Os EUA e as disputas territoriais da China

Washington precisa fazer frente ao avanço chinês, o que não significa apenas palavras duras, mas também a disposição a empregar medidas difíceis

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Por ELIZABETH ECONOMY & e MICHAEL LEVY
Atualização:

A China National Overseas Oil Corporation (CNOOC) deu início, na semana passada, às perfurações em águas reivindicadas pelo Vietnã, acompanhada por mais de 70 embarcações, incluindo navios de guerra chineses. À primeira vista, esta poderia ser apenas mais uma frente da China em sua busca por recursos naturais, que leva empresas chinesas a todos os cantos do planeta. Entretanto, o que ocorre neste momento no Mar do Sul da China é na realidade algo muito mais perigoso do que era anteriormente - e as forças que o movem vão muito além da procura de uma fonte de energia. Os EUA precisam se convencer da magnitude do desafio chinês se quiserem alimentar a esperança de lhe fazer frente. O que não significa apenas palavras duras, mas também a disposição a empregar medidas difíceis. Há muito se especula sobre a existência de vastos depósitos de petróleo e gás sob o Mar do Sul da China - 3.626 quilômetros quadrados cercados pelo litoral de Brunei, China, Malásia, Filipinas, Taiwan e Vietnã, reivindicados em parte por todos esses países. Segundo o Ministério da Terra e dos Recursos da China, nesta área podem se encontrar nada menos que 400 bilhões de barris de petróleo, um volume muito superior ao dos imensos depósitos do Oriente Médio. Entretanto, segundo as estimativas mais corretas, as reservas são bem menores. A US Geological Survey calculou em 2010 que o petróleo ainda inexplorado (cuja produção jamais se tornará uma operação atraente do ponto de vista financeiro) é de 11 bilhões de barris. É difícil acreditar que a China arriscaria um conflito armado para uma aposta tão modesta. Duas outras forças são essenciais para compreender o desafio. Uma é o nacionalismo: a perfuração ocorre nas proximidade das Ilhas Paracel, localizadas numa área disputada do Mar do Sul da China, a aproximadamente 193 quilômetros da costa do Vietnã e 322 quilômetros da zona econômica exclusiva do Vietnã. A China, porém, reclama as ilhas alegando seu uso histórico e o efetivo exercício da soberania, por ocupá-las desde 1974. Desistir das Paracel seria um golpe para o prestígio da China, ao passo que a reafirmação do controle chinês sobre as ilhas fortaleceria a legitimidade interna de seus líderes.Pequim também é motivada pelo controle das rotas marítimas do Mar do Sul da China. Um intercâmbio num valor superior a US$ 5 trilhões desenrola-se anualmente nessas águas cada vez mais frequentadas. O que inclui quase 33% do comércio petrolífero marítimo e mais de 75% das importações de petróleo chinesas (bem como a maior parte do petróleo destinado ao Japão, Coreia do Sul e Taiwan). Talvez a marinha chinesa fosse fraca demais para desafiar o predomínio americano nas rotas marítimas do Oriente Médio ou mesmo para exercer o controle do crucial Estreito de Malaca, mas com a movimentação de suas forças navais no Mar do Sul da China poderá ganhar confiança e convencer-se de que os EUA não terão condições de interromper seu fornecimento. Além dessas duas motivações, as companhias petrolíferas chinesas estão ansiosas por operar na região. Mascarando sua excursão militar sob um disfarce comercial, Pequim talvez espere abrandar em parte a inevitável oposição. Nesse caso, seu estratagema não compensa. A última jogada da China, que surpreendeu o Vietnã e outras nações, enfraquece o suposto objetivo de Pequim, o fortalecimento de suas relações na região como sua prioridade em política externa. Também levanta dúvidas quanto ao compromisso assumido pela China com as conversações do seu atual grupo de trabalho com o Vietnã sobre o desenvolvimento conjunto de recursos no Mar do Sul da China. Os EUA adiantaram que não tomarão partido na disputa sobre soberania e pediram a ambas as partes que resolvam suas divergências de maneira pacífica. Isto não basta. Eles deveriam desmascarar o blefe da China e deixar claras as verdadeiras apostas. Os EUA e a Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean) deveriam criar uma frente unida, recusando-se a aceitar as reivindicações unilaterais de territórios em disputa. Entretanto, mais importante ainda é o fato de que os EUA devem estar preparados para transformar sua retórica em fatos. Embora nenhum tratado os obrigue a defender o Vietnã, seu programa de reequilíbrio da Ásia baseia-se na premissa de que seu papel é o de principal avalista da estabilidade no Pacífico. As ações da China contestam isso. O Vietnã reiterou seu compromisso em buscar uma solução pacífica para a disputa. Se a China não corresponder, os EUA deverão estar preparados para oferecer seu apoio ao Vietnã por meio de uma maior presença naval. Isto daria a Washington a capacidade de avaliar a capacidade da China e ajudar a frear a escalada da situação. Por outro lado, também deveriam ser consideradas outras opções, como a restrição das atividades da CNOOC nos EUA. Se, ao prometerem respaldar a paz e a estabilidade na região, os EUA não puderem corroborar suas palavras com ações, perderão toda credibilidade. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA SÃO ANALISTAS DO COUNCIL ON FOREIGN RELATIONS E AUTORES DO LIVRO "BY ALL MEANS NECESSARY: HOW CHINA'S RESOURCES QUEST IS CHANGING THE WORLD"

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