, meu parceiro erudito na NPR (a rádio pública americana), argumenta que as tradições hamiltoniana e jacksoniana faziam parte de um consenso equilibrado que foi destruído pelos individualistas radicais do Partido Republicano de hoje. Mas essa filosofia de governo equilibrada foi gradualmente destruída ao longo do século 20, antes de o Tea Party nem sequer estar no útero. À medida que o governo se estendia excessivamente, os republicanos tornavam-se excessivamente antigoverno. Não voltaremos à filosofia de governo do século 19 de Hamilton, Clay e Lincoln. Mas essa tradição oferece referências. A questão não é se governo é inerentemente bom ou ruim, mas o que o governo faz. O governo encoraja a inovação no longo prazo ou privilegia gastos de curto prazo ao endividamento de longo prazo? O governo alimenta uma cidadania empreendedora, ou uma garantida, mas menos enérgica? Se os Estados Unidos não modernizarem suas instituições governantes, a nação estagnará. O fantasma de Hamilton não vai gostar. / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK

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