O peso dos votos latino-americanos

Muitos países não adotaram uma posição, mas a adesão plena dos palestinos à ONU ou o status de observador seria grande derrota a EUA e Israel

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Por JORGE C. , CASTAÑEDA , , PROJECT SYNDICATE , É EX-CHANCELER DO MÉXICO , JORGE C. , CASTAÑEDA , , PROJECT SYNDICATE e É EX-CHANCELER DO MÉXICO
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Artigo Quando, há 64 anos, a ONU votou uma divisão de território, criando o Estado de Israel e garantindo depois a ele o status de membro pleno da organização, vários países latino-americanos - Brasil, El Salvador, Argentina, Colômbia, Chile e Honduras - abstiveram-se de votar ou, como Cuba, votaram contra as resoluções. O México absteve-se de votar quanto à divisão, mas se manifestou a favor da admissão de Israel na ONU alguns meses depois, admitindo que seu interesse nacional seria mais bem atendido se não tomasse partido no imbróglio do Oriente Médio. Nas próximas semanas, muitos países latino-americanos votarão a favor de algum tipo de adesão da Palestina à ONU, ou do reconhecimento de um Estado. Mas outros não. Essa questão não é simples para dois membros não permanentes do Conselho de Segurança, Brasil e Colômbia, ou para Cuba. Nicarágua, Venezuela, Costa Rica, Argentina, Bolívia, Chile, Equador, Peru, Uruguai e Honduras já reconheceram o Estado palestino, mas ainda não votaram a favor de se conceder a ele o status de "observador". Para ele se tornar membro pleno da ONU, o CS precisa fazer uma recomendação à Assembleia-Geral. Mas equiparar o status da Autoridade Palestina ao do Vaticano exige somente dois terços dos votos na Assembleia-Geral. De qualquer modo, as consequências políticas ofuscarão questões legais ou burocráticas. Forçar os EUA a usar o poder de veto no CS, ou conseguir o apoio na assembleia da ONU, seria uma grande derrota para Israel e os EUA, e é por isso que os votos latino-americanos são importantes. O Brasil já declarou que pretende votar no CS a favor da admissão da Palestina; a Colômbia vai se abster. Muitos outros países latino-americanos provavelmente votarão a favor da concessão de algum tipo de status mais elevado. A comunidade judaica nos EUA, e num grau menor o governo do presidente Barack Obama, tentaram convencer Chile e México, que ainda não se posicionaram. Pouco mudaria na prática, mesmo com um Estado palestino, se Israel e EUA não o aceitarem - e México e Chile podem perder muito se distanciando de um aliado numa questão que é de grande importância para ele. Em resumo, como foi o caso há mais de meio século, a América Latina não se manifestou com uma única voz sobre questões cruciais. Agora, como antes, muitos países latino-americanos não adotaram uma posição de princípio - a favor ou contra Israel, ou a favor ou contra os palestinos. Preferiram o caminho da conveniência, e suas posições passaram a depender da relativa influência das comunidades árabe ou judaica dentro das suas sociedades, e a insistência de Washington. A falta de convicção dos latino-americanos no caso de assuntos tão graves marginalizou a região em outros problemas internacionais importantes, como a recente crise da Líbia e a revolta na Síria. Quando da votação de uma resolução da ONU criando uma zona de exclusão aérea na Líbia, Brasil, Rússia, Índia e China abstiveram-se. A África do Sul votou a favor, a contragosto.E agora, no caso da iniciativa americana e europeia para adoção de sanções contra o presidente da Síria, Bashar Assad, Brasil, Índia e África do Sul divulgaram comunicados afirmando que não permitiriam outra intervenção ocidental para derrubar o regime de outro país árabe. Nas palavras do líder de uma ONG, "eles estão punindo a população síria, pois ficaram descontentes com o fato de a Otan assumir um mandato para proteger os civis na Líbia e o transformar num mandato para mudar o regime". Diante do seu papel crescente na economia global, é compreensível que os maiores países latino-americanos, com os outros Brics, busquem um papel de mais influência. Mas essa não é a maneira de chegar a isso. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

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