GENEBRA - Pela terceira vez em quatro anos, a ONU se lança em uma negociação de paz para tentar colocar um fim à guerra na Síria. Mas essa é a primeira vez que o Irã será convidado para sentar à mesa a partir da segunda-feira 4 em Genebra. Teerã exerce uma influência chave em Damasco e a percepção de mediadores é de que não haverá um acordo de paz enquanto os iranianos não fizerem parte do esforço.
Até agora, porém, os EUA se recusavam a aceitar a presença de Teerã no processo. Mas o acordo preliminar no campo nuclear entre iranianos e americanos abriu as portas para um envolvimento mais amplo de Teerã nos debates internacionais.
Agora, tanto o prazo para o fim das negociações nucleares quanto o final do processo de mediação da Síria estão programados para coincidir. Em uma entrevista em Genebra, o porta-voz da ONU, Ahmed Fawzi, alertou que o processo poderá levar entre cinco e seis semanas e "todos os principais atores regionais" foram convidados, principalmente o governo sírio, oposição e sociedade civil.
Apesar de inúmeras reuniões - públicas e secretas - o único documento produzido até hoje foi o "Comunicado de Genebra" de junho de 2012. A ONU pretende partir da mesma base. O documento prevê a interrupção da guerra para que ocorra uma transição política, feita a partir de um novo órgão que reuniria todas as facções. Na época a questão da participação do presidente Bashar Assad não foi resolvida e o processo acabou fracassando.
Para Damasco e Moscou, não havia dúvidas de que o processo precisaria incluir Assad. Naquele momento, a oposição e os americanos rejeitavam a opção. Hoje, diante do avanço do EI, diplomatas consideram que há espaço para considerar o envolvimento direto do presidente sírio nas conversações.
Agora, a grande esperança recai sobre o Irã, considerado um ator que pode influenciar Assad. Nesta semana, a chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, indicou que esperava uma atuação "construtiva" do Irã no processo e isso auxiliasse a ONU a garantir a participação de Assad no processo.
"Queremos que o Irã tenha um papel positivo para encorajar o regime (de Assad) a apoiar uma transição na Síria", declarou. Nem todos na região apoiam o envolvimento iraniano, alertando que Teerã é parte do problema, não da solução.
A União Europeia insiste que não existe saída senão o envolvimento direto dos iranianos. "Eu entendo as preocupações de muitos países árabes na região. Mas também estou convencida de que seria ingênuo pensar que um país como o Irã simplesmente desapareceria do mapa", disse Mogherini.
A oposição síria também questiona o papel do Irã e alertou que apenas aceitará voltar a negociar se Teerã seguir algumas exigências. "Vamos insistir na formação de um governo de transição", alertou o presidente da Coalizão Nacional para as Forças de Oposição e Revolucionárias da Síria, Khaled Khoja. Para ele, porém, o Irã terá de aceitar a base da negociação e incentivar Assad a voltar a mesa para debater uma solução política.
A iniciativa ocorre no momento em que o Estado Islâmico avança para Damasco. Num primeiro momento, o mediador Staffan de Mistura chamará cada um dos grupos para conversar e tentar mapear o que cada um deles estaria disposto a aceitar. O enviado é o terceiro a ocupar o cargo. Em quatro anos, propostas similares feitas pelos mediadores Kofi Annan e Lakhdar Brahimi fracassaram.
A última vez que as partes se reuniram foi no início de 2014, no que ficou conhecido como "Genebra 2". Mas Brahimi, que havia substituído Annan, não conseguiu chegar a um acordo sobre quais temas deveriam ser tratados com prioridade.
Numa guerra que entra em seu quinto ano e já matou 220 mil pessoas, Mistura sabe que terá sérias dificuldades. Por isso, ordenou que nenhum dos atores no processo fale com a imprensa durante mais de um mês. "Haverá um blackout total de informação", admitiu Fawzi.