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O telefonema das 3h da madrugada

Por Paul Krugman (The New York Times)
Atualização:

São três horas da madrugada, no começo de 2009, e toca o telefone na Casa Branca. Vários dos maiores fundos hedge (de risco) estão prestes a falir, diz a voz do outro lado da linha, e é provável que haja caos quando o mercado abrir. Em quem você confiaria para atender a este chamado? Não estou sendo melodramático. O plano de resgate lançado no domingo é muito melhor do que a primeira proposta do secretário do Tesouro, Henry Paulson - melhor o bastante para merecer a aprovação. Mas não é o que poderíamos chamar de bom plano, e não vai pôr fim à crise. Tudo indica que o próximo presidente terá de lidar com algumas grandes emergências financeiras. Então, o que sabemos sobre o preparo dos dois homens que acabarão atendendo a este telefonema? Bem, Barack Obama parece bem informado e sensato em relação aos problemas econômicos e financeiros. John McCain, por outro lado, me assusta. Sobre Obama: é uma pena que ele não tenha demonstrado mais liderança no debate a respeito do pacote de resgate, optando ao invés disso por deixar o assunto nas mãos dos democratas no Congresso. Mas tanto Obama quanto os democratas estão cercados por assessores conhecedores da sua área, entre eles os experientes administradores de crises Paul Volcker e Robert Rubin. Então temos o assustador McCain - mais assustador agora do que há algumas semanas. Já sabemos há bastante tempo que McCain não sabe muito de economia. Isto não importaria muito se ele tivesse bom gosto na hora de escolher seus assessores - coisa que ele não tem. Lembre-se, o seu principal mentor na área da economia é Phil Gramm, um dos maiores inimigos da regulamentação, que tomou cuidados especiais nos seus dias de senador para impedir a supervisão dos derivativos financeiros - justamente os instrumentos levaram os mercados de crédito à beira do colapso. Gramm não teve mais função na campanha de McCain desde que declarou que os EUA são "uma nação de chorões", mas ainda é cotado para o cargo de secretário do Tesouro. E no ano passado, quando a campanha de McCain anunciou que o candidato havia reunido "uma impressionante equipe de economistas e professores para aconselhá-lo em relação à política econômica, quem era citado com destaque? Kevin Hassett, co-autor do livro Dow 36.000. Não é necessário dizer mais nada. Agora, em boa medida a péssima qualidade dos assessores de McCain reflete o esfarrapado estado intelectual do seu partido. Será que já houve uma proposta econômica mais patética do que a sugestão feita pelos republicanos no Congresso, pedindo que tentemos resolver a crise financeira eliminando os impostos sobre ganhos de capitais? Instituições financeiras em apuros, por definição, não dispõem de ganhos de capitais para serem taxados. Mas até o presidente Bush tem procurado, no crepúsculo do seu mandato, o conselho de pessoas relativamente sensatas: não sou fã de Paulson, mas ele representa um enorme progresso em relação ao seu predecessor. A esta altura, temos a suspeita de que uma eventual presidência de McCain nos faria sentir saudades da competência da era Bush. A verdadeira revelação nas últimas semanas, no entanto, foi o quanto a opinião de McCain sobre a economia é errática. A qualquer momento, ele parece ter opiniões muito fortes - mas poucos dias depois, ele parte numa direção completamente diferente. Assim, no dia 15 de setembro ele declarou que "os fundamentos da nossa economia são sólidos". Isto foi no dia seguinte à falência do Lehman, enquanto a crise financeira entrava num estágio novo e ainda mais perigoso. Mas três dias mais tarde ele declarou que os mercados financeiros da América se tornaram um "cassino", e disse que demitiria o chefe da Comissão de Valores Mobiliários - coisa que, aliás, não faz parte das atribuições do presidente. E então ele encontrou um novo grupo de vilões - Fannie Mae e Freddie Mac, os credores patrocinados pelo governo. (Apesar de alguns verdadeiros escândalos dentro de Fannie e Freddie, eles desempenharam um papel pequeno na instalação da crise: a maioria dos empréstimos realmente podres veio de credores particulares.) E ele acusou moralmente outros políticos, incluindo Obama, de estarem sob a influência financeira de Fannie e Freddie; mas no final era uma empresa de propriedade do seu próprio chefe de campanha que recebia dinheiro do Freddie até o mês passado. Então Paulson lançou seu plano, e McCain entrou com veemência no debate. Mas ele admitiu, vários dias depois, que não havia de fato lido o documento, o qual não consistia em mais de três páginas. Ok, acho que você captou a imagem que quero transmitir. Parece que a economia moderna é um lugar perigoso - e não é o tipo de perigo que você pode enfrentar falando duro e denunciando os malfeitores. Será que McCain dispõe da capacidade de julgamento e do temperamento necessários para lidar com esta parte do emprego que ele busca? *Paul Krugman é colunista do ?New York Times?

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